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Divina senhora

Cláudia Dias Sampaio

Entrevista com Dona Antônia

Ela chegou ao Rio de Janeiro há trinta anos e, desde então, sua principal missão foi a de perpetuar a cultura de sua terra natal em solo carioca. A maranhense Dona Antônia reproduz, com a obstinação digna das caixeiras mais divinas, um pouco do ritual e das festas tipicamente maranhenses. A festa do Divino Espírito Santo e os tambores de Mina e de Crioula são os principais acontecimentos no terreiro de Dona Antônia, que fica nos recantos de Nova Iguaçu, na Zona Oeste do Rio de Janeiro.

Como é o interesse dos cariocas pela Festa do Divino?

Eu faço essa festa há quase trinta anos, mas ela nunca teve uma grande evolução. O povo não procura saber o significado desses acontecimentos. Aqui no Rio, a festa do Divino acontece também em outros lugares, como na Ilha do Governador. Essa foi a primeira festa maranhense que veio para o Rio de Janeiro. Tem toda a origem religiosa. Nós temos um respeito muito grande pelo Divino Espírito Santo, e essa festa é uma cultura dentro desse sincretismo.

Quando a senhora chegou ao Rio de Janeiro?

Eu sou do Maranhão. Minha mãe começou a fazer a festa lá, depois veio para o Rio e continuou com a festa por aqui. Quando ela faleceu, eu já tinha casa própria. Como eu faço parte do santo, tenho minha casa aberta: toco tambor de Mina, candomblé e gege-nagô. Veio uma raiz muito forte na nossa vida. Eu estava com 22 anos quando cheguei no Rio.

Desde esse tempo a senhora procura cultivar sua cultura?

Isso. Minha mãe se foi, eu pensei que ia terminar, mas continuei com a missão dela que agora é a minha.

O que a senhora acha da recepção dos cariocas com a cultura maranhense?

Essas meninas estão fazendo um trabalho muito bonito dentro da cultura maranhense. Elas estão apresentando o tambor de crioula, que era muito difícil, eu ainda não tinha visto por aqui. (Dona Antônia se refere ao trabalho das meninas do Núcleo de Folguedos Populares As Três Marias, idealizado pelos maranhenses: Cacau Amaral, Fernando Mendonça, Joana Araújo, Juliana Manhães, Miza Carvalho e a carioca Raquel Aguilera.) Todas as culturas do maranhão elas estão trazendo, e têm pessoas que não são nem do Maranhão. Às vezes os próprios maranhenses não têm um certo conhecimento, não procuram se aprofundar dentro das belezas que essa cultura possui, conhecida no mundo inteiro. Elas estão me dando muito incentivo, muita força para eu continuar. Eu já estava com vontade de desistir, mas elas apareceram no meu caminho e disseram: "Não dona Antônia, sua festa não pode acabar, nós estamos aqui para lhe ajudar". E aí me deram essa força. Elas me pediram para ensinar algumas coisas. O Maranhão é muito longe, nem sempre elas estão lá. Eu não me importo, também não sei nada, sou também uma aprendiz. Cada dia a gente aprende uma nova coisa. Elas querem aprender a cantar, a tocar a caixa. Nós estamos aí para ensinar o que a gente sabe. Nós não tivemos professor, elas estão fazendo a mesma coisa que eu fiz: aprendi escutando, vendo, e é assim que a gente faz a festa.

A sua festa tem alguma diferença da maranhense?

Não. É igual, não muda nada. No ano passado tive um gasto muito grande. Eu achava que não ia fazer a festa. Foi uma correria danada. Eu sempre fiz essa festa sozinha, sem a ajuda financeira de ninguém. Agora estou sentindo que tem mais pessoas interessadas em cultivar essa cultura.

E o tambor de Mina?

Tem muitas pessoas do Maranhão que precisam de um centro para receber suas entidades de lá, e o tambor de Mina é para isso, para todos os maranhenses que querem desenvolver seu lado espiritual.

Existe alguma diferença entre as entidades do candomblé e umbanda no Rio de Janeiro e do tambor de Mina, no Maranhão?

As entidades são as mesmas, o que mudam são os nomes e os rituais. Aqui o povo conhece muito o candomblé e a umbanda. O tambor de Mina eu toco quando vai o pessoal do Maranhão. Eu faço os três na minha casa. Mas o tambor de Mina é a minha raiz, está no meu sangue.

1/8/2006

Publicado em 01 de agosto de 2006

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