Práticas avaliativas com animações infantis: relato de experiência no Ensino Fundamental
Janssen Marques de Vasconcelos
Professor do Colégio Franco, mestrando em Ensino de Ciências da Natureza (PPECN/UFF)
Jorge Cardoso Messeder
Doutor em Química, docente do Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências da Natureza (PPECN/UFF)
A avaliação educacional é um componente fundamental do processo de ensino-aprendizagem, desempenhando papel crucial na orientação do desenvolvimento acadêmico dos estudantes (Luckesi, 2022). Dentre as diversas abordagens avaliativas, a contextualização é uma estratégia que visa tornar o processo de avaliação mais significativo e engajador para os alunos, conectando os conteúdos acadêmicos com elementos do cotidiano e interesses pessoais dos estudantes (Andrade Leite; Radetzke, 2017).
No contexto específico dos anos finais do Ensino Fundamental, mais precisamente com turmas do 7º ano, a utilização de animações infantis como recurso para contextualização das práticas avaliativas se apresenta como uma estratégia promissora. As animações não apenas captam a atenção dos alunos, mas também proporcionam um terreno fértil para explorar conceitos complexos de forma acessível e envolvente (Elias et al., 2020).
Este relato de experiência busca descrever e analisar a implementação de práticas avaliativas contextualizadas com animações infantis em uma turma do 7º ano do Ensino Fundamental, e o mesmo faz parte da pesquisa que será utilizada para a construção de uma dissertação de mestrado profissional no Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências da Natureza na Universidade Federal Fluminense (PPECN/UFF). Serão abordados os objetivos da atividade, a metodologia empregada, os resultados observados e as reflexões sobre o impacto dessa abordagem no engajamento dos alunos e na qualidade da aprendizagem.
A escolha por esse tema se justifica pela necessidade de explorar novas estratégias avaliativas que possam não apenas modificar o aprendizado dos estudantes, mas também estimular o interesse e a participação ativa no processo educacional (Brasil; Kalhil; Costa, 2022). Além disso, o uso de animações infantis como elemento contextualizador representa uma tentativa de aproximar os conteúdos curriculares da realidade vivencial dos alunos, facilitando a compreensão e a aplicação dos conhecimentos adquiridos (Machado; Silveira, 2020).
Ao compartilhar essa experiência, espera-se contribuir para o debate sobre práticas avaliativas inovadoras no Ensino Fundamental, inspirando outros educadores a explorar novas formas de engajar os estudantes e promover um ambiente de aprendizagem mais dinâmico e estimulante.
Referencial teórico
O estudo da avaliação educacional é de suma importância para a compreensão e o aprimoramento dos processos pedagógicos, e Cipriano Luckesi se destaca como uma referência fundamental neste campo. Segundo Luckesi (2002), a avaliação vai além de um simples mecanismo de aferição de desempenho, desempenhando um papel crucial na condução e na melhoria do processo educativo.
Para Luckesi, a avaliação deve ser entendida como um processo contínuo e integral ao ensino, em vez de ser apenas uma etapa final de verificação. Ele defende que a avaliação deve proporcionar um feedback construtivo que permita ajustes tanto na prática docente quanto no aprendizado dos alunos. Esse feedback é essencial para identificar e compreender as dificuldades e as potencialidades dos alunos, permitindo uma intervenção pedagógica mais eficaz e direcionada. O estudo da avaliação, portanto, é crucial para a construção de uma prática pedagógica eficaz e justa.
As contribuições de Cipriano Luckesi oferecem uma perspectiva valiosa sobre como a avaliação pode e deve ser utilizada para apoiar o desenvolvimento contínuo dos alunos, garantindo uma educação que não apenas mede, mas também potencializa o aprendizado (Luckesi, 2014). Com base na abordagem de Luckesi, é possível perceber que a avaliação é um componente essencial para promover uma educação de qualidade, capaz de preparar os alunos para os desafios e as demandas da sociedade contemporânea (Luckesi, 2002).
A Teoria da Aprendizagem Significativa, desenvolvida por David Ausubel, é central para compreender como os alunos assimilam e internalizam novos conhecimentos em relação aos seus conhecimentos prévios. Segundo Ausubel, a aprendizagem significativa ocorre quando os novos conceitos são integrados de maneira não arbitrária e substancial na estrutura cognitiva do aprendiz. Isso significa que a nova informação precisa ser relacionada de forma coerente e lógica aos conceitos já existentes na mente do estudante, chamados de subsunçores (Ausubel, 2003).
Os subsunçores podem ser de dois tipos: supraordinados, que são conceitos mais gerais e abrangentes, e subordinados, que são conceitos mais específicos e detalhados. A aprendizagem significativa difere da aprendizagem roteirizada, na qual os alunos simplesmente memorizam informações sem integrá-las com o conhecimento prévio. Ausubel enfatiza a importância de apresentar o material de aprendizagem de forma clara e organizada, utilizando organizadores prévios como mapas conceituais ou esquemas para facilitar a ancoragem das novas informações aos subsunçores existentes.
Na prática educacional, a teoria de Ausubel sugere que os educadores devem contextualizar os conteúdos de maneira relevante para os alunos, utilizando exemplos e aplicações práticas que conectem os conceitos teóricos com as experiências pessoais dos estudantes. Isso não apenas torna o aprendizado mais significativo, mas também promove a reflexão crítica e a aplicação dos conhecimentos em situações reais. Métodos de ensino que favorecem a construção ativa do conhecimento, como o aprendizado baseado em problemas e projetos de pesquisa, são consistentes com os princípios da aprendizagem significativa, pois incentivam os alunos a explorar e a integrar novos conceitos de forma profunda e duradoura (Moreira, 2011).
Além disso, a teoria de Ausubel enfatiza o desenvolvimento de habilidades cognitivas complexas, como o pensamento crítico e a resolução de problemas, que são essenciais para o sucesso acadêmico e profissional dos alunos no século XXI. Ao aplicar os princípios da aprendizagem significativa, os educadores podem criar ambientes de aprendizagem estimulantes, onde os alunos se engajam ativamente na construção do conhecimento e desenvolvem uma compreensão robusta dos conteúdos ensinados. Assim, a teoria de Ausubel continua a ser uma referência importante para a prática educacional contemporânea, inspirando métodos de ensino que visam não apenas transmitir informações, mas também promover uma aprendizagem autônoma e significativa ao longo da vida dos estudantes.
Caracterização do público e da escola
Os participantes deste relato de experiência são alunos do 7º ano do Ensino Fundamental, com idades entre 11 e 12 anos, matriculados no Colégio Franco, localizado na Rua das Laranjeiras, Rio de Janeiro. O Colégio Franco, que autorizou a pesquisa por meio da assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE), é reconhecido por sua tradição educacional e está estruturado com três avaliações por trimestre (AV1, AV2 e AV3), que compõem o sistema de avaliação contínua dos alunos.
Os estudantes da escola apresentam perfil diversificado, oriundos de diferentes contextos sociais e culturais, mas compartilham um ambiente escolar que promove o rigor acadêmico aliado a uma abordagem pedagógica inclusiva. O público-alvo deste relato de experiência é formado por alunos que se encontram em um período crucial de transição no processo educacional, em que o desenvolvimento cognitivo e socioemocional é fundamental para o seu crescimento acadêmico e pessoal.
As práticas avaliativas descritas foram cuidadosamente planejadas e adaptadas às especificidades das avaliações trimestrais da escola, visando não apenas mensurar o aprendizado dos alunos, mas também de engajá-los e motivá-los, por meio da utilização de animações infantis como recurso contextualizador. Esse enfoque inovador busca não só atender às exigências curriculares, como também estimular uma aprendizagem significativa e duradoura, alinhada aos interesses e à cultura de aprendizagem dos estudantes do 7º ano do Colégio Franco.
Metodologia
Este estudo adotou uma abordagem qualitativa (Maia, 2020) para investigar a aplicação de práticas avaliativas contextualizadas com animações infantis em cinco turmas do 7º ano (71, 72, 73, 74 e 75) do Colégio Franco, durante o 1º trimestre de 2024. Os participantes totalizavam aproximadamente 150 estudantes matriculados regularmente no 7º ano do Ensino Fundamental durante o período da pesquisa.
Para iniciar, foram selecionadas animações infantis que se mostraram adequadas aos conteúdos curriculares de Ciências abordados no 7º ano. As animações selecionadas foram: O Rei Leão e Procurando Nemo, para o tema de Ecologia básica; O Lorax: em busca da trúfula perdida, para o tema de composição da atmosfera; e Wall-E, para o tema de equilíbrio termodinâmico e efeito estufa. Essas animações foram cuidadosamente adaptadas para servirem de base na elaboração de questões de avaliação que explorassem os conceitos teóricos aprendidos em sala de aula.
As questões de avaliação foram desenvolvidas de forma a se alinharem com as avaliações trimestrais (AV1, AV2 e AV3). Para a Avaliação 1 (AV1), os alunos assistiram ao filme Wall-E (Pixar Animation Studios, 2008) na escola e, em seguida, utilizando um roteiro com perguntas norteadoras (Apêndice 1), foram orientados a construir uma reflexão crítica e uma reportagem informativa sobre os problemas ambientais apresentados no filme. Esta atividade visou integrar os conceitos abordados em sala de aula sobre equilíbrio termodinâmico e efeito estufa com a narrativa e os temas ambientais do filme.
A Avaliação 2 (AV2) foi elaborada com base nos filmes O Rei Leão (Walt Disney Pictures, 1994) e Procurando Nemo (Pixar Animation Studios, 2003) (Apêndice 2). Todas as questões foram cuidadosamente formuladas para correlacionar o conteúdo teórico de Ecologia básica visto em sala de aula com trechos específicos desses filmes. Os alunos foram desafiados a analisar como as interações entre os personagens e o ambiente retratados nos filmes refletem os conceitos de cadeia alimentar, ecossistema e outros temas estudados.
Na Avaliação 3 (AV3), todas as questões da prova foram correlacionadas ao filme O Lorax: em busca da trúfula perdida (Illumination Entertainment; Universal Studios, 2012) (Apêndice 3). Os alunos foram avaliados sobre os conceitos de atmosfera e composição do ar, utilizando a narrativa e os cenários apresentados no filme como contexto para as questões.
Cada turma participou ativamente das três avaliações, com as questões contextualizadas com animações infantis sendo incorporadas conforme o planejamento prévio. Os dados foram coletados através da aplicação das avaliações e da observação do desempenho dos alunos. Além disso, a análise das notas e o feedback dos alunos representaram um poderoso instrumento diagnóstico do material aplicado.
Resultados
Os resultados da pesquisa realizada revelam aspectos significativos sobre a eficácia da aplicação de práticas avaliativas contextualizadas com animações infantis. A integração das animações com o conteúdo curricular demonstrou uma aproximação significativa entre os conceitos teóricos e suas aplicações práticas.
Os alunos foram expostos a questões que conectavam diretamente as narrativas e os cenários dos filmes com temas como Ecologia básica, composição da atmosfera e equilíbrio termodinâmico. Essa contextualização contribuiu para tornar os conceitos científicos mais acessíveis e compreensíveis, permitindo que os alunos percebessem a relevância e a aplicabilidade dos conteúdos discutidos em sala de aula. O uso dos filmes não apenas facilitou a assimilação dos conceitos, como também enriqueceu a experiência educativa, proporcionando um aprendizado mais engajado e intenso.
Os alunos expressaram uma nova percepção sobre o processo de estudo, relatando que as animações infantis ajudaram a ampliar sua visão sobre como os conteúdos científicos podem ser explorados. Muitos reconheceram que as histórias e os cenários dos filmes continham informações valiosas e contribuíram para uma melhor compreensão dos conceitos estudados. Essa mudança na percepção também se refletiu na forma como os alunos se prepararam para as avaliações, indicando um aumento na motivação e no interesse pelo estudo das Ciências.
Um dos alunos se expressou na seguinte forma:
Achei muito interessante e divertido ver as animações incluídas nas nossas avaliações. Quando a gente vê uma animação que já conhece ou que parece legal, fica mais fácil se concentrar e entender as perguntas.
Esse resultado sugere que a abordagem contextualizada não só facilitou a compreensão dos conceitos como também contribuiu para o desempenho acadêmico. O feedback dos alunos revelou alta satisfação com a metodologia aplicada. Muitos relataram que as animações tornaram o processo de avaliação mais envolvente e interessante, permitindo uma abordagem mais dinâmica e criativa dos conteúdos. Um dos alunos destacou:
Às vezes, as matérias podem parecer um pouco difíceis ou até chatas, mas quando você vê uma animação que está ligada com o que você está aprendendo, parece que a aula é mais interessante.
As atividades baseadas em filmes foram vistas como oportunidades para explorar e refletir sobre os temas de maneira mais acessível, reforçando a eficácia das práticas avaliativas contextualizadas.
Conclusão
A pesquisa evidenciou que a incorporação de animações infantis nas práticas avaliativas teve um impacto positivo significativo. A contextualização dos conteúdos com elementos visuais e narrativos não apenas aproximou os conceitos teóricos da realidade dos alunos, mas também auxiliou o desempenho acadêmico e a motivação dos estudantes. Esses resultados sugerem que a adoção de práticas avaliativas inovadoras pode ser uma estratégia eficaz para promover um aprendizado mais profundo e engajado.
No entanto, é importante reconhecer que, embora os resultados sejam promissores, a aplicação de práticas avaliativas contextualizadas com animações ainda demanda uma investigação mais aprofundada para consolidar sua eficácia no contexto educacional. Estudos adicionais são necessários para explorar de maneira mais abrangente os impactos dessas práticas em diferentes áreas do conhecimento e em diversos contextos escolares. A continuidade da pesquisa poderá fornecer insights adicionais sobre como otimizar essas práticas e integrá-las de maneira mais eficaz no currículo escolar, contribuindo para um aprimoramento contínuo das estratégias avaliativas e do processo de ensino-aprendizagem.
Referências
ANDRADE LEITE, Fabiane de; RADETZKE, Franciele Siqueira. Contextualização no ensino de Ciências: compreensões de professores da Educação Básica. Vidya, v. 37, nº 1, p. 273-286, 2017. Disponível em: https://periodicos.ufn.edu.br/index.php/VIDYA/article/view/1560. Acesso em: 24 jun. 2024.
AUSUBEL, David Paul. Aquisição e retenção de conhecimentos: uma perspectiva cognitiva. Lisboa: Plátano, 2003.
BRASIL, Tânia Lopes dos Santos; KALHIL, Josefina Diosdada Barrera; COSTA, Lucinete Gadelha da. Aprendizagem significativa: desafios da avaliação no ensino de Ciências. Reamec – Rede Amazônica de Educação em Ciências e Matemática, v. 10, nº 1, p. e22018, 2022. Disponível em: https://periodicoscientificos.ufmt.br/ojs/index.php/reamec/article/view/13144. Acesso em: 24 jun. 2024.
ELIAS, Marcelo Alberto et al. Animações na alfabetização científica: possibilidades e ferramentas metodológicas alternativas no ensino de Ciências e Biologia. Research, Society and Development, v. 9, nº 10, p. e3739108648, 2020. Disponível em: https://rsdjournal.org/index.php/rsd/article/view/8648. Acesso em: 24 jun. 2024.
LUCKESI, Cipriano Carlos. Avaliação da aprendizagem escolar. São Paulo: Cortez, 2002.
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LUCKESI, Cipriano Carlos. Avaliação da aprendizagem na Educação Infantil. Revista Interacções, v. 10, nº 32, 2014.
LUCKESI, Cipriano Carlos. Avaliação da aprendizagem na escola e a questão das representações sociais. Eccos Revista Científica, v. 4, nº 2, p. 79-88, 2002.
MACHADO, Camila Juraszeck; SILVEIRA, Rosemari Monteiro Castilho Foggiatto. Interfaces entre cinema, ciência e ensino: uma revisão sistemática de literatura. Pro-Posições, v. 31, p. e20170190, 2020.
MAIA, Ana Cláudia Bortolozzi. Questionário e entrevista na pesquisa qualitativa: elaboração, aplicação e análise de conteúdo. São Carlos: Pedro & João, 2020.
MOREIRA, Marco Antonio. Aprendizagem significativa: a teoria e textos complementares. São Paulo: Livraria da Física, 2011.
O LORAX: em busca da trúfula perdida. Direção de Chris Renaud e Kyle Balda. Produção de Christopher Meledandri e Janet Healy. Burbank: Universal Pictures, 2012. 1 DVD.
O REI LEÃO. Direção de Roger Allers e Rob Minkoff. Produção de Don Hahn. Burbank: Walt Disney Pictures, 1994. 1 DVD.
PROCURANDO NEMO. Direção de Andrew Stanton e Lee Unkrich. Produção de Graham Walters. Burbank: Walt Disney/Pixar, 2003. 1 DVD.
WALL·E. Direção de Andrew Stanton. Produção de Jim Morris. Burbank: Walt Disney/Pixar, 2008. 1 DVD.
Apêndice 1
Apêndice 2
Apêndice 3
Publicado em 24 de setembro de 2025
Como citar este artigo (ABNT)
VASCONCELOS, Janssen Marques de; MESSEDER, Jorge Cardoso. Práticas avaliativas com animações infantis: relato de experiência no Ensino Fundamental. Revista Educação Pública, Rio de Janeiro, v. 25, nº 36, 24 de setembro de 2025. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/25/36/praticas-avaliativas-com-animacoes-infantis-relato-de-experiencia-no-ensino-fundamental
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