O ensino de Matemática por meio de histórias em quadrinhos
Eudes Antonio Costa
Docente de Matemática na UFT
Vinicius Caitano de Sousa
Graduado em Matemática (UFT)
Este artigo tem como objetivo discutir uma proposta didática sobre o uso das histórias em quadrinhos (HQ) como ferramenta metodológica no ensino de Matemática. Pretende-se apresentar essa linguagem como recurso didático para abordar conteúdos da disciplina junto aos estudantes do Ensino Fundamental. A proposta inclui o uso do aplicativo Pixton para tratar do conceito de números primos, buscando despertar o interesse dos alunos por meio da leitura e da interpretação das tirinhas.
Para complementar a pesquisa, foi elaborada uma HQ utilizando o Pixton, com o objetivo de tornar o conteúdo mais acessível. Tal iniciativa mostra-se relevante, visto que o futuro docente deve estar apto a empregar ferramentas tecnológicas no processo de ensino. Segundo a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) (Brasil, 2018, p. 297), é necessário realizar pesquisas envolvendo variáveis categóricas e numéricas, organizar os dados em tabelas e gráficos — com ou sem o uso de tecnologias digitais — e apresentar a síntese dos resultados.
Este trabalho é um recorte do trabalho de conclusão de curso de Sousa (2021), desenvolvido no curso de Licenciatura em Matemática (EaD/UFT), que analisou a utilização das HQ como ferramenta didática e metodológica no ensino da Matemática na Educação Básica.
Materiais e métodos
No que diz respeito ao uso das HQ no ensino da Matemática, Santos Junior, Trindade e Oliveira (2019) afirmam que essa é uma das disciplinas que mais sofre rejeição por parte dos estudantes. Segundo os autores, é comum ouvirmos que “Matemática é difícil” ou que os alunos “não conseguem aprender nada”. Essa percepção pode estar relacionada à falta de estímulo adequado, o que resulta em baixos rendimentos na disciplina.
Muitos fatores contribuem para essa falta de estímulo em aprender a Matemática; por exemplo, pode ser citada a aplicação de metodologias que trabalham demasiadamente o tradicionalismo – métodos padronizados, mecânicos, executados por meio da solução de extensas listas de exercícios, às vezes, com grande número de questões parecidas – o que em nada favorece a criatividade e o raciocínio do aluno, dificultando que ele perceba a importância do conhecimento matemático visto em sala de aula e sua aplicabilidade fora do ambiente escolar (Santos Junior; Trindade; Oliveira, 2019, p. 6).
Esses autores apontam que é necessário evitar práticas que distanciem o estudante de situações cotidianas. Para tanto, propõem-se alternativas didáticas que favoreçam o ensino eficaz, ativo e participativo.
A BNCC (Brasil, 2018, p. 266) orienta que diversos materiais didáticos devem ser utilizados no ensino da Matemática, como calculadoras, ábacos, jogos, planilhas eletrônicas, entre outros recursos. Alinhada a essa proposta, sugerimos a adoção das HQ como instrumento pedagógico.
As histórias em quadrinhos, conhecidas popularmente na forma de gibis, são um meio de comunicação amplamente difundido, atualmente também disponível em formato digital. Para compreendermos o que são as HQ, recorremos à definição de Vergueiro (2018):
Quadrinho ou vinheta constitui a representação, por meio de uma imagem fixa, de um instante específico ou de uma sequência interligada de instantes, que são essenciais para a compreensão de uma determinada ação ou acontecimento. Isso quer dizer, portanto, que um quadrinho se diferencia de uma fotografia, que capta apenas um instante, um átimo de segundo em que o diafragma da máquina fotográfica ficou aberto (Vergueiro, 2018, p. 35).
Santos Junior, Trindade e Oliveira (2019) destacam que as HQ atualmente abrangem diversos gêneros e temas, com linguagem acessível, combinando elementos visuais e escritos, além de se apresentarem em diversos formatos, como quadrinhos, charges, entre outros.
Para Ferreira (2019), o uso de HQ no ensino pode trazer resultados melhores do que sem ele, em virtude da facilidade de leitura e da melhor interpretação dos conteúdos abordados. Ferreira e Ribeiro (2014) destacam que as HQ podem se articular ao conteúdo curricular não de forma autônoma, mas como ferramenta didática e metodológica útil para apresentar temas de qualquer componente curricular.
As aulas de Matemática com o uso das HQ permitiram estimular a imaginação e a criatividade e, fundamentalmente, despertaram o interesse pela leitura e escrita, contribuindo para a produção dos textos. Nessa perspectiva, este projeto está relacionado à utilização de HQ num contexto de aprendizagem no qual se buscou motivar os alunos durante as aulas de Matemática. Além disso, vale salientar que o emprego dos quadrinhos é sugerido na LDB, nos PCN (Ferreira; Ribeiro, 2014, p. 10).
Santos Junior, Trindade e Oliveira (2019) apregoam que o leque de aplicações das HQ é vasto, cabendo ao professor analisar quando e como utilizá-las, qual tipo empregar e em que momento do conteúdo inseri-las. O principal objetivo das HQ no ensino é favorecer a interação dos estudantes na busca pelo conhecimento, despertando seu interesse. Por meio das tirinhas, o estudante pode interpretar com mais facilidade os enunciados das questões, facilitando sua resolução no contexto da Matemática.
Dessa forma, as HQ podem ser aplicadas como uma alternativa utilizada pelo professor de Matemática na contextualização dos assuntos vistos na sala de aula, com o objetivo de despertar o interesse dos alunos, fazendo com que a partir da análise de textos e imagens a aprendizagem aconteça de forma mais significativa e atrativa (Santos Junior; Trindade; Oliveira, 2019, p. 10).
Ferreira e Ribeiro (2014) consideram que as HQ podem estimular os estudantes a criarem situações matemáticas, além de ajudar a desmistificar a imagem negativa que se tem da disciplina, mostrando que ela pode ser atraente, divertida e desafiadora. Para Pereira (2021), a utilização das HQ integradas aos conteúdos matemáticos e aos demais componentes curriculares acompanha as transformações da sociedade e permite apresentar como as ideias são construídas, em contextos sociais, econômicos ou práticos.
As HQ com temas matemáticos podem ser utilizadas em sala de aula de diversas maneiras: como fonte de pesquisa, introdução de conteúdos, desenvolvimento de atividades, entre outros. Assim, é possível apresentar a Matemática de forma mais lúdica, explicando conceitos, fórmulas e histórias sem depender da simples memorização.
Portanto, o uso das HQ, como recurso pedagógico nas aulas de matemática, oferece um ensino mais atraente para o aluno, uma vez que ele pode, por meio de sua criatividade, raciocínio e imaginação, interagir com o conteúdo, percebendo a relação deste com seu cotidiano, entendendo também o contexto no qual o conceito matemático foi descoberto e aplicado, sanando parte das dificuldades que existem ainda hoje em seu aprendizado (Santos Junior, Trindade e Oliveira, 2019, p. 10).

Figura 1: HQ sobre números primos
Enfim, compreendemos as HQ como uma metodologia alternativa e atrativa, capaz de despertar no estudante o interesse por aprender Matemática, tornando a disciplina mais envolvente.
Resultados e discussões
Pensando nesse pressuposto, sugerimos a elaboração e a utilização de HQ por meio do aplicativo Pixton. Ao analisarmos esse programa, verificamos que se trata de uma ferramenta de fácil acesso, embora não esteja disponível em língua portuguesa.
O Pixton© é um programa cujo acesso se dá em conexão com a internet, e o login é através de contas logadas (Google, Facebook e Microsoft) no aparelho em uso ou com preenchimento de dados para a criação de uma conta. As informações do Pixton© podem ser traduzidas facilmente nas ferramentas do navegador utilizado, caso não estejam no idioma português (Gadelha; Borba; Montenegro, 2021, p. 5).
Gadelha, Borba e Montenegro (2021) ressaltam que, ao acessar a plataforma, o usuário encontra três finalidades principais para a criação de HQ: educação, entretenimento e negócios. Já são disponibilizados diversos cenários e personagens-modelo para a elaboração das tirinhas.
No primeiro acesso, é necessário escolher entre alguns pacotes pagos — que oferecem maior variedade de editores e de recursos — ou a versão gratuita, que limita a utilização dos quadrinhos na própria plataforma, sem permitir o compartilhamento entre vários editores.
Proposta de atividade
Nossa proposta de atividade consiste em apresentar o conceito de números primos por meio de HQ. Inicialmente, criamos um cenário em que três jovens estudantes conversam sobre o conteúdo discutido em sala de aula. Ainda na escola, encontram ocasionalmente o professor e propõem uma conversa informal para entender melhor o tema.
Figura 2: História em quadrinhos: o uso do Pixton
Nos quadrinhos, os estudantes discutem a definição e o conceito de números primos, e um deles propõe aos demais o desafio de encontrar os números primos entre 1 e 100. Para resolver a atividade, os alunos utilizam calculadoras, celulares e pesquisas na internet, o que contribui para a criatividade e estimula a busca pelo conhecimento.
Em um segundo momento, o professor marca um novo encontro para discutir as descobertas feitas pelos alunos. Utilizando recursos tecnológicos, como calculadoras, computadores ou celulares, os estudantes testam números compostos apenas pelos algarismos 0 e 1.

Figura 3: Como calcular números primos
Na Figura 3, conforme Costa e Costa (2021), trazemos como exemplo o número 101, que os estudantes verificam ser primo. Após testarem diversos números dessa classe, formulam a conjectura de que, entre os números formados apenas por 0 e 1, apenas o 101 é primo. Esses são os números ondulantes formados por 1 e 0. Para aprofundamento, recomendam-se as leituras de Carvalho e Costa (2022) e Santos e Costa (2023).
Costa e Costa (2021) destacam:
Analisando os casos de n em que uma rep unidade é prima, começamos a explorar números em que apareciam apenas os dígitos 0 e 1, observamos que "101 é primo" e formulamos a seguinte pergunta: Existem outros números primos na forma1010 ··· 101 ou na forma1010 ···10? Diremos que número alternado a é do tipo UZ se for formado apenas pelos dígitos 0 e 1 e é uma sequência alternada dos dígitos 0 e 1, iniciada por 1 (Costa; Costa, 2021).
De posse desse conhecimento, exploramos o conteúdo na tirinha, em que os estudantes discutem a possibilidade de existirem outros números formados por 0 e 1 que também sejam primos. Compreendemos que, por meio das HQ, é possível apresentar diversos conteúdos de forma mais acessível, pois o formato curto das tirinhas facilita a compreensão por parte do leitor.
O uso das HQ no ensino da Matemática é relevante para a apresentação de determinados conteúdos, pois facilita tanto o desenvolvimento quanto a abordagem dos temas. A BNCC (Brasil, 2018, p. 266) ressalta que o desenvolvimento de habilidades matemáticas está relacionado à análise de situações do cotidiano, de outras áreas do conhecimento e da própria Matemática.
Ferreira e Ribeiro (2014) destacam que atividades com HQ no ambiente escolar têm como objetivos desmistificar a imagem da Matemática, incentivar a criatividade e a cooperação entre os pares, promover a investigação e explorar diferentes formas de resolução, além de abordar conceitos de maneira lúdica e criativa.
Considerações finais
No decorrer desta pesquisa, observamos que é possível apresentar conteúdos de Matemática por meio das histórias em quadrinhos. No papel de educador, entendemos que o professor deve estimular o desenvolvimento intelectual do discente, possibilitando, assim, sua aprendizagem. Ao utilizar uma linguagem mais leve, a HQ pode se tornar uma alternativa viável para apresentar ou ensinar conteúdos, despertando a curiosidade do aluno por determinados temas.
Na HQ que desenvolvemos, procuramos apresentar o conteúdo de números primos de maneira interessante, por meio de uma situação informal: uma conversa simulada entre estudantes e um professor, após um encontro ocasional na escola.
Acreditamos que o uso da HQ no ensino pode contribuir para despertar a atenção dos estudantes no processo de ensino-aprendizagem, conforme orienta a BNCC (Brasil, 2018). Quando bem elaborada e apresentada no momento oportuno, a tirinha facilita o desenvolvimento e a abordagem do conteúdo, especialmente quando relacionada ao cotidiano dos estudantes.
Além desta proposta, pretendemos, em nossa prática pedagógica, incentivar que os próprios alunos produzam ou colaborem na criação de textos em formato de HQ, como forma de promover maior engajamento e aprendizado.
Referências
ARAÚJO JUNIOR, Francisco de Paula Santos de; TRINDADE, Anna Karla Barros da; OLIVEIRA, Lindon Jonhson do Nascimento. Histórias em quadrinhos como ferramenta de contextualização de conceitos matemáticos. Ensino da Matemática em Debate, v. 6, p. 32-41, abril 2019.
BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Versão final. Brasília: MEC, 2018. Disponível em: https://basenacionalcomum.mec.gov.br/. Acesso em: 16 out. 2023.
CARVALHO, Fernando Soares; COSTA, Eudes Antonio. Um passeio pelos números ondulantes. Remat - Revista Eletrônica da Matemática, v. 8, nº 2, p. e3001-e3001, 2022.
COSTA, Eudes Antonio; COSTA, Grieg Antonio. Existem números primos na forma 101...101. Revista Professor de Matemática, nº 103, 2021.
FERREIRA, Edna Cristina; RIBEIRO, Genes Duarte. HQ em Matemática: aprendendo matemática de forma criativa. Campina Grande: Ed. UFPB, 2014.
GADELHA, Darcymere; BORBA, Rute; MONTENEGRO, Juliana Azevedo. Software Pixton: uma proposta de recurso para a ilustração de possibilidades combinatórias. Recife: Ed. UFPE, 2021.
MENEZES, Afonso Henrique Novais et al. Metodologia científica: teoria e aplicação na Educação a Distância. Petrolina: Ed. Univasf, 2019.
SANTOS, Douglas Catulio; COSTA, Eudes Antonio. Peculiarities of smoothly undulating number. Intermaths, v. 4, nº 2, p. 38-53, 2023.
SOUSA, Vinicius Caitano de. O ensino de Matemática por meio da história em quadrinhos. 2021. Trabalho de conclusão de curso (Licenciatura em Matemática – modalidade EaD) – Universidade Federal do Tocantins, Arraias, 2021.
VERGUEIRO, W. A linguagem dos quadrinhos: uma “alfabetização necessária”. In: RAMA, A.; VERGUEIRO, W. (org.). Como usar as histórias em quadrinhos na sala de aula. 4ª ed. São Paulo: Contexto, 2018.
Publicado em 29 de outubro de 2025
Como citar este artigo (ABNT)
COSTA, Eudes Antonio; SOUSA, Vinicius Caitano de. O ensino de Matemática por meio de histórias em quadrinhos. Revista Educação Pública, Rio de Janeiro, v. 25, nº 41, 29 de outubro de 2025. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/25/41/o-ensino-de-matematica-por-meio-de-historias-em-quadrinhos
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