A relevância da abordagem crítico-superadora na adesão de alunos do 5° ano às aulas de Educação Física: um relato de experiência

Lucas Fonseca Saraiva

Mestrando em Educação Física (Proef/UESPI), licenciado em Educação Física (UFPI)

Ao longo de sua história, a Educação Física escolar passou por diferentes moldes e abordagens pedagógicas. Essa diversidade de métodos reflete diferentes concepções sobre a prática da Educação Física e sobre os objetivos da disciplina no contexto escolar. No entanto, muitas vezes essas abordagens não consideravam as especificidades dos alunos, resultando em aulas pouco atrativas e com baixo engajamento dos estudantes.

Durante muito tempo, a Educação Física foi vista apenas como uma disciplina voltada para o desenvolvimento físico e motor dos alunos, sem levar em consideração aspectos sociais, emocionais e cognitivos. Essa visão limitada contribuiu para a desvalorização da disciplina e para a falta de interesse dos estudantes nas aulas de Educação Física.

Diante desse cenário, surge a necessidade de explorar novas abordagens pedagógicas que possam tornar as aulas de Educação Física mais significativas e motivadoras para os alunos. Uma dessas abordagens é a crítico-superadora, que se propõe a promover uma Educação Física mais inclusiva, participativa e significativa, levando em consideração as necessidades e os interesses dos estudantes (Darido; Rangel, 2008).

A abordagem crítico-superadora busca romper com os moldes da Educação Física tradicional, substituindo os métodos tecnicistas por uma prática pedagógica mais ampla e abrangente. Ela considera não apenas o desenvolvimento das habilidades motoras, mas também aspectos socioemocionais dos alunos, seus interesses, sua capacidade de socialização e seu contexto social. Além disso, essa abordagem estimula a criticidade dos alunos, incentivando-os a refletir sobre sua prática e seu papel na sociedade (Coletivo de Autores, 1992, p. 92).

Desenvolvimento

A pesquisa foi realizada em uma escola da rede municipal de Fortaleza/CE; a turma escolhida foi de 5° ano do Ensino Fundamental do turno da manhã, tendo público-alvo de crianças de 9 e 10 anos de idade. A pesquisa teve como intuito analisar quais alunos estavam participando das aulas, quais alunos não gostavam da disciplina de Educação Física e como a formação do professor poderia contribuir para que os alunos que não participavam da aula passassem a ter maior adesão e interesse pelas temáticas e participação nas aulas de Educação Física.

O professor autor foi o responsável pelo processo de pesquisa, buscando por meio de escuta ativa, de análise observacional e inserindo diálogos problematizadores investigar os motivos pelos quais alguns alunos não participavam das aulas de Educação Física. Durante as observações e escutas, foram analisados comportamentos, interações sociais, manifestações de interesse e desinteresse dos alunos em relação às atividades propostas.

Essa abordagem permitiu uma compreensão mais ampla dos fatores que influenciavam a participação dos alunos, possibilitando identificar possíveis estratégias para promover maior adesão e engajamento nas aulas de Educação Física. Para justificar a ausência às aulas, os alunos relataram ao professor autor seus contextos: “Professor, não gosto de futebol”; “Professor, eu nunca fiz Educação Física, não sei jogar nada”; “Professor, eu tenho dificuldade para praticar esportes”; “Professor, eu não tenho tênis para as aulas de futsal”.

Análise

Após analisar os relatos dos alunos do 5º ano, constatou-se que muitos deles apresentam repulsa às aulas de Educação Física por associarem essa disciplina unicamente às práticas esportivas. Eles se fecham para novas possibilidades de cultura corporal e de movimento, limitando a compreensão da Educação Física a um conjunto restrito de atividades. Além disso, eles alegam falta de técnica para realização das atividades, demonstrando uma insegurança corporal que os impede de se envolver plenamente nas atividades propostas. Esse comportamento também está relacionado ao medo de errar e ser criticado, bem como ao receio à reação dos colegas de classe, evidenciando a importância de criar um ambiente acolhedor e livre de julgamentos nas aulas de Educação Física.

Ação realizada

No início da aula, foi realizada uma roda de conversa pelo professor autor com o intuito de obter um leque maior de informações dos seus alunos; durante essa atividade, os alunos foram convidados a registrar em seus cadernos tudo o que já tinham aprendido na disciplina de Educação Física. Além disso, foram questionados sobre o que mais gostavam nas aulas dessa disciplina e quais eram os motivos pelos quais não participavam ou não gostavam das aulas de Educação Física.

Após as anotações serem concluídas, foi organizado um momento de socialização, no qual os alunos puderam compartilhar coletivamente suas percepções, seus medos e entusiasmos em relação à Educação Física escolar. Por fim, o professor autor/pesquisador solicitou aos alunos que sugerissem possíveis atividades para as próximas aulas de Educação Física, visando à participação do maior número possível de alunos da turma. Além disso, incentivou-os a criar uma rede de apoio entre si, com o objetivo de incluir os colegas menos interessados nas aulas, tornando-os parte do processo de escolha das atividades.

Análise dos resultados

Com base nos princípios da abordagem crítico-superadora, o professor pesquisador observou significativa mudança no interesse dos alunos pela Educação Física escolar. À medida que se sentiam mais participativos nas aulas, o interesse dos alunos também aumentava. Eles passaram a compreender de forma mais ampla o campo educacional e pedagógico da Educação Física, assim como as diversas possibilidades de movimento corporal.

Ao se envolverem ativamente nas atividades propostas e perceberem que suas opiniões e sugestões eram levadas em consideração, os alunos passaram a se sentir mais motivados e engajados nas aulas. Isso criou um ambiente mais colaborativo e participativo, contribuindo para uma experiência educacional mais significativa e estimulante para todos os envolvidos.

Portanto, a abordagem crítico-superadora se mostrou eficaz não apenas para despertar o interesse dos alunos pela Educação Física, mas também para promover maior participação e engajamento nas aulas. Essa maior participação não apenas melhora a experiência dos alunos na disciplina como também contribui significativamente para o desenvolvimento integral dos estudantes, abrangendo não só aspectos físicos, mas também sociais, emocionais e cognitivos.

Contudo, é importante destacar que os resultados apresentados se referem a uma experiência situada e limitada ao contexto específico de uma turma de 5° ano; portanto, é necessário que os próximos estudos ampliem o número de turmas observadas, com o objetivo de identificar padrões mais robustos, contrastar diferentes realidades escolares e aprofundar a análise dos efeitos dessa abordagem no ensino de Educação Física.

Considerações finais

Este estudo evidencia a importância de uma abordagem pedagógica que considere as necessidades e os interesses dos alunos, como é o caso da abordagem crítico-superadora. Ao adotar essa perspectiva, os professores podem promover a participação e o engajamento dos alunos nas aulas de Educação Física, tornando-as mais significativas e motivadoras.

Por meio de estratégias que valorizam a participação ativa dos alunos, como a realização de rodas de conversa, a escuta ativa e o incentivo à autoria dos estudantes, é possível transformar as aulas de Educação Física em espaços de aprendizagem mais democráticos e inclusivos.

Os alunos, ao se sentirem importantes no processo de construção do seu aprendizado, demonstram que os métodos utilizados pelo professor foram eficazes para promover uma maior participação nas aulas de Educação Física. Isso contribui para que a disciplina seja menos rejeitada e julgada previamente, permitindo que os alunos vivenciem de forma mais ampla a Educação Física escolar.

Pode-se concluir também que professores com formação mais atualizada estão mais bem preparados para buscar soluções que melhorem suas aulas, aumentando a adesão e o interesse dos alunos. Ao adotar abordagens pedagógicas inovadoras, como a crítico-superadora, esses professores conseguem criar ambientes de aprendizagem mais inclusivos e participativos.

Mediante a formação continuada e a busca constante por novos conhecimentos e práticas pedagógicas, os professores podem contribuir de forma efetiva para o desenvolvimento integral de seus alunos. Ao adotar abordagens inovadoras, como a abordagem crítico-superadora, os professores têm a oportunidade não apenas de promover o desenvolvimento de habilidades motoras, mas também de trabalhar aspectos socioemocionais e cognitivos de cada indivíduo.

Dessa forma, as aulas de Educação Física se tornam um espaço privilegiado para o crescimento e a aprendizagem dos alunos, permitindo que eles se desenvolvam de forma mais completa e harmoniosa. Por esse processo, os alunos adquirem habilidades físicas e aprendem a lidar com suas emoções, a trabalhar em equipe e a desenvolver o pensamento crítico, tornando-se assim cidadãos mais preparados para os desafios da vida.

Referências

COLETIVO DE AUTORES. Metodologia do ensino de Educação Física. São Paulo: Cortez, 1992.

HARRIS, Elizabeth Rose Assumpção; TELLES, Silvio de Cassio Costa; FERREIRA, Marcos Santos. Abordagem crítico-superadora e a produção de conhecimento: reflexões sobre saúde e esporte na escola. Revista Mineira de Educação Física, v. 23, nº 2, p. 129-159, 2015.

HERMIDA, Jorge Fernando; MATA, Áurea Augusta Rodrigues; NASCIMENTO, Maria do Socorro. A Educação Física crítico-superadora no contexto das pedagogias críticas no Brasil. In: V COLÓQUIO DE EPISTEMOLOGIA DA EDUCAÇÃO FÍSICA. Anais... Maceió, v. 22, 2010.

IORA, Jacob Alfredo. Propostas pedagógicas para a Educação Física: a abordagem crítico-superadora e crítico-emancipatória 20 anos após suas sistematizações. Dissertação (Mestrado) - Universidade Federal de Pelotas, Pelotas, 2012.

RANGEL, Irene Conceição Andrade et al. Educação Física Escolar e multiculturalismo: possibilidades pedagógicas. Motriz, Rio Claro, v. 14, nº 2, p. 156-167, abr./jun. 2008.

Publicado em 03 de setembro de 2025

Como citar este artigo (ABNT)

SARAIVA, Lucas Fonseca. A relevância da abordagem crítico-superadora na adesão de alunos do 5° ano ás aulas de Educação Física: um relato de experiência. Revista Educação Pública, Rio de Janeiro, v. 25, nº 33, 3 de setembro de 2025. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/25/33/a-relevancia-da-abordagem-critico-superadora-na-adesao-de-alunos-do-5-ano-as-aulas-de-educacao-fisica-um-relato-de-experiencia

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