Unidos pela inclusão: respeito e igualdade - um relato de experiência

Sheila Lima Moraes Aguiar

Professora da rede estadual da Bahia, licenciada em Biologia, especialista em Educação Ambiental e Prática Escolar e Metodologia da Educação Profissional

O projeto Unidos pela Inclusão: Respeito e Igualdade foi proposto pelo Núcleo Territorial de Educação do Piemonte Norte do Itapicuru-NTE-25, em parceria com o Ministério Público de Senhor do Bonfim, a ser aplicado em escolas estaduais de Ensino Médio, com o intuito de desenvolver um olhar sensível e atento em relação às pessoas com deficiência e às pessoas idosas, com a finalidade de promover uma sociedade mais inclusiva, equitativa e solidária.

Dentre as atividades sugeridas para a realização do projeto estavam palestras, oficinas, debates e vivências práticas. Elas proporcionam ao estudante a oportunidade de compreender as barreiras enfrentadas por pessoas com deficiência e as pessoas da terceira idade.

A proposta da coordenação feita à professora autora seria apenas a realização de uma campanha na escola para arrecadar itens para doação ao lar de idosos, localizado no entorno da escola (CRE-Idoso). A professora escolheu uma vivência prática com as turmas de 2º e 3º anos de Análises Clínicas do CEEP Professor Paulo Batista Machado. Ela entendia que era preciso que os estudantes vivenciassem o dia a dia de uma casa de repouso, ouvissem as histórias e os motivos que levaram a família a colocarem seus entes numa casa de repouso e, principalmente, porque passam por tantas dificuldades para manterem seus serviços.

Figura 1: Orientadora, alunos e idosos do CRE-Idosos

Fundamentação teórica

O ciclo da vida perpassa o nascimento, o crescimento, o desenvolvimento, a reprodução, o envelhecimento e a morte. O envelhecimento é uma etapa da vida em que acontecem mudanças biopsicossociais (biológicas, psicológicas e sociais), naturais com o avanço da idade. O processo de envelhecer traz perdas estruturais e funcionais, assim como alterações que variam de um idoso a outro (Cruz; Ferreira, 2011).

Essas perdas fazem com que a sociedade visualize o idoso como uma pessoa improdutiva e estagnada, pois há um afastamento social decorrente da falta de um ambiente favorável e de um convívio com as demais gerações na sociedade (Nogueira; Lima; Martins; Moura, 2009). O fato de serem visualizados como improdutivos e dependentes faz com que seus parentes transfiram a responsabilidade dos cuidados aos abrigos ou simplesmente os abandonem, por não se encaixarem mais na rotina da casa.

Figura 2: Professora Sheila Lima (esquerda) e Dona Bazu (direita), com 109 anos

Essa sensação de abandono traz ao longevo impactos emocionais que podem ser irreversíveis. Quando se é deixado pela linhagem, inicialmente apenas em busca de apoio para os cuidados com o familiar, com o tempo ficam esquecidos nos lares, perdendo o vínculo afetivo com os parentes, sofrendo pela sensação de abandono e tendo o processo de esquecimento acelerado devido ao próprio envelhecimento. Em alguns casos, o ancião entra numa tristeza profunda por estar em uma local com o qual não se identifica, entrando em depressão e morrendo, em seguida. Estar incluído é definido como um ato de se sentir envolvido, ser compreendido em sua condição de vida, como uma pessoa pertencente, singular e coletiva (Torres; Sá, 2008).

Sentir-se acolhido, incluído e envolvido no contexto familiar traz conforto e pertencimento, portanto a escolha pela casa de repouso deve ser pensada e repensada pela parentela. O idoso, como qualquer outra pessoa, quer estar no seio familiar, se sentir parte produtiva e, acima de tudo, ser acolhido por aqueles que ele tanto lutou para dar conforto e uma condição de vida melhor. O abrigo pode ser uma opção de apoio ao familiar da terceira idade, mas não deve ser algo imposto, sem diálogo. Deve ser algo temporário até que a família se adapte às novas condições de cuidados com o idoso.

Metodologia

Ao discutir com a coordenação pedagógica como seria realizada a atividade proposta e definido o período em que seria aplicada, ficou acordado que seria agendada a visita ao Lar CRE-Idosos, localizado no bairro Olaria, nas proximidades da escola. Nesse primeiro momento, os alunos conversaram com os longevos, com os responsáveis pela manutenção da casa de repouso e tiraram todas as suas dúvidas acerca do funcionamento de um local como aquele, com a finalidade de sensibilizá-los a respeito da situação de abandono dos idosos causada pela família e as dificuldades que esse tipo de moradia enfrenta.

Figura 3: Filha de Dona Bazu vive no mesmo lar que seu filho; ela só aceitou viver na casa de repouso se os filhos estivessem juntos. Como também têm idades avançadas e não teriam condições de cuidar dela, o abrigo aceitou os três

No mês de julho de 2023, após a visitação à residência assistida, os discentes foram instigados a iniciar uma discussão em sala de aula, colocando os pontos observados por eles e levantando questões como: o sofrimento emocional que enfrentam pelo abandono dos parentes, a dificuldade que o centro enfrenta, mesmo recebendo o benefício do idoso para manter as despesas, o amor dos envolvidos na manutenção da casa de repouso e os sacrifícios para mantê-lo funcionando.

Encerradas as discussões, as turmas fizeram as propostas de como poderiam ajudá-los a suprir uma parte das necessidades. A turma do 2º ano de Análises Clínicas propôs realizar uma rifa. Com o dinheiro arrecadado, comprariam fraldas. O 3º ano, também de Análises Clínicas, fez a proposta de visitar o comércio, as casas e os bairros pedindo doação de itens de maior necessidade aos anciãos. Foi estipulado o prazo para o início da campanha para agosto de 2023 e o prazo de encerramento para setembro de 2023, com agendamento para entrega dos itens arrecadados em 13 de setembro de 2023. No dia da entrega dos itens ficou combinado que cada equipe se organizaria para levar um lanche para confraternizar com os longevos.

Figura 4: Lanche preparado e servido pelos alunos no dia da entrega das doações

Resultados e discussão

Os alunos ficaram bastante sensibilizados acerca da questão da inclusão social de pessoas da terceira idade e os impactos emocionais causados pela situação do abandono.

O projeto cujo intuito era o de atender à demanda vinda do Ministério Público, em uma parceria com o NTE-25, ultrapassou barreiras e mostrou que a exclusão social causa sentimentos profundos de abandono, sendo irreversível o estrago na vida do idoso ou de qualquer pessoa que passe por essa situação. Além disso, o fato permitiu que os estudantes se colocassem no lugar daquelas pessoas, pelas tantas histórias que ouviram, sentindo na pele a sensação de ser colocado na posição de excluído.

O mais gratificante e surpreendente foi a mudança de comportamento da classe do 2º ano de Análises Clínicas. Havia uma discente da terceira idade que frequentava a turma, mas que era excluída das atividades por eles. A experiência de visitar o abrigo fez com que eles repensassem suas atitudes e resgatassem a dona Maria do Carmo. A senhora já havia desistido de estudar pela dificuldade de aprendizagem e pela exclusão que sentia por parte dos colegas.

Figura 5: As turmas do 2º e 3º anos do curso de Análises Clínicas junto com as doações e a equipe do CRE-Idoso

Figura 6: Fraldas, alimentos, medicamentos, roupas doados

A escola é um local de promoção da cidadania e da transformação social. Nela, por meio de projetos e discussões, conseguimos transformar vidas. Muitos projetos de sucesso são colocados em prática ao longo da carreira do docente, mas este teve um significado especial de gratidão, tanto pelas histórias ouvidas, como pelas contadas pelo próprio idoso ou pelos cuidadores. Conseguimos perceber a fragilidade da vida e pudemos compartilhar de um olhar sensível e acolhedor para com os anciãos, respeitando-os e fazendo parte de suas vidas. 

Referências

CRUZ, R. C.; FERREIRA, M. A. Um certo jeito de ser velho: representações sociais da velhice por familiares de idosos. Texto Contexto Enfermagem, Florianópolis, v. 20, n° 1, p. 144-151, 2011. Disponível em: http://www.indexf.com/textocontexto/2011pdf/20-144.pdf.

NOGUEIRA, E. J.; LIMA, L. J. C.; MARTINS, L. A.; MOURA, E. R. Rede de relações sociais e apoio emocional: pesquisa com idosos. Revista de Iniciação Científica Cesumar, v. 11, n° 1, p. 65-70, 2009. Disponível em: http://periodicos.unicesumar.edu.br/index.php/iccesumar/article/viewFile/660/763.

TORRES, M. M.; SÁ, M. A. A. Inclusão social de idosos: um longo caminho a percorrer. Revista Ciências Humanas, Taubaté, v. 1, n° 2, 2008.

Publicado em 04 de junho de 2025

Como citar este artigo (ABNT)

AGUIAR, Sheila Lima Moraes. Unidos pela inclusão: respeito e igualdade - um relato de experiência. Revista Educação Pública, Rio de Janeiro, v. 25, nº 20, 4 de junho de 2025. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/25/20/unidos-pela-inclusao-respeito-e-igualdade-um-relato-de-experiencia

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