Utilização da inteligência artificial Amazon Alexa no ensino de Língua Inglesa para alunos do Ensino Médio
Marcos Aparecido Pereira
Docente no IFMT - Câmpus Cáceres Prof. Olegário Baldo e no PPGEn/IFMT - Câmpus Cuiabá
A aprendizagem de línguas estrangeiras desempenha papel fundamental no currículo do Ensino Médio, sendo garantida como disciplina pela Base Nacional Comum Curricular (BNCC). No contexto da formação técnica, como é o caso do Curso Técnico em Informática Integrado ao Ensino Médio, a Língua Inglesa assume destaque e relevância. Ela não apenas se torna uma ferramenta essencial para o desempenho de tarefas práticas e cotidianas dos profissionais da área como também desempenha papel crucial na busca por novos conhecimentos, especializações e formação contínua em um ambiente em que o inglês é o idioma dominante. No entanto, para além da formação técnica, o estudo de um idioma é uma porta de entrada para interações sociais e culturais que ampliam habilidades e competências e que produzem conhecimento em cenários diversos do mundo contemporâneo.
Nesse cenário, é necessário refletir sobre como integrar efetivamente as inovações tecnológicas ao ensino de línguas, na medida em que a tecnologia continua a desempenhar papel crescente na Educação. Tecnologia e língua inglesa, desse modo, tornam-se chaves para o aprimoramento pessoal e profissional desses estudantes em processo de formação. Nesse sentido, a Amazon Alexa, um assistente virtual ativado por voz, surge como plataforma potencialmente rica para apoiar o ensino de Inglês. Ela permite interações em inglês e oferece acesso a uma variedade de recursos educacionais com possibilidades de pesquisa, jogos de aprendizagem e músicas, dentre outros. No entanto, essa integração não é isenta de desafios, que incluem questões como disponibilidade de acesso à internet nas escolas, aquisição do equipamento necessário e nível de conhecimento tanto dos estudantes quanto dos professores para a utilização eficaz das tecnologias em sala de aula.
O presente trabalho buscou examinar as interações dos estudantes do Ensino Médio com a inteligência artificial Alexa nas aulas de Língua Inglesa. O estudo envolveu seis turmas do Ensino Médio do Instituto Federal de Ciências e Tecnologia de Mato Grosso (IFMT) - Câmpus Cáceres Prof. Olegário Baldo, abrangendo duas turmas de cada série, e foi conduzido ao longo de seis meses de 2023. Partiu-se da premissa de que a introdução do equipamento em sala de aula, se configurado apenas para língua inglesa, poderia despertar o interesse dos alunos e promover interações valiosas com a inteligência artificial, resultando em aprendizado, desinibição com relação ao uso do idioma e conhecimento acerca de novas tecnologias associadas ao processo de ensino-aprendizagem.
Nesse sentido, foi utilizada a observação participante, que, de acordo com Gil (2008), é uma técnica de pesquisa qualitativa na qual o pesquisador participa ativamente da situação que está sendo estudada, interagindo com os participantes e observando seus comportamentos e interações de maneira direta. Nesse método, o pesquisador não apenas observa passivamente, mas também se envolve na experiência, o que permite uma compreensão mais profunda dos fenômenos estudados. A escolha se justifica com base na própria dinâmica de sala de aula, haja vista que se faz necessária a integração com os estudantes durante as aulas.
Desse modo, os resultados apresentados aqui partem de observações registradas em caderno de campo. Essas observações foram selecionadas na fase de análise dos dados e interpretadas com base na teoria, nas vivências e no desenvolvimento específico dos grupos envolvidos; afinal, o contexto em que ocorrem as interações de pesquisa são parte indissociável da análise de dados em pesquisas de cunho fenomenológico.
Os resultados obtidos demonstram que a inclusão da inteligência artificial em sala de aula pode ser benéfica, mas ressaltam a necessidade de formação docente adequada e mediação constante do processo. Isso é essencial para garantir que a inteligência artificial não se limite a ser um instrumento decorativo, mas sim uma ferramenta eficaz de apoio ao ensino e à aprendizagem da Língua Inglesa. Portanto, a integração bem-sucedida da tecnologia requer esforço contínuo e abordagem pedagógica que maximize seu potencial como recurso educacional. Além disso, o estudo demonstra que o compartilhamento do equipamento por indivíduos com ideias, perspectivas e gostos diferentes configurou-se um excelente exercício de respeito à diversidade sociocultural dos estudantes, como será discutido ao longo deste trabalho.
Interações, aprendizados e reflexões
A integração da inteligência artificial no ambiente educacional tem sido alvo de crescente interesse por parte de docentes e de pesquisadores. Huang et al. (2023), por exemplo, ao revisar 516 artigos publicados entre 2000 e 2019, elenca os tópicos mais populares no que se refere ao ensino de línguas melhorado pelas inteligências artificiais: avaliação automatizada de textos e detecção de erros; sistemas tutores inteligentes de leitura e escrita; sistemas personalizados para aprendizagem de línguas tanto no que se refere à construção de vocabulário quanto ao uso comunicativo da linguagem em interações mediadas por sistemas tecnológicos; treinamento de pronúncia e de fala com base em recursos ou sistemas web para o aprendizado de idiomas; e estados afetivos e emoções em interações com inteligências artificiais.
O presente artigo tem a intenção de refletir acerca do uso de inteligência artificial, mais especificamente do assistente virtual Amazon Alexa, em aulas de Língua Inglesa em turmas do Ensino Médio. O estudo foi estabelecido com base em pesquisas, discussões e reflexões que exploram o uso de assistentes virtuais com enfoque em áreas de personalização do aprendizado, na facilitação da prática da língua e na compreensão de problemáticas relacionadas ao processo de ensino-aprendizagem de Inglês. Em outras palavras, busca-se focar em desafios que perpassam o cotidiano de professores de Língua Inglesa nessa etapa da Educação Básica. Além disso, as discussões propostas se embasam nos resultados de pesquisa realizada com estudantes do Curso Técnico em Informática integrado ao Ensino Médio do IFMT - Câmpus Cáceres Prof. Olegário Baldo.
Para isso, foi realizado estudo de caso com seis turmas, duas de cada série dos anos finais da Educação Básica, durante seis meses. Foi desenvolvida observação participante com registros em diário de campo. Os registros foram revisados, analisados e interpretados com base na experiência de pesquisa e relacionados com a teoria.
É possível dizer que a personalização do aprendizado é uma das principais vantagens do uso de assistentes virtuais no Ensino Médio, pois eles têm a capacidade de adaptar o conteúdo e as atividades de acordo com as necessidades individuais dos alunos. No entanto, não se pode deixar de lado o fato de que, para grande parte dos alunos das escolas públicas de Ensino Médio do país, a possibilidade de interação com a inteligência artificial talvez seja o primeiro motivador. A ludicidade e a experimentação de tecnologias reais utilizadas na vida social contemporânea convertem-se em possibilidades de vivência prática da relação escola-sociedade (em sua vertente tecnológica).
Há que se considerar que a maioria dos estudantes de escolas públicas brasileiras não vem de condições abastadas, possui limitações de acesso à internet ou de dispositivos de assistência virtual como o aqui exposto. Nesse sentido, proporcionar tal tipo de interação com mecanismos de inteligência artificial é permitir que estudantes de camadas menos favorecidas tenham a chance de conhecer, de interagir e de aprender na prática acerca das novas tecnologias que ganham o mercado todos os anos. Certamente não é uma solução em sua plenitude, mas uma forma de minimizar a distância entre a parcela menos favorecida e o que a sociedade de mercado tecnológico tem disponibilizado de mais moderno.
Acesso e produção de conhecimento possuem uma estreita relação, afinal. A interação entre acesso e produção de conhecimento é fundamental para o desenvolvimento educacional e social dos estudantes. O acesso a determinado bem, ferramenta, técnica ou dispositivo proporciona oportunidades para aprender, crescer e se desenvolver, enquanto a produção de conhecimento envolve a capacidade de aplicar, analisar, sintetizar e criar novas ideias e informações. Essas duas facetas estão intrinsecamente ligadas, pois o acesso a uma nova tecnologia pode inspirar e capacitar indivíduos a se tornarem produtores ativos de conhecimento. Nesse viés, quanto mais acessíveis forem esses recursos, maior será a oportunidade para os indivíduos adquirirem conhecimento em uma variedade de áreas e disciplinas.
Além disso, a produção de conhecimento envolve a aplicação do que foi aprendido para resolver problemas, criar novas descobertas ou contribuir para o avanço de determinada área. Logo, o uso de inteligência artificial em aulas de Língua Inglesa no Ensino Médio pode potencializar e dinamizar a realização de pesquisas originais, a elaboração de trabalhos, a criação de arte ou a participação em projetos colaborativos.
Quando o acesso à tecnologia e a produção de conhecimento estão interligados, os benefícios são significativos. Essa relação dinâmica contribui para o crescimento intelectual e o progresso social, promovendo uma cultura de aprendizado contínuo e inovação. Investir em estratégias que promovam tanto o acesso à tecnologia quanto a produção de conhecimento é essencial para criar uma sociedade mais educada, criativa e capacitada a enfrentar os desafios do mundo contemporâneo. Isso requer o desenvolvimento de políticas e programas educacionais que garantam o acesso equitativo ao conhecimento e incentivem a participação dos indivíduos na criação e disseminação de novas ideias e descobertas.
Vale mencionar ainda que, apesar do potencial promissor dos assistentes virtuais para personalizar o aprendizado, as escolas públicas enfrentam desafios significativos na implementação dessa abordagem. Questões relacionadas a infraestrutura tecnológica, formação de professores e acesso equitativo à tecnologia são algumas das barreiras que precisam ser superadas para garantir que todos os alunos se beneficiem das vantagens da personalização do aprendizado (Ertmer et al., 2015).
Na contemporaneidade, o acesso à tecnologia tornou-se um marco de inclusão ou exclusão; logo, quem não tem a possibilidade de conhecer, de interagir e de aprender a utilizar dispositivos e softwares infelizmente não tem possibilidade de fazer parte e uso de bens sociais, econômicos e culturais deste século.
A escola, sendo laboratório de exploração do mundo do conhecimento, deveria poder proporcionar também esse tipo de conhecimento com a intenção de minimamente preparar e incluir o cidadão para a vida em sociedade. Ou seja, uma instituição que não capacita seus profissionais e não disponibiliza recursos tecnológicos atualizados certamente possui déficit na formação do estudante para o meio em que ele vive e, certamente, não está contribuindo para sua inserção em espaços sociais importantes na atualidade.
Estudos têm demonstrado que o acesso à tecnologia está intrinsecamente ligado à inclusão social. Segundo dados da Organização das Nações Unidas (ONU), o acesso à internet é um dos principais impulsionadores do desenvolvimento social e econômico, permitindo que as pessoas se conectem, acessem informações, oportunidades de emprego e educação e participem ativamente da vida em comunidade (ONU, 2020). Portanto, indivíduos que não têm acesso à tecnologia estão em desvantagem significativa em termos de participação social e oportunidades econômicas.
A escola desempenha papel fundamental na preparação dos alunos para viver e prosperar em uma sociedade digital. Como instituição dedicada à formação integral dos indivíduos, a escola deve garantir que todos os alunos tenham acesso às ferramentas e aos recursos tecnológicos necessários para desenvolver habilidades essenciais para o século XXI. Isso inclui não apenas o acesso físico à tecnologia, mas também a capacitação dos professores para integrar efetivamente a tecnologia ao currículo e proporcionar experiências de aprendizado significativas e relevantes (Ertmer et al., 2015).
Nas turmas pesquisadas, por exemplo, há grande diversidade de perfis de estudantes; alguns poucos conhecem e possuem Alexa. Há, além disso, alguns que possuem nível básico de compreensão do idioma a fim de interagir com o assistente virtual por meio de comandos simples. No entanto, a grande maioria nunca tinha tido a oportunidade de interagir com o dispositivo.
No princípio, notou-se certo receio, quase sempre por questões de medo de não saber falar, de "falar errado" e de não ser compreendido. Entretanto, a imitação do outro, a interação entre os pares e com o docente rapidamente dissipou essa vergonha inicial. Como toda e qualquer novidade, é preciso ambientar-se a ela antes de poder usufruir dela adequadamente.
É importante destacar que os alunos nessa faixa etária estão passando por mudanças significativas em seu desenvolvimento cognitivo e emocional. Ao falar sobre as fases do homem, Erikson (1968) ressalta as crises de identidade que os adolescentes enfrentam durante essa etapa da vida. Essas mudanças emocionais e cognitivas podem influenciar a forma como os alunos lidam com a escola, com os professores, com os colegas, com as novas tecnologias e com os desafios de aprendizado; afinal, os jovens tendem a querer fazer parte de grupos, e de não ser expostos negativamente.
Logo, estimular a acolhida por parte daqueles estudantes que apresentam maior desenvolvimento linguístico na língua inglesa para com aqueles que apresentam dificuldades ou limitações é fundamental no processo. É nesse ponto que a mediação e a condução docente são imprescindíveis para o desenvolvimento das habilidades e capacidades dos estudantes.
Sabendo que a colaboração entre estudantes tem sido reconhecida como estratégia eficaz para promover a aprendizagem ativa e significativa (Johnson; Johnson, 2009), quando os próprios adolescentes ensinam outros adolescentes eles estabelecem laços, criam vínculos e vivenciam experiências humanas de ensinar e aprender desenvolvendo empatia, respeito e compreensão mútua.
Notou-se durante a pesquisa como o processo de colaboração entre os indivíduos auxilia na assimilação de conhecimentos. Às vezes, numa aula, um discente acionava a Alexa a pedido de outro que apenas observava. Na aula seguinte, porém, o que antes observava dava um jeito de chegar mais cedo ou de pedir licença para utilizar o dispositivo. A título de curiosidade, algumas vezes eles até traziam colegas de outros cursos para conhecer a novidade.
O jogo de imitação faz parte do aprendizado e leva-nos a alcançar outros níveis de aprendizado. Aprendemos com o outro e por meio do outro, inclusive no que diz respeito ao uso de tecnologias. O jogo de imitação, como observado no contexto da sala de aula, desempenha papel importante no aprendizado dos alunos. Ao imitar o comportamento de seus colegas, os alunos têm a oportunidade de experimentar e internalizar novos comportamentos e habilidades (Bandura, 1977). Nesse sentido, o uso da tecnologia, como a Alexa, pode servir como veículo para o aprendizado colaborativo em que os alunos aprendem uns com os outros e por meio dos outros.
Destaca-se nesse contexto que estudantes que nunca tinham lidado com o dispositivo Alexa tendem a interagir mais com ele, o que mostra a importância de proporcionar esse tipo de experiência em sala de aula. A oportunidade de interação com o assistente virtual se mostra mais eficaz na proporção inversa de sua utilização fora do espaço escolar. Nesse caso, a interação é mais positiva com estudantes menos favorecidos. Respeitadas as devidas diferenças entre as pesquisas, esse fato demonstra uma perspectiva diversa à da pesquisa realizada por Lavinas e Veiga (2013), em que os estudantes mais favorecidos tiveram melhores resultados.
Apesar de na maior parte dos casos os estudantes apenas pedirem música, o processo de interação linguística em língua inglesa mostrou-se benéfico no aprimoramento da pronúncia, do vocabulário e, especialmente, da desinibição do uso do idioma estrangeiro. Ser capaz de acionar o dispositivo, além disso, proporciona aos estudantes senso de autorrealização e melhora a autoestima a partir da perspectiva em que eles notam que são capazes de interagir verdadeiramente em língua inglesa. Isso se dá porque as interações linguísticas proporcionadas em sala de aula do Ensino Médio quase nunca são interações reais. São simulações, role plays ou respostas pré-construídas. Desse modo, a interação espontânea e desvinculada do rol de conteúdos e das avaliações manipuladas pelo fazer pedagógico do professor converte-se numa interação genuína por parte do estudante que, a seu próprio livre-arbítrio, decide "conversar" com o dispositivo.
A teoria da aprendizagem social enfatiza a importância da interação social para o desenvolvimento linguístico. A interação com assistentes virtuais pode simular situações de conversação e proporcionar um ambiente de prática, haja vista que a inteligência artificial e as tecnologias digitais fazem parte do que podemos considerar um tipo de interação social nos dias de hoje, afinal sabe-se que boa parte de nossas interações cotidianas se dá por meio de mensagens escritas que nem sempre são mediadas por seres humanos. Ou seja, o social na contemporaneidade abrange o real e o virtual, o humano e a inteligência artificial. Quando esta se torna capaz de operar sistemas, dar informações, feedbacks e direcionamentos que antes só eram possíveis por meio da interação humana, as fronteiras do social se expandem.
A presença da inteligência artificial nas interações sociais está se tornando cada vez mais comum. Assistentes virtuais como a Amazon Alexa, Google Assistant e Siri são capazes de interagir e responder a perguntas dos usuários, realizar tarefas simples e até mesmo oferecer companhia emocional. Esses agentes de inteligência artificial são projetados para simular interações humanas e fornecer assistência em uma variedade de áreas, desde pesquisa na web até controle de dispositivos domésticos inteligentes.
Assim, é preciso que a escola ofereça condições de acesso às tecnologias especialmente para aqueles estudantes que não desfrutam dessas tecnologias em ambientes fora da sala de aula. Essa é uma forma não apenas de incentivar o aprendizado tornando o espaço pedagógico mais lúdico, atrativo e mais próximo da realidade do mundo além-escola, mas também uma possibilidade de experimentação tecnológica que pode ser única na vida de determinados estudantes.
A falta de acesso às tecnologias pode ampliar as desigualdades educacionais, limitando o acesso dos alunos a recursos e oportunidades de aprendizado essenciais (Warschauer, 2006). Portanto, é fundamental que as escolas adotem medidas para garantir que todos os alunos tenham acesso às tecnologias necessárias para apoiar seu aprendizado.
Nesse sentido, oferecer acesso às tecnologias na escola pode tornar o ambiente pedagógico mais estimulante e envolvente para os alunos. A integração de tecnologias educacionais, como computadores, dispositivos móveis e softwares interativos, pode tornar as aulas mais dinâmicas, promover a colaboração entre os alunos e facilitar a aprendizagem personalizada (Bebell; O'Dwyer, 2010).
É válido lembrar que a escola é sempre espaço heterogêneo, tanto no que se refere a discentes quanto a docentes. Olhar e procurar atender a essa diversidade é o primeiro marco para superar as barreiras que perpassam a construção do conhecimento e os desafios que encontramos no que se refere à inserção tecnológica, em que muitas vezes há apenas práticas tradicionais de ensino. A heterogeneidade é um desafio, sempre foi e será, uma vez que lidar com seres humanos é irremediavelmente múltiplo e diverso. É nesse espaço de diversidade que o conhecimento se constrói da melhor forma; logo, é preciso respeitar estágios de amadurecimento, de contato com esses aparelhos tecnológicos e integrá-los de forma que eles possam ir ao encontro e não "de encontro" às práticas pedagógicas eficazes.
Estudantes e docentes devem encontrar na tecnologia uma aliada para a construção de conhecimento, e não uma adversária. A tecnologia pode ser uma ferramenta poderosa para facilitar o acesso à informação, promover a colaboração, estimular a criatividade e personalizar o processo de aprendizagem. Quando utilizada de maneira adequada, a tecnologia pode enriquecer a experiência educacional, oferecendo recursos e oportunidades que antes não estavam disponíveis.
Para tal, docentes devem se sentir seguros e preparados e os estudantes, apoiados e não avaliados dentro desse processo de interação com a tecnologia. A avaliação quebra o processo natural de interlocução com o dispositivo, gera ansiedade, cria barreiras para a utilização e converte a inteligência artificial em mais uma ferramenta de mensuração de aspectos formais do ensino. Esse tipo de abordagem avaliativa não contribui para que os estudantes vejam o dispositivo de inteligência artificial como um artefato livre que permite acesso ao conhecimento. À vista disso, durante o período de pesquisa os estudantes puderam utilizar o dispositivo sem quaisquer vínculos a nota, conceituação ou exercício pedagógico formal.
Vygotsky (1978) destaca a importância de uma instrução personalizada para atender ao nível atual de habilidade do aluno, permitindo um progresso significativo; os primeiros contatos com a inteligência artificial, sobretudo em língua estrangeira, podem assustar docentes e discentes. Ainda assim, parece-me imprescindível, já que é a interação cotidiana e o aprendizado constante que permitem o melhor desse tipo de equipamento. Além disso, faz-se necessário que o mediador do conhecimento reconheça limitações e inibidores em diferentes grupos de estudantes, bem como seus próprios, a fim de poder incentivá-los de forma individualizada, especialmente nos primeiros contatos.
Durante a observação, merecem destaque problemas de pronúncia que se tornam impeditivos para que o dispositivo execute as ações solicitadas. Troca de palavras como "pray" e "play" ou a entonação de nomes de artistas estrangeiros ou brasileiros tiveram que ser ajustadas com algumas repetições, às vezes. Por outro lado, os próprios estudantes rapidamente perceberam que não há necessidade de uso ilibado do idioma para estabelecer relação comunicativa com a Alexa. Isso é um fato bastante positivo, porque rompe com a ideia preconcebida que muitos estudantes brasileiros têm de um certo purismo linguístico acerca do uso da língua inglesa. A construção de uma perspectiva de língua franca (MacKenzie, 2014), ou seja, do idioma como meio comum de comunicação entre diferentes povos, é, sem dúvida, um aprendizado valioso para todo e qualquer estudante brasileiro.
Ainda neste viés, comandos simples que levam a perguntar, tocar, repetir, aumentar e abaixar o volume precisam ser trabalhados em turmas muito iniciais, haja vista que o desconhecimento de qualquer vocabulário de ativação do produto pode ser um primeiro entrave para que a interação aconteça. No entanto, também vale lembrar que os próprios estudantes são capazes de se auxiliar nesse processo, como já foi destacado.
De acordo com Kaswan (2024), as potencialidades das tecnologias de inteligência artificial residem na capacidade de revolucionar os modelos educacionais convencionais, proporcionando abordagens adaptativas e personalizadas. Essa ação aprimora o envolvimento dos alunos e a eficácia da aprendizagem a partir do momento que oferecem experiências educacionais mais abrangentes. Logo, a personalização do aprendizado por meio de assistentes virtuais pode melhorar o desempenho acadêmico tendo em vista a adaptação das necessidades individuais dos alunos.
Para que isso aconteça é preciso que o mediador tenha a habilidade de reconhecer estágios de desenvolvimento e ser capaz de conduzir os estudantes aos próximos níveis de interação até que eles possam agir de forma autônoma. Isso requer habilidades de observação, avaliação e orientação para garantir que os alunos possam agir de forma autônoma à medida que desenvolvem suas habilidades (Wong et al., 2019). À vista disso, a personalização do aprendizado permite que os alunos avancem em seu próprio ritmo, recebendo apoio adicional quando necessário e sendo desafiados de acordo com seu nível de habilidade (Baker et al., 2008).
No entanto, também foi possível observar que a falta de condução no uso do equipamento pode gerar problemas. O primeiro deles foi observado em duas turmas, uma do 1º ano e outra do 2º. Nessas turmas, no início alguns alunos monopolizaram o equipamento, o que rapidamente começou a gerar desconforto no grupo, uma vez que outras pessoas queriam interagir com a inteligência artificial e ter a oportunidade de ouvir as músicas de sua preferência. Foi preciso intervir e dialogar acerca de respeito, empatia, tolerância, diversidade cultural, gêneros musicais e suas importâncias dentro de contextos socioculturais específicos. Tudo isso com a finalidade de criar um ambiente saudável de compartilhamento de vivências e experiências humanas em que a valorização do outro e de suas particularidades são o ponto chave para a convivência social.
Outro ponto de dificuldade se deu devido à configuração do dispositivo apenas em língua inglesa. Como se tencionava que os estudantes pudessem praticar esse idioma, houve maior dificuldade quando era solicitado à inteligência artificial alguma música ou artista brasileiro. A Alexa geralmente tinha dificuldade em compreender solicitações desse tipo. No entanto, os alunos aprenderam rápido que alterar o sotaque para o esquema fonético em inglês gera menos erros nesse tipo de situação. Ou seja, eles aprenderam a imitar um americano falando em inglês para ser capaz de conseguir o artista ou a música brasileira que gostaria.
Nesse viés, compreende-se que o problema acabou tornando-se uma parte relevante e fundamental do aprendizado, já que proporcionou aos estudantes uma compreensão mais ampla de padrões linguísticos – especialmente fonéticos – que fazem parte de qualquer idioma. Esses padrões constituem-se como marcas de povos e idiomas e é importante reconhecê-los.
Estudos sobre aquisição de segunda língua enfatizam a importância da consciência fonética na aprendizagem de um novo idioma (Celce-Murcia et al., 2010). Ao enfrentar dificuldades para interagir com a Amazon Alexa em situações que envolvem músicas ou artistas brasileiros, os alunos foram levados a refletir sobre as diferenças fonéticas entre o inglês e o português.
Se, por um lado, esse processo de reflexão pode ajudar os alunos a desenvolver uma consciência mais aguçada das nuances linguísticas e a reconhecer a importância de adaptar sua pronúncia e entonação para melhorar a compreensão e a comunicação em ambientes multilíngues, por outro eles compreenderam que isso não deve ser impeditivo ao processo de comunicação. Todas as vezes que isso aconteceu, aproveitou-se para refletir com as turmas acerca das marcas linguísticas da língua portuguesa presentes na comunicação em língua inglesa.
É importante ressaltar que abordagens pedagógicas que valorizam a consciência linguística e a reflexão metalinguística têm sido associadas a melhores resultados no ensino de línguas estrangeiras (Ellis, 2015). Ao enfrentar desafios relacionados à configuração da Amazon Alexa, os alunos foram incentivados a refletir sobre questões linguísticas e culturais mais amplas, o que pode contribuir significativamente para seu desenvolvimento linguístico e intercultural.
Nessa compreensão, é fundamental reconhecer a língua como ato comunicativo e o valor de uma língua franca global, especialmente no contexto contemporâneo de globalização e interconexão cultural. O inglês é amplamente utilizado como língua de comunicação internacional; portanto, é essencial que os alunos reconheçam e respeitem a si próprios ao usar o inglês como língua estrangeira, valorizando suas peculiaridades e esforços para se comunicar efetivamente em um ambiente multilíngue. Isso implica promover uma atitude de tolerância e aceitação das diferentes variedades do inglês, bem como reconhecer a diversidade linguística como reflexo da riqueza cultural e da complexidade da comunicação humana. Ao abordar questões relacionadas à pronúncia e à compreensão da língua inglesa na interação com a Amazon Alexa, os alunos são incentivados a desenvolver uma consciência mais ampla das variedades linguísticas e a valorizar a diversidade linguística como aspecto essencial da comunicação intercultural.
A terceira e última dificuldade encontrada tem relação com a estagnação do uso da inteligência artificial por parte das turmas. Quando os estudantes não são estimulados a outros usos da Amazon Alexa, eles a utilizam apenas como tocador de música. Essa função com certeza é a mais simples de ser utilizada em inglês, tanto pelo repertório artístico e musical dos estudantes quanto pelo fato de que não é necessária compreensão das respostas provenientes da inteligência artificial. Logo, para que o docente possa usufruir melhor dessa tecnologia em sala de aula é necessário planejamento, conhecimento das possibilidades didático-pedagógicas para cada nível de estudo, bem como estímulo à interação linguística com o dispositivo tecnológico.
Para incentivar uma interação mais significativa e linguística com o dispositivo tecnológico, os professores podem adotar estratégias de ensino que integrem a Amazon Alexa de forma mais abrangente ao currículo. Isso pode incluir a realização de atividades colaborativas que envolvam pesquisas baseadas em perguntas que devem ser feitas à inteligência artificial. Esse tipo de atividade tem a capacidade de desenvolver tanto a fala quanto a compreensão auditiva dos estudantes. Logo, ao promover uma abordagem mais ativa e participativa no uso da tecnologia, os estudantes têm a oportunidade de desenvolver habilidades linguísticas e cognitivas de forma mais profunda e significativa (Ertmer et al., 2015).
À vista disso, é essencial que os docentes estejam capacitados e motivados a explorar o potencial pedagógico da inteligência artificial, adaptando suas práticas de ensino para incorporar de maneira eficaz essas tecnologias em sala de aula. Desse modo, o investimento em formação docente e o desenvolvimento de recursos educacionais específicos para o uso da Amazon Alexa podem ajudar a superar as barreiras e desafios associados à implementação dessa tecnologia no contexto educacional.
Considerações finais
Em meio ao crescente interesse pelo uso da inteligência artificial na sociedade, este estudo oferece reflexões sobre o impacto do assistente virtual Amazon Alexa no campo educacional, mais especificamente no ensino de Língua Inglesa para estudantes do Ensino Médio. Ao revisar a literatura, observamos que a personalização do aprendizado e a integração de tecnologias digitais têm sido temas recorrentes de pesquisa, destacando a importância de abordagens adaptativas e personalizadas no ensino de idiomas.
Os dados obtidos sugerem que a incorporação da Alexa nas aulas de Inglês pode ser benéfica para os alunos, proporcionando uma experiência de aprendizado mais envolvente, personalizada e guarnecida de autonomia. No entanto, é crucial reconhecer os desafios enfrentados pelas escolas públicas na implementação dessas abordagens, incluindo questões relacionadas à infraestrutura tecnológica e à formação de professores.
É válido ressaltar que a falta de acesso equitativo à tecnologia pode ampliar as desigualdades educacionais, privando alguns alunos de recursos e oportunidades essenciais de aprendizado. Nesse sentido, a escola desempenha papel fundamental na garantia de que todos os alunos tenham acesso às ferramentas e aos recursos necessários para desenvolver habilidades relevantes para a plena atuação na sociedade contemporânea.
Vale ainda lembrar que é essencial que a tecnologia pode oferecer recursos e oportunidades que antes não estavam disponíveis, enriquecendo a experiência educacional e preparando os alunos para enfrentar os desafios do mundo moderno. No entanto, é necessário um esforço conjunto para superar as barreiras e garantir que todos os alunos se beneficiem plenamente das vantagens da tecnologia no processo de aprendizado. Ao mesmo tempo, é necessário que esse recurso não seja tão-somente lúdico e que não se resuma a reprodutor de música em sala de aula. Para tal, é preciso investimento por parte do docente na criação de estratégias didáticas que possam explorar melhor o potencial da inteligência artificial.
Por fim, a pesquisa revelou que a inserção da Amazon Alexa em sala de aula oportunizou não apenas o desenvolvimento de habilidades linguísticas ou o processo de desinibição do uso do idioma estrangeiro; a inteligência artificial em sala de aula promoveu discussões acerca do preconceito linguístico que envolve o uso da língua inglesa como língua estrangeira por brasileiros, além de questões relacionadas às interações humanas, à empatia, à diversidade cultural e a outras temáticas tão necessárias à convivência social na contemporaneidade.
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Publicado em 11 de junho de 2025
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PEREIRA, Marcos Aparecido. Utilização da inteligência artificial Amazon Alexa no ensino de Língua Inglesa para alunos do Ensino Médio. Revista Educação Pública, Rio de Janeiro, v. 25, nº 21, 11 de junho de 2025. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/25/21/utilizacao-da-inteligencia-artificial-amazon-alexa-no-ensino-de-lingua-inglesa-para-alunos-do-ensino-medio
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