O impacto das aulas práticas e de eventos científicos na aprendizagem de Ciências no Ensino Fundamental, após a pandemia

Vinícius Amaral Corrêa

Professor I - Ciências na SME/RJ, mestre em Ecologia e Evolução (UERJ)

Gustavo Bernardo da Costa

Licenciando em Química (UFRJ)

Carla Maria Camilo de Brito

Licencianda em Ciências Biológicas (UERJ)

Ágatha Lorrayne A. Pacheco

Licencianda em Ciências Biológicas (UERJ)

Denise Borges dos Santos Dias

Bióloga (UERJ), doutora em Biologia Celular e Molecular (Fiocruz)

Helena Lucia Carneiro Santos

Tecnologista em Saúde Pública (Fiocruz), doutora em Ciências - Microbiologia (UFRJ)

Luana Cristina Farnesi

Formadora de Docentes na SME/RJ, doutora em Ciências - Parasitologia (Fiocruz)

A feira de ciências é um evento escolar clássico que possui a capacidade de mobilizar toda a comunidade escolar onde será realizada. Esse tipo de evento induz a curiosidade e promove não somente o interesse do corpo discente pelas Ciências, mas também de todos os envolvidos no evento, como a família dos alunos, os comerciantes locais e o corpo docente e diretivo da escola. Há quase dois séculos, o físico e químico Michael Faraday (1791-1867) reportava a importância de eventos científicos para a humanidade.

Para Faraday, divulgar Ciência nada tinha a ver com o rigor científico de um ambiente laboratorial, mas sim com estimular em jovens o pensamento crítico científico, a vontade de aprender Ciências pela prática. Faraday realizou, em 1825, na Royal Institution – organização de grande influência para a comunidade científica em Londres – uma palestra para o público infantil com experimentos de Eletroquímica (Peter, 1999).

No Brasil, há registros, na década de 1960, das primeiras feiras de ciências realizadas em cidades do Estado do Rio de Janeiro que foram apoiadas por institutos brasileiros de educação (O Fluminense, 1965). Recentemente, em dezembro de 2023, a Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro promoveu a primeira Feira Carioca de Ciências da rede, em que cerca de 40 escolas tiveram seus projetos selecionados e avaliados para serem mostrados, com premiações para os primeiros lugares. A feira movimentou mais de 1.000 escolas de Ensino Fundamental e seus respectivos alunos do 6° ao 9° ano. Para que uma feira de ciências aconteça em âmbito escolar ou regional, é preciso que aulas de Ciências não sejam apenas teóricas. Nesse sentido, é condição sine qua non pensar em aulas práticas, e elas necessitam de materiais e ambiente adequados para que possam ser realizadas.

Para a proposta de inserção de aulas práticas no ensino público municipal da cidade do Rio de Janeiro, é necessário ressaltar que ela é uma grande rede de ensino, a maior da América Latina, com 1.557 unidades escolares em locais de realidades socioeconômicas extremamente heterogêneas. Muitas escolas da rede foram construídas há décadas e ainda não dispõem de um espaço específico para aulas práticas de Ciências (laboratório escolar). Nesse caso, aulas práticas com uso de materiais e equipamentos simples, que possam ser aplicadas em qualquer tipo de sala de aula, são as mais indicadas. A inclusão de aulas práticas no ensino de Ciências possibilita a interação entre as habilidades elencadas do período letivo atual com as dos períodos letivos anteriores, pois, em uma atividade prática, é possível trabalhar diferentes objetos de conhecimento (Farnesi et al., 2024).

A pandemia da covid-19 impôs o estudo a distância, e essa imposição teve grande repercussão na aprendizagem dos estudantes, sobretudo do Ensino Fundamental (Brasil, 2020). O Ministério da Educação definiu critérios para a prevenção ao contágio da nova pandemia e, pela Portaria nº 343, de 17 de março de 2020, as aulas presenciais tiveram que ser substituídas pela modalidade de ensino remoto, com aulas online (Brasil, 2020). Nas escolas públicas, tal substituição teve marcas sociais, pois muitos alunos não dispunham de meios tecnológicos para assistir às aulas. Com a suspensão das aulas presenciais, alguns alunos conseguiram buscar alternativas e meios digitais; entretanto, vários perderam o vínculo com as escolas. Dentre os efeitos relevantes observados no pós-pandemia, as lacunas de aprendizagem e a defasagem dos estudantes são destacadas, e elas claramente necessitam ser minimizadas (Souza et al., 2024). As atividades práticas vêm com a proposta de auxiliar a aprendizagem ao integrar o experimental com a teoria, unindo esses dois campos. Os estudantes são estimulados de forma sensitiva (tátil e visual) a exercitar o pensamento crítico e reflexivo durante essas aulas. A experimentação investigativa é uma metodologia ativa em que o professor tem papel de mediador, instigando os questionamentos a partir dos resultados; sendo assim, o estudante é o ator principal no processo ensino-aprendizagem ao realizar atividades práticas de Ciências (Bacich; Morán, 2018; Azzalis et al., 2022; Farnesi et al., 2024).

Por outro lado, no contexto de feiras de ciências escolares, projetos com base científica podem ser abordados, com outras metodologias ativas sendo abordadas, como atividade baseada em problemas e atividade baseada em projetos (Dewey, 1976; Bacich; Morán, 2018). Com isso, os alunos conseguem pensar em caminhos diferentes para a tomada de decisões, buscando solucionar os problemas e questões levantadas. Mesmo cometendo erros no meio do processo da aprendizagem prática, o estudante reflete e exercita o pensamento crítico, podendo levar tais experiências para além dos limites da escola – para sua vida. A ideia de atividades práticas simples é mostrar que a ciência não é feita por sofisticados laboratórios nem pelos instrumentos de precisão, mas sim pelas boas perguntas e conclusões feitas sobre as observações da natureza.

Objetivos

Avaliar a percepção de alunos dos anos finais do Ensino Fundamental da rede pública municipal do Rio de Janeiro sobre a importância das aulas práticas e de uma feira de Ciências em sua aprendizagem. Esta proposta focou em compreender, no contexto pós-pandemia e sob a ótica dos alunos, como as aulas práticas e a feira de Ciências podem ser instrumentos facilitadores do processo de ensino-aprendizagem desse componente curricular tão potente no combate ao negacionismo.

Metodologia

A pesquisa aqui desenvolvida mostra análises dos dados obtidos da Feira de Ciências de 2023 de uma escola pública da Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro, quando foram apresentados os experimentos realizados entre os anos letivos de 2022 e 2023 nas aulas práticas de Ciências de turmas dos anos finais do Ensino Fundamental. Essas atividades fazem parte do projeto intitulado Apoio à Melhoria das Escolas da Rede pública sediada no Estado do Rio de Janeiro – 2021, contemplado pelo edital Faperj nº 45/21.

Os experimentos realizados nas aulas práticas foram idealizados para facilitar os desafios enfrentados pelos docentes em relação a espaço e recursos limitados. Dessa forma, as práticas foram realizadas com materiais simples (sobras da cozinha da escola, como pães, frutas etc.) e com mais de uma opção de material a ser utilizado (exemplo: béqueres ou copos de vidro, balões ou garrafas PET etc.). Todas as práticas foram testadas previamente, reproduzidas e correlacionadas às devidas competências e habilidades previstas na Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e no Currículo Carioca (Brasil, 2018; Farnesi et al., 2024). As aulas práticas foram desenvolvidas com cinco turmas dos anos finais do Ensino Fundamental (três do 8° ano e duas do 9° ano), com 70 e 55 alunos do 8° ano e do 9° ano, respectivamente, num total de 125 alunos envolvidos na pesquisa.

Com o intuito de realização de uma grande feira de ciências, alguns experimentos realizados nas aulas práticas foram selecionados pelos próprios alunos e, em alguns casos, sugeridos pelos professores para serem apresentados na feira. Foi combinado previamente que os alunos formariam equipes, estudariam os conceitos envolvidos nas práticas e confeccionariam cartazes que seriam exibidos em suas estações de exposição. Os alunos apresentariam seus experimentos para toda a comunidade escolar e representantes da comunidade acadêmica que foram convidados previamente pelos professores para participar do evento (alunos da Educação infantil e dos anos anteriores do Fundamental I, a equipe da gestão escolar, graduandos em Ciências Biológicas e em Química, professores universitários e pesquisadores de instituições parceiras (Fiocruz e UERJ).

A gestão escolar apoiou o evento fornecendo parte dos materiais usados na feira de ciências; parte da estrutura para realização da feira contou com materiais adquiridos através do projeto Apoio à Melhoria das Escolas da Rede Pública Sediadas no Estado do Rio de Janeiro, da Faperj, o que ajudou tanto no desenvolvimento das aulas práticas quanto na feira de ciências.

Na aula seguinte ao evento, os alunos responderam em anonimato um questionário que tinha o objetivo de avaliar os impactos de todo o processo de ensino-aprendizagem proposto. As perguntas foram pensadas de modo que abarcassem as competências descritas na Base Nacional Comum Curricular (BNCC) para Ciências da Natureza: Conhecimento, Pensamento Científico, Crítico e Criativo, Empatia e Cooperação. O questionário foi dividido em quatro blocos, com perguntas objetivas, em que cada bloco abordava uma competência. Após todos os alunos envolvidos na feira terem respondido o questionário, os dados foram compilados por ano (8° e 9° anos) e gráficos mostrando os percentuais foram gerados e analisados de maneira comparativa, bloco a bloco, entre os anos. Com base nessa análise, as discussões foram estabelecidas. A seguir estão as questões respondidas pelos alunos.

Bloco 1 (Conhecimento)

  1. Sua participação na Feira de Ciências 2023 ajudou no entendimento dos assuntos da disciplina Ciências abordados ao longo do ano letivo de 2023?
  2. Em relação à preparação da apresentação na Feira de Ciências, você estudou os conteúdos de que forma?

Bloco 2 (Comunicação)

  1. Você sente que, com a oportunidade de apresentar seu trabalho na Feira de Ciências, você...
  2. Em relação à sua apresentação, como você se achou?

Bloco 3 (Pensamento científico)

  1. Sobre o experimento realizado na Feira de Ciências, você acredita que conseguiu comprovar algo que havia aprendido na teoria?
  2. Anteriormente às aulas práticas preparadas para serem apresentadas na Feira de Ciências, você teve algum contato com práticas de Ciências (Química, Física e Biologia) na escola?

Bloco 4 (Empatia)

  1. Todos do seu grupo de apresentação na Feira de Ciências participaram de forma produtiva?
  2. De maneira geral, em relação à Feira de Ciências, o que você percebeu entre colegas, professores e monitores?

Resultados

Foi realizada a análise comparativa dos dados obtidos junto aos alunos dos dois últimos anos do Ensino Fundamental. Durante a análise dos questionários, observou-se que, no bloco 1, relacionado à habilidade Conhecimento, as respostas das turmas de 9° e 8° anos mostram resultados semelhantes. A maioria dos estudantes respondeu positivamente, que a Feira de Ciências ajudou no processo de aprendizagem. No 9° ano, 82% dos alunos responderam que a feira “Ajudou”, 14% “Ajudou muito” e apenas 4% “Ajudou pouco” no entendimento dos assuntos de Ciências. Em contrapartida, no 8° ano, 53% dos alunos indicaram que “Ajudou”, enquanto 34% relataram que “Ajudou muito”, 9% consideraram que “Ajudou pouco” e 4% votaram que “Não ajudou” (gráficos A e B da Figura 1).

Na segunda questão abordada no bloco 1, evidenciada nos gráficos C e D da Figura 1, analisou-se a preparação dos alunos para a apresentação, considerando a fonte do conteúdo utilizada. Entre os alunos do 9° ano, 58% relataram que utilizaram “Aula, apostila, livro e internet”, 29% usaram “Aula, livro e apostila” e 13% usaram apenas “Aula e apostila”. No 8° ano, observa-se uma dinâmica diferente: a opção mais votada, com 53%, foi “Aula e apostila”; em seguida, com 33%, “Aula, apostila, livro e internet”, 11% “Aula, apostila e livro” e, por último, 3% dos estudantes afirmaram que “Não estudou além das aulas”. Esse resultado mostra que um evento como a feira de ciências pode estimular os estudos para além dos materiais didáticos disponíveis na escola.

O bloco 2 visou investigar a habilidade de comunicação e a influência da feira na comunicação dos estudantes. Ambas as séries obtiveram resultados semelhantes (gráficos A e B da Figura 2). Nas turmas de 9° ano, 55% dos alunos “Perdeu um pouco o medo de falar em público”, 25% “Não mudou”, 13% acreditam que “Perdeu o medo de falar em público” e 7% “Teve mais medo”. Por outro lado, no 8° ano 53% relataram que “Perdeu um pouco do medo de falar em público”, 20% “Perdeu o medo de falar em público”, 17% relataram que “Não mudou” e 10% responderam que “Tive mais medo”. Percebe-se que, segundo a percepção dos próprios alunos, boa parte acredita que a feira auxiliou na habilidade de comunicação, mas, como esperado, alguns adolescentes de ambos os anos (cerca de 10%) relataram que apresentação em público gerou mais medo.

A segunda questão avaliada foi a qualidade da apresentação por meio da percepção individual, mostrada nos gráficos C e D da Figura 2; novamente as turmas obtiveram resultados semelhantes. No 9° ano, 69% dos alunos definiram sua apresentação como “Bom (Boa)”, 29% “Ótimo(a)” e 2% “Ruim”. Nas turmas de 8° ano, 57% disseram que percebem sua apresentação como “Bom (Boa)”, 39% “Ótimo(a)”, 3% “Ruim” e 1% “Péssimo”.

Ambas as turmas obtiveram resultados semelhantes quanto à capacidade crítica em relação à compreensão da teoria aprendida em sala (gráficos A e B da Figura 3). As turmas de 9° ano mostraram panorama positivo: 51% dos alunos reportaram “Com certeza comprovei”; 38% dos alunos responderam “Acho que comprovei”; 9% “Não tenho certeza”; e 2% “Não comprovei”. Nas turmas de 8° ano, 53% responderam “Com certeza comprovei”, 39% “Acho que comprovei”, 6% “Não tenho certeza” e 2% “Não comprovei”. Em relação à segunda questão, busca-se verificar se o aluno teve contato com aulas práticas antes daquele momento de contato com atividades práticas de Ciências. A maioria dos alunos do 9° ano respondeu “Nunca tive contato” (62%), 16% “Tive algum contato”, 11% para  “Tive muito contato” e “Tive duas vezes ou menos” cada uma. No que se refere ao 8° ano, 41% dos alunos declararam “Nunca tive contato”, 29% “Tive algum contato”, 23% “Tive muito contato” e 7% “Tive duas vezes ou menos" (gráficos C e D da Figura 3).

No bloco 4, associado à empatia, foram exploradas as relações interpessoais geradas durante o processo da Feira de Ciências. Os gráficos A e B da Figura 4 mostram que houve bom trabalho em equipe executado pelos alunos. Em relação ao 9° ano, notou-se que tivemos uma ampla adesão de todos os alunos nos processos de construção das apresentações, a cooperação foi destacada, como observado em: 49% "Sim, todos", 42% "Sim, quase todos" e 9% "Alguns". Com os alunos do 8° ano, detectou-se uma pequena dificuldade quanto ao trabalho em equipe, dado que a porcentagem de "Alguns" e "Apenas alguns" encontra-se mais elevada em relação à outra série: 47% votaram "Sim, todos", 27% acreditam que "Sim, quase todos", 20% "Alguns" e 6% "Apenas alguns". Com respeito à segunda questão, nas respostas representadas nos gráficos C e D, foram avaliadas no geral as relações com todos os envolvidos na preparação da Feira de Ciências na perspectiva do aluno. As turmas de 9° ano julgaram ter recebido amplo apoio, 82% relataram "Recebi total apoio e cooperação" e 18% "Recebi apoio e cooperação parciais". Nas turmas de 8° ano, os estudantes responderam de maneira semelhante: 65% responderam "Recebi total apoio e cooperação", 59% "Recebi apoio e cooperação parciais" e apenas 6% relataram receber pouco apoio.

Discussão

Durante a pandemia, adotou-se o ensino remoto para que os alunos não perdessem as aulas. Todavia, essa modalidade de ensino mostrou-se um fator relevante de exclusão da aprendizagem pela falta de recursos tecnológicos para acompanhar as aulas em função das diferenças socioeconômicas. Consequentemente, houve aumento na defasagem de aprendizagem, que foi percebido nos anos letivos seguintes, quando os alunos voltaram às aulas presenciais (Souza et al., 2024). Tais defasagens também foram perceptíveis em Ciências nos anos finais do Ensino Fundamental, foco deste trabalho.

A educação vem sendo repensada no contexto de uma prática dialógica, colaborativa, mais envolvente e motivadora, contrapondo-se às práticas tradicionais da “educação bancária”. Está obsoleta a relação vertical de comunicação, em que o professor tem papel de emissor, o aluno de receptor, o código é o conteúdo do livro e o canal de comunicação é representado pela escola. Essa metodologia não contempla a diversidade de formas atuais de aprendizagem (Costa; Batista, 2017; Freire, 1974). Uma educação reflexiva, problematizadora, que projeta o educando como ator da construção do seu próprio conhecimento, se faz cada vez mais necessária (Libâneo, 2012). A implementação da educação dialógica e problematizadora no contexto da escola pública, com aprendizagem pelo uso de metodologias ativas, pode subsidiar a compreensão dos alunos sobre conceitos complexos de serem apreendidos, como é o caso do componente curricular Ciências nos anos finais do Ensino Fundamental (Bueno et al., 2017; Bacich; Morán, 2018). A inserção de metodologias ativas, como a experimentação investigativa, pode colaborar para sanar ou minimizar defasagens de aprendizagem oriundas dos anos da pandemia para o componente curricular Ciências.

Não há como negar que existe uma associação entre o desenvolvimento do conhecimento científico e a experimentação. Nesse sentido, a investigação auxilia na concretização do conhecimento acerca das Ciências da Natureza, em que o científico aflora nos sujeitos (Giordan, 1999). Entretanto, a realização de aulas práticas no Ensino Fundamental ainda é um grande desafio, muito por causa de questões estruturais gerais das escolas, tanto públicas quanto particulares. Por isso, ao pensar em aulas práticas de Ciências, foi preciso pensar e desenvolver práticas simples e possíveis de serem realizadas em sala de aula (Azzalis et al., 2022; Farnesi et al., 2024).

O presente estudo conseguiu evidenciar, pela perspectiva do aluno, a importância tanto das aulas práticas quanto da feira de ciências para a aprendizagem dos objetos de conhecimento elencados para o componente curricular Ciências no Ensino Fundamental (Brasil, 2018). Além disso, evidenciou mudanças positivas na aprendizagem e em questões socioemocionais relatadas pelos próprios estudantes. As pouquíssimas opiniões negativas sobre a feira de ciências serão discutidas aqui, podendo relacioná-las a outros contextos que não sejam diretos. De acordo com a Teoria Histórico-Cultural de Vygotsky, que vê o ser humano para além de sua estrutura biológica, entendendo que seu processo de humanização resulta da relação histórico-cultural (Vygotsky, 1991), com diversos aspectos do desenvolvimento associados ao processo de aprendizagem escolar. São destacados três tipos de relações interpessoais cruciais para o aprendizado: as interações no ambiente familiar, as relações entre estudantes e professores e as relações entre os próprios estudantes. A dinâmica desarmoniosa dessas interações pode impactar negativamente no desempenho escolar em razão dos distúrbios emocionais gerados, resultando em uma autoavaliação pessimista (Souza et al., 2020). Percebemos percentuais baixos de autoavaliação pessimista nos alunos dos anos finais do Ensino Fundamental avaliados nesta pesquisa. A realidade dos territórios onde as escolas municipais do Rio de Janeiro se encontram e os cenários de crescente bullying e cyberbullying nas escolas colaboram para que os alunos tenham péssimas visões de si mesmos. Aqui evidenciamos que a feira de ciências se mostrou importante para maioria dos estudantes quanto à avaliação de si mesmos. Além disso, notamos que o trabalho em equipe no âmbito das aulas práticas e das apresentações feitas na Feira de Ciências da escola colaborou para minimizar as questões de bullying e cyberbullying, ajudando, em alguma esfera, a combater esse tipo de violência sistemática que acontece no dia a dia da escola (Weisz, 2021).

A dimensão emocional é crucial para o desenvolvimento infantil e está intrinsecamente ligada às suas aprendizagens (Vygotsky, 1991; Souza et al., 2020). Ter um sistema cerebral operacional em relação às emoções sociais é fundamental para o desenvolvimento integral das crianças, incluindo competências socioemocionais, processos de aprendizagem essenciais para o sucesso escolar e o futuro, visto que existe a busca por suprir as expectativas dos pais. Quando uma criança ou adolescente esbarra em crises emocionais, alguns processos da aprendizagem podem ser prejudicados e seus desafios pessoais podem tomar proporções maiores. Como a maioria dos alunos sinalizou positivamente nos questionários, foi perceptível sua autoestima e sua confiança nas apresentações, até mesmo para os visitantes convidados (professores doutores de instituições respeitadas de pesquisa). Vale ressaltar que essas interações são importantes no desenvolvimento intelectual dos alunos, pois as trocas de experiência com pessoas distintas, sejam mais velhas ou da mesma faixa etária, provocam reflexão, modificando o conteúdo do pensamento e elevando habilidades ainda não completamente desenvolvidas dos estudantes (Souza et. al., 2020).

Considerações finais

É gratificante para os autores e participantes da proposta das aulas práticas realizadas e da culminância na realização da Feira de Ciências conseguir sistematizar em dados os avanços e perceber no dia a dia a evolução e as inúmeras mudanças positivas dos alunos. Isso representa uma mudança significativa no fazer pedagógico do componente curricular Ciências. De maneira geral, a melhora na comunicação e na autoestima dos alunos foi percebida por diversos professores e pela equipe gestora da escola. Para além disso, os professores destacaram mudanças positivas na forma como os alunos buscavam conhecimento, tiravam suas dúvidas, checavam fontes de pesquisa e faziam seus experimentos, focados em realizar boas apresentações na feira de ciências.

Referências

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Publicado em 27 de agosto de 2025

Como citar este artigo (ABNT)

CORRÊA, Vinícius Amaral; COSTA, Gustavo Bernardo da; BRITO, Carla Maria Camilo de; PACHECO, Ágatha lorrayne A.; DIAS, Denise Borges dos Santos; SANTOS, Helena Lucia Carneiro; FARNESI, Luana Cristina. O impacto das aulas práticas e de eventos científicos na aprendizagem de Ciências no Ensino Fundamental, após a pandemia. Revista Educação Pública, Rio de Janeiro, v. 25, nº 32, 27 de agosto de 2025. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/25/32/o-impacto-das-aulas-praticas-e-de-eventos-cientificos-na-aprendizagem-de-ciencias-no-ensino-fundamental-apos-a-pandemia

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