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Se Deus quiser, um dia eu quero ser índio (Rita Lee)
Karla Hansen
Um dia no Museu do Índio
Quem às vezes tem vontade de "viver pelado, pintado de verde, num eterno domingo", como diz uma antiga canção de Rita Lee, não pode deixar de ver a exposição "Tempo e Espaço na Amazônia: Os Wajãpi", que está no Museu do Índio (Rua das Palmeiras, 55, Botafogo, Rio de Janeiro).
A visita oferece a chance de realizar a velha fantasia de trocar a vida na cidade - ao menos, por um tempo - pela dos índios, no caso, os Wajãpi, do Amapá. Se não, vale pela experiência de conhecer um povo alegre, que adora música e festas, tem um profundo respeito pela natureza e valores humanos intactos, como a solidariedade e o amor ao trabalho e à arte.
A exposição reúne uma coleção de 400 objetos, além de um acervo de sons e de imagens da vida cultural de 40 aldeias Wajãpi, onde vivem 550 pessoas. Eles são o primeiro grupo indígena brasileiro a ter sua arte reconhecida como Patrimônio Imaterial da Humanidade pela Unesco. Inspirando-se nos padrões gráficos de couros de animais, como cobras, jabutis e peixes, eles desenvolveram um sofisticado traço, o kusiwa, que é usado na pintura corporal e na decoração de artefatos.
Roteiro do visitante
Logo no jardim do Museu do Índio, uma enorme casa indígena desperta a curiosidade do visitante que - seja de qualquer idade - não resiste a entrar. A estrutura é semelhante às moradias comuns dos índios brasileiros: uma oca de palha com apenas uma pequena entrada - há que abaixar um pouco para entrar - sem porta e sem janela, mas chama atenção o espaço interno. Uma vez dentro da casa, sente-se uma atmosfera mágica! O visitante se vê no centro de um espaço circular, de pé direito alto, de onde se ouvem sons de cantos indígenas. Esta é a Jurá, construída pelos Wajãpi especialmente para a exposição, com todos os objetos e utensílios utilizados por uma família, em sua própria casa.
A exposição, propriamente dita, está no segundo andar do casarão do Museu e é dividida em nove espaços diferentes. O primeiro, mais amplo, representa "a dança dos peixes", um dos rituais mais importantes desse grupo indígena. As máscaras expostas são feitas com folha de mandioca seca e estrutura de bambu, com que os índios se enfeitam para cantar, dançar e tocar flauta no dia da festa. No alto, uma multidão de peixes de madeira e uma imensa e colorida "cobra-grande" enfeitam o teto do salão. Numa das paredes da sala, uma pintura de cores vibrantes reproduz o tema dessa dança, que se reporta ao mito da criação para os Wajãpi, quando se estabeleceu a diferença entre os animais e os homens.
Nas duas salas seguintes, encontram-se espaços destinados às músicas e festas e, separadamente, à "dança para empurrar o céu". Existem 58 ciclos de festas coletivas dos Wajãpi, nas quais se destaca uma orquestra de flautas, que além das festas também são tocadas no cotidiano. Na "dança para empurrar o céu", os índios Wajãpi contam a lenda do início dos tempos: o mundo estava ameaçado pela escuridão da noite e era preciso que os índios, dançando, e portando grandes varas, empurrassem o céu para separá-lo da terra.
A exposição traz, ainda, a cosmografia - modo como se conhece e representa a estrutura do Universo - dos Wajãpi. Para eles, diferente do nosso mundo, que está no meio, existem os mundos de baixo - onde tudo está velho e sujo - e o mundo de cima - onde se vive jovem e tudo é novo. Assim como muitos outros grupos indígenas, essa divisão dos mundos, também é entendida pelos Wajãpi como passado e presente.
Numa sala reservada às artes gráficas, pode-se ver os desenhos produzidos por jovens e adultos, que apresentam o padrão kusiwa, inspirado na padronagem de pele de animais e composições representativas do grafismo dos Wajãpi. No centro da sala, vitrines mostram todos os elementos da vestimenta e dos ornamentos utilizados pelos homens e pelas mulheres.
Vemos também que os Wajãpi já têm bastante contato com a nossa sociedade. Esse contato é exposto num painel com textos e fotos que tratam dos desafios que se apresentam hoje a esse grupo indígena, como a perda de suas tradições e de sua identidade, mas também, a luta pela preservação desses valores, por meio de educação indígena e pela apropriação de tecnologia, como a produção de vídeos para o registro de seu patrimônio cultural.
O mais admirável da exposição é o fato de que todo o trabalho foi feito pelos próprios índios, num esforço que mobilizou todas as 40 aldeias. Com o apoio dos jovens que dirigem o Conselho das Aldeias (Alpina), todos participaram, se organizando de modo a garantir que cada família pudesse colaborar com a mostra. Comunicando-se por meio de rádio, as tarefas foram distribuídas e todos trabalharam durante seis meses, buscando matérias-primas na mata, organizando oficinas de cerâmica, comparando e selecionando peças e, ainda, transportando todo o material de lugares muito distantes.
"Tempo e Espaço na Amazônia: Os Wajãpi"
Horário de visitação: 3ª a 6ª, das 9h às 17:30h
Sábado e Domingo, das 13h às 17h
Ingresso: R$ 3,00.
Aos domingos e para alunos de escolas públicas, grátis.
Programa especial para visita de escolas
Conheça, também o novo site do Museu do Índio.
Ficha técnica da exposição:
- Título: Tempo e Espaço na Amazônia: Os Wajãpi
- Autor: Wajãpi
- Gênero: Artes Plásticas
- Produção: Museu do Índio
Publicado em 7/8/2006
Publicado em 08 de agosto de 2006
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