Compreensão dos professores da Educação Básica sobre as tecnologias de inteligência artificial para o ensino
Ana Paula Campos de Carvalho
Professora da Educação Básica em Minas Gerais
A inteligência artificial (IA) tem obtido crescente reconhecimento nos últimos anos, em grande parte devido aos avanços significativos na capacidade de processamento computacional, o que tem possibilitado sua aplicação em diversas áreas do conhecimento, como na agricultura (Barros; Freitas Junior, 2023), no enfrentamento à disseminação de doenças (Neves, 2020), na Robótica (Amaral; Gasparotto, 2021), em jogos (Gonsalves, 2018) e no Direito (Oliveira; Costa, 2018), dentre outros. Desde sua origem, em 1956, a IA se caracteriza por sua natureza multidisciplinar, integrando áreas como Filosofia, Psicologia, Lógica, Matemática e Ciência da Computação. Nos últimos anos, tem sido progressivamente influenciada por novos campos do saber, como a Biologia e as Neurociências (Senai, 2018). De maneira geral, o uso das tecnologias digitais tem promovido a criação de novos modos de interação, produção e existência, além de contribuir para a formação da cultura digital contemporânea (Valente, 2018). No campo educacional, o tradicional método de ensino “quadro e giz” vem perdendo espaço frente aos avanços tecnológicos que transformam o processo de ensino-aprendizagem. As tecnologias digitais têm sido cada vez mais incorporadas nas práticas pedagógicas, com estudantes substituindo cadernos por tablets ou smartphones e professores adotando plataformas de ensino como Google Sala de Aula e Moodle para conduzir suas práticas (Chassignol et al., 2018). Além disso, políticas públicas sistêmicas têm sido regularmente selecionadas e/ou atualizadas para promover a inclusão das tecnologias nas escolas, visando maior integração dessas ferramentas ao contexto educacional.
Uma das principais diretrizes nacionais que orientam o uso de tecnologias digitais no contexto educacional é a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), homologada em 2017. Esse documento estabelece dez competências gerais que devem ser desenvolvidas ao longo da Educação Básica, dentre as quais se destaca a competência 5, que descreve as habilidades esperadas dos estudantes no que se refere ao uso das tecnologias digitais de informação e comunicação. Segundo a BNCC (2017), é esperado do aluno:
compreender, utilizar e criar tecnologias digitais de informação e comunicação de forma crítica, significativa, reflexiva e ética nas diversas práticas sociais (incluindo as escolares) para se comunicar, acessar e disseminar informações, produzir conhecimentos, resolver problemas e exercer protagonismo e autoria na vida pessoal e coletiva. (Brasil, 2017).
Complementando as orientações da BNCC, o Conselho Nacional de Educação (CNE) enfatiza a necessidade de refletir sobre os meios mais adequados para a implementação de políticas públicas educacionais que garantam o acesso equitativo à computação e às tecnologias digitais. Segundo o Parecer CNE/CEB nº 2/2022, homologado pela Resolução CNE/CEB nº 1, de 4 de outubro de 2022, é imprescindível assegurar que o domínio dessas tecnologias não se configure como privilégio, mas como direito de todos os estudantes brasileiros, respeitando suas singularidades, necessidades e as modalidades educacionais existentes (CIEB, 2023). Não obstante, essa pode não ser ainda a realidade de muitos profissionais dentro das salas de aula, devido às dificuldades na capacitação profissional e à insegurança na utilização das tecnologias digitais.
A qualificação profissional formal (como especialização, mestrado e doutorado) ainda é um desafio para parte dos professores do Ensino Médio. O relatório nacional Talis (OCDE, 2018) mostra que, dentre esses profissionais, 52% possuem algum curso de especialização, 13% possuem mestrado e apenas 2,4% possuem doutorado. O documento mostra ainda que, nos últimos 12 meses, menos de 30% dos profissionais conseguiram participar de algum programa de qualificação (Talis, 2018), revelando os desafios da capacitação profissional para o professor. Consequentemente, isso pode dificultar que esse profissional acompanhe os constantes avanços tecnológicos para a prática docente.
Apesar de o uso das tecnologias digitais estar amplamente disseminado entre os estudantes, sua aplicação ocorre predominantemente no âmbito do entretenimento. Observa-se que muitos alunos demonstram grande interesse por tarefas tecnológicas complexas, como jogos computacionais, enquanto desenvolvem aversão por disciplinas como a Matemática, muitas vezes em decorrência da dificuldade em perceber a relação intrínseca entre essas duas áreas do conhecimento (Malagutti, 2002). Tal desconexão evidencia a importância de estratégias pedagógicas que articulem os recursos tecnológicos com os conteúdos curriculares, de modo a potencializar o interesse dos estudantes e a promover aprendizagens mais significativas (Malagutti, 2002).
Um estudo realizado pelo Centro de Inovação para a Educação Brasileira (CIEB) aponta que um em cada cinco municípios brasileiros ainda não tem o ensino de Tecnologia e Computação no currículo escolar dos anos iniciais do Ensino Fundamental (1° ao 5° ano) e 17% não os têm nos anos finais (6° ao 9° ano). Sabendo da importância da Educação Básica para a construção do protagonismo juvenil, enfrentando os desafios das políticas educacionais brasileiras, tal como a implementação do novo currículo do Ensino Médio em 2017, e tendo vivenciado o período de ensino remoto imposto pelo isolamento devido à pandemia da covid-19 durante os anos de 2020 e 2021, pode-se reconhecer e valorizar a importância das tecnologias digitais como recurso pedagógico. Ainda nesse curto espaço de tempo, vimos ascender a utilização e a preocupação com a inteligência artificial na Educação.
Em particular, com o lançamento do ChatGPT (Generative Pre-Trained Transformer) no final de 2022, surgiram preocupações entre pesquisadores e educadores quanto aos possíveis impactos desse recurso no processo de construção do conhecimento dos estudantes, especialmente quando utilizado de forma automatizada em atividades escolares, o que poderia comprometer o desenvolvimento de aprendizagens efetivas (Barbosa; Portes, 2023). Apesar do intenso debate em torno do uso dessa tecnologia pelos estudantes, observa-se uma lacuna nas discussões a respeito da compreensão e do preparo dos professores — sobretudo aqueles que atuam na rede pública de Educação Básica — para lidar com essas inovações. Isso se deve, em parte, ao fato de que a formação inicial e continuada docente nem sempre acompanha o ritmo das transformações tecnológicas, frequentemente permanecendo atrelada a paradigmas pedagógicos tradicionais e pouco flexíveis (Correia, 2021). As dificuldades enfrentadas pelos educadores para acessar processos de capacitação atualizados restringem a apropriação dos recursos e das potencialidades que a inteligência artificial pode oferecer ao contexto educacional.
Diante do exposto, o presente estudo visa investigar a compreensão dos professores da Educação Básica sobre o uso das tecnologias de inteligência artificial para o ensino. A IA é a capacidade que alguns dispositivos eletrônicos possuem para funcionar tal como o pensamento humano, percebendo variáveis, tomando decisões e resolvendo problemas (Barbosa; Portes, 2023; Senai, 2018). Esse é um conceito que pertence à Ciência da Computação criado por J. McCarthy, e consiste na capacidade que máquinas (físicas, softwares e outros sistemas) têm de interpretar dados externos, aprender a partir dessa interpretação e utilizar o aprendizado para resolver tarefas específicas e atingir objetivos determinados (Barbosa; Portes, 2023). Ao longo dos anos, a IA vem crescendo e impactando o campo da educação (Senai, 2018). A motivação desse trabalho parte da atual mobilização internacional, e até mesmo nacional, sobre os avanços do uso das tecnologias de inteligência artificial na Educação Básica, especialmente, dentre alunos em busca de respostas e textos prontos para resolver atividades propostas por professores em salas de aulas muitas das vezes convencionais.
Metodologia
O presente estudo foi dividido em duas partes. A primeira consistiu em uma etapa formativa, com base em pesquisas bibliográficas, artigos científicos, documentos normativos, sites de jornais e revistas, a fim de se traçar um panorama do uso das Tecnologias Digitais no Brasil.
A segunda etapa consistiu na elaboração de um questionário, a fim de investigar a compreensão dos professores da educação básica sobre as tecnologias de IA para o ensino. O questionário foi criado na plataforma Google Formulário e composto por doze questões. As quatro primeiras questões foram categóricas e visavam conhecer o público-alvo:
- Em qual estado federativo o professor atua;
- Grau de escolaridade;
- Segmento da escola que o professor leciona;
- Em qual nível de ensino o professor atua.
As próximas sete questões, de múltipla escolha, visavam obter informações sobre a compreensão, a utilização e as expectativas do professor sobre o uso da IA na sala de aula:
- Você já ouviu falar sobre o uso da inteligência artificial na Educação?
- Você já utilizou ou utiliza a IA na preparação de suas aulas?
- Enquanto professor, você tem conhecimento de que seus alunos usam a IA em seus estudos e/ou preparação de trabalhos ou tarefas?
- Você já trabalhou com seus alunos usando a IA como ferramenta pedagógica?
- Você tem a intenção ou interesse em utilizar a IA como ferramenta pedagógica?
- Se o uso da IA nas salas de aulas pode beneficiar ou prejudicar o processo de ensino-aprendizagem;
- E quais as expectativas do uso da IA na Educação.
Finalmente, uma última questão discursiva solicitava ao professor que citasse quais plataformas ou ferramentas de IA ele conhece e que podem ser utilizadas na educação.
O formulário foi compartilhado em grupos nas redes sociais via WhatsApp, Telegram e Instagram e solicitou-se que os professores compartilhassem com outros que pudessem contribuir com a pesquisa.
A coleta de dados ocorreu por dez dias, entre 14 e 24 de novembro de 2023 e os resultados são apresentados no tópico a seguir.
Análise e discussão dos resultados
A primeira etapa deste estudo consistiu no levantamento de documentos e diretrizes educacionais nacionais, identificando-se, nesse contexto, o documento elaborado pela Secretaria de Educação Média e Tecnológica do Ministério da Educação (Semtec/MEC) em 1999 (CNE/CEB, 1999). Esse documento propunha, à época, estratégias e ações de caráter nacional que contemplavam a utilização de tecnologias como recurso de apoio ao processo de ensino e aprendizagem. Ressaltava-se, contudo, que o simples uso de tecnologias educacionais não garantiria, por si só, transformações significativas no cenário educacional, tampouco deveria ser associado a uma pseudomodernização do ensino. Ao contrário, defendia-se a incorporação das tecnologias no âmbito de um projeto educativo mais amplo, voltado à renovação metodológica, à ampliação da oferta e à melhoria da qualidade da educação.
Apesar dessas recomendações estabelecidas desde o final da década de 1990, observa-se que as instituições escolares brasileiras e a sociedade, de modo geral, ainda enfrentam desafios quanto à integração efetiva das tecnologias no ambiente educacional. Entre os fatores limitantes, destacam-se a carência de formação específica e continuada para professores e demais profissionais da educação no uso de mídias digitais e recursos tecnológicos (Bittencourt; Albino, 2017). Soma-se a isso a persistente desigualdade estrutural no acesso às tecnologias no território nacional. Dados recentes da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel, 2023) indicam que 2,5% das escolas brasileiras permanecem sem acesso à energia elétrica, enquanto seis unidades federativas apresentam mais de 10% de suas instituições de ensino desprovidas de conexão à internet: Acre (46,0%), Amazonas (40,9%), Roraima (36,1%), Pará (27,9%), Amapá (27,5%) e Maranhão (11,9%).
A simples falta de energia elétrica bem como a restrição de acesso à internet em algumas localidades já mostram os desafios dos professores em compreender o uso da inteligência artificial como recurso pedagógico, uma vez que redes sem fio (internet Wi-Fi), tecnologias móveis (celulares e tablets) e o armazenamento de conteúdos em nuvem influenciam diretamente o manuseio da IA (Senai, 2018).
Estima-se que a inserção da inteligência artificial no âmbito educacional tenha ocorrido a partir da década de 1980, inicialmente direcionada para o ensino de conteúdos específicos, como a aritmética. No entanto, foi somente nas últimas décadas que se verificaram avanços mais significativos no desenvolvimento e aplicação de soluções baseadas em IA para a educação (Tavares et al., 2020). Entre essas inovações, destacam-se os sistemas de aprendizagem adaptativa, os tutores inteligentes, as ferramentas de diagnóstico, os sistemas de recomendação de conteúdos, os mecanismos de identificação de estilos de aprendizagem, os ambientes virtuais interativos, as estratégias de gamificação e o uso da mineração de dados educacionais (Ibidem) e muito recentemente com o uso do ChatGPT, que é resultante do desenvolvimento de chatbots que tiveram início na segunda metade do século XX (Pereira; Souza, 2023). Tais recursos vêm ampliando as possibilidades de personalização dos processos de ensino-aprendizagem, promovendo intervenções pedagógicas mais eficientes, responsivas e alinhadas às necessidades individuais dos estudantes. Discussões sobre essa nova ferramenta, suas aplicações e consequências estão em todos os lugares, principalmente nas salas dos professores de milhares de escolas do país.
A segunda etapa do estudo buscou trazer essas discussões da sala dos professores a fim de elucidar os anseios, expectativas e a compreensão dos mestres da educação básica sobre a utilização da IA como recurso pedagógico. Muitos professores passaram a desconfiar da perfeição de textos e tarefas que eram trazidos por alunos que rotineiramente eram corrigidos por erros grosseiros de ortografia e interpretação. Ao todo, 36 docentes participaram da pesquisa e a responderam de cinco Estados brasileiros diferentes: Minas Gerais (25), Espírito Santo (6), São Paulo (3), Pernambuco (1) e Rondônia (1). Os professores participantes atuam na rede estadual (55,6%), na rede municipal (41,7%) e na rede particular (13,9%) de ensino. A maioria (61,1%) tomou conhecimento sobre a IA somente nos dois últimos anos e 5,6% ainda não têm conhecimento dessa temática, todavia, mesmo ainda sem capacitação, a maioria dos professores demonstra interesse em utilizar a IA como recurso pedagógico (Figura 1).

Figura 1: Interesse do professor da Educação Básica em utilizar a IA como recurso pedagógico
Destaca-se ainda que a falta de suporte ou de autorização da escola também é uma limitação para a utilização de ferramentas de IA nas salas de aula. Uma tecnologia educacional como o computador ou a internet, por meio do recurso de redes interativas, favorece novas formas de acesso à informação e à comunicação, e, consequentemente, ao aprendizado, além de ampliar as fontes de pesquisa em sala de aula, abrindo espaço para a entrada de novos mecanismos e ferramentas que facilitem as ligações necessárias a fim de atender ao novo processo cognitivo do século XXI (Bruzzi, 2016). Não se adequar a essa demanda pode trazer enormes atrasos e, principalmente, se distanciar da realidade da sociedade atual. Isso também pode levar à utilização errônea por parte dos estudantes, que passam a usar a ferramenta apenas para cópias de respostas sem aprendizado.
Os resultados apontam ainda que a familiarização com novas tecnologias exige a necessidade do desenvolvimento de competências e, para isso, a capacitação profissional é necessária, pois contraditoriamente, a maioria dos professores que sabem que seus alunos utilizam a IA (Figura 2) nunca trabalhou com essa ferramenta em sala de aula (Figura 3).

Figura 2: Conhecimento do professor sobre a utilização da IA pelo aluno

Figura 3: Utilização da IA na sala de aula como recurso pedagógico
A crescente utilização das mídias digitais no contexto educacional, tanto como estratégia quanto como recurso pedagógico, acompanha o avanço tecnológico e o crescente engajamento dos estudantes com esses recursos. Tal cenário oferece às instituições de ensino a oportunidade de atender às diferenças individuais e às múltiplas formas de aprendizagem, considerando as distintas necessidades, interesses e ritmos dos sujeitos que compõem o ambiente escolar (Bittencourt; Albino, 2017). Essa abordagem mostra-se particularmente relevante no contexto escolar, caracterizado por um público heterogêneo, com distintos níveis de socialização, interação e apropriação das tecnologias digitais.
A Figura 2 também destaca o papel da escola na inserção do aluno na era digital. Quase 20% dos professores (7) acreditam que seus alunos não utilizam da IA por não terem condições ou acesso para isso. É na escola que o estudante pode ter a oportunidade de vivenciar novas experiências e adentrar na realidade tecnológica. Se a escola não proporciona essa vivência, esse aluno poderá apresentar diversas defasagens em seu futuro profissional e social.
As mídias digitais, há algum tempo, vêm sendo incorporadas em diversos espaços sociais, como empresas, estabelecimentos comerciais, residências e terminais bancários, bem como em serviços de aquisição de ingressos para eventos culturais e de entretenimento, entre outros. Contudo, paradoxalmente, um dos ambientes onde o uso das tecnologias digitais ainda se apresenta de forma incipiente, especialmente no que se refere à atuação docente no processo de ensino e aprendizagem, é o espaço escolar (Bittencourt; Albino, 2017).
Uma escola, sendo agente formador, deve estabelecer estratégias e práticas pedagógicas a fim de se adequar à constante aceleração do conhecimento dos alunos, ainda mais que, do ponto de vista dos profissionais entrevistados, a maioria dos professores acredita que a IA pode auxiliar no processo de ensino-aprendizagem dos estudantes (86,1%) e que essa pode ser a realidade na maioria das escolas num futuro próximo.
Os dados obtidos neste levantamento revelam informações fundamentais sobre a percepção e a utilização da inteligência artificial (IA) por professores da Educação Básica. Um dos principais achados é o contraste entre o reconhecimento da relevância da IA e a escassa implementação dessa tecnologia no processo pedagógico. Embora 61,1% dos professores tenha tomado conhecimento sobre a IA nos últimos dois anos, uma quantidade considerável ainda não se apropria dela em suas práticas docentes. Esse fato sugere uma desconexão entre a familiarização com a tecnologia e sua aplicação pedagógica, sendo um indicativo claro de que o uso da IA nas escolas enfrenta obstáculos significativos relacionados à formação e à infraestrutura.
Outro aspecto relevante observado foi a lacuna no suporte institucional e na infraestrutura das escolas, como relatado por alguns professores que responderam ao formulário proposto, o que limita diretamente o uso da IA nas práticas pedagógicas. A maioria dos professores destacou a insuficiência de recursos, como acesso à internet de qualidade e dispositivos adequados, como um impeditivo para a adoção de tecnologias inovadoras. A ausência de políticas claras de incentivo e capacitação sobre o uso de tecnologias emergentes também foi identificada, refletindo uma necessidade de revisão das políticas educacionais para garantir que a IA seja uma realidade acessível a todos os educadores, especialmente nas redes públicas de ensino.
Por fim, observou-se forte desejo por parte dos professores de se capacitar e se atualizar sobre o uso da IA, o que demonstra que, apesar das dificuldades iniciais, há uma receptividade crescente em relação às novas ferramentas tecnológicas. Esse achado é corroborado por estudos que enfatizam a importância da formação contínua dos professores para a adaptação às demandas tecnológicas do ensino contemporâneo (Haviaras, 2020; Vosgerau et al., 2016). Assim, o interesse dos educadores em adquirir conhecimentos sobre a IA evidencia um potencial significativo para a ampliação do uso dessas tecnologias, desde que o suporte adequado seja oferecido pelas instituições educacionais.
Conclusões
A análise dos resultados revela a relevância deste estudo para o campo educacional, especialmente ao considerar o impacto da inteligência artificial na transformação das práticas pedagógicas. A pesquisa evidenciou que, apesar do crescente interesse dos professores em adotar a IA, a falta de capacitação e as limitações estruturais nas escolas públicas são barreiras substanciais para a plena implementação dessas tecnologias. Com base nos dados levantados, é possível concluir que os professores da Educação Básica têm buscado se inteirar sobre a utilização da IA como recurso pedagógico. Entretanto, esse parece ser ainda um desafio devido à falta de capacitação e disponibilização de recursos e infraestrutura adequados. Não obstante, alguns professores temem que o avanço tecnológico possa levar à exclusão de alguns grupos devido a essa falta de investimentos e suportes governamentais necessários.
Na questão discursiva disponibilizada pelo formulário aplicado, alguns entrevistados destacaram que, mesmo a Educação Infantil, parte essencial da formação, já caminha para o uso autônomo dos recursos, alguns desplugados, mas também lousa interativa, computadores, tablets, chatbots e funções da IA que trabalham com a construção de imagens. Essas observações destacam a importância e a necessidade urgente de investimento na educação tecnológica ainda na infância, pois, mesmo que muito pequenos, os estudantes já possuem enorme capacidade e curiosidade em aprender e, dentro das escolas, é que muitos terão oportunidades de contato e de formação para o mundo tecnológico.
Dessa maneira, esse estudo aponta que, embora as dificuldades iniciais para a implementação da IA nas escolas públicas sejam evidentes, o potencial de transformação dessa tecnologia no cenário educacional é imenso. A partir dos dados levantados, pode-se concluir que a superação das barreiras identificadas, como a falta de infraestrutura e capacitação, permitiria a integração efetiva da IA no currículo escolar, contribuindo para o desenvolvimento de competências digitais e para a modernização do ensino.
Finalmente, conclui-se que os professores da Educação Básica, apesar de interessados, ainda possuem pouco conhecimento sobre os usos da IA como recurso pedagógico, mas mostram interesse em se capacitar e alertam para a falta de recurso ou autorização das instituições de ensino. Este estudo sublinha a necessidade urgente de políticas públicas voltadas para a formação e o suporte técnico aos educadores, com o objetivo de superar as desigualdades existentes entre as escolas urbanas e rurais, bem como entre as diferentes redes de ensino. A implementação de programas de capacitação e a criação de condições adequadas para o uso de tecnologias emergentes são passos cruciais para garantir a inclusão digital na educação brasileira.
Mais estudos ainda se fazem necessários para ampliar o tamanho da amostra e possibilitar a conclusão dos dados desta pesquisa. Entretanto, o presente estudo traz informações importantes e apontam estimativas interessantes sobre o avanço das tecnologias digitais, em especial da IA dentro das escolas brasileiras. Espera-se, ainda, que os resultados aqui apontados possam embasar pesquisas e investimentos futuros para a melhoria da qualidade e do uso de tecnologias digitais no ensino do Brasil.
Referências
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Publicado em 09 de julho de 2025
Como citar este artigo (ABNT)
CARVALHO, Ana Paula Campos de. Compreensão dos professores da Educação Básica sobre as tecnologias de inteligência artificial para o ensino. Revista Educação Pública, Rio de Janeiro, v. 25, nº 25, 9 de julho de 2025. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/25/25/compreensao-dos-professores-da-educacao-basica-sobre-as-tecnologias-de-inteligencia-artificial-para-o-ensino
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