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Ano novo com força nova
Giovânia Costa
Professora de Filosofia
2006 vem chegando de mansinho, mas daqui a pouco começa a correria. Novas turmas, novos rostos, novas expectativas. Muitos já devem estar às voltas com o planejamento, outros ainda com aquela preguicinha boa das férias esperam o ano andar um pouco mais rápido para, então, voltarem aos papéis, à tela do computador, às tabelas, aos gráficos etc.
Muito se fala em como é importante a adaptação das crianças e adolescentes, seja na primeira escola, seja nas prováveis mudanças de escolas. Mas, pouco se fala da importância do primeiro dia de aula para o professor e para o relacionamento que terá com a turma ao longo do ano. A primeira impressão! E sabemos todos que professores deixam marcas que se perpetuam na memória e também no coração. Marcas boas e marcas ruins. Bruxas que queremos esquecer e carinhos eternos que nos aquecem o coração.
Lembro-me da primeira vez que "enfrentei" uma turma. Enfrentar está longe de ser um bom termo para a apresentação de um professor à sua classe, mas o escolhi por ainda lembrar do receio que tive. Não me sentia muito diferente da adolescente que ansiava por fazer novos amigos, ainda que ali a situação fosse outra. Eu entrava no novo espaço com uma autoridade desconhecida para mim e daí o "enfrentamento". Hoje, prefiro pensar nesse primeiro encontro como uma nova possibilidade de abertura para que eu aprenda um pouco mais a exercer a minha autoridade sem o autoritarismo ao qual estamos acostumados e sem querer ou sem perceber muitas vezes o exercemos. E porquê não dizer: o sistema educacional nos impulsiona a exercer.
Nós temos tão pouca autonomia para fazer nossos próprios caminhos que se não estivermos atentos vamos mandar calar a boca aos berros, dar zeros com um gostinho de vingança para aquele "pestinha" que não nos deixa falar, vamos esquecer da troca, dos sonhos, da utopia e vamos ficar nos lembrando muito mais do trânsito, do salário, do horário.
No fim do ano, confesso: já estava tudo chato! O barulho da rua em novembro parece muito mais alto do que em abril. Vai ver que é o calor, lá fora e dentro da sala, vai ver é tanta coisa que tentamos, que desejamos e no balanço final perdemos. É por isso que quero lembrar com vocês as palavras de Drummond no poema "O tempo".
Quem teve a ideia de cortar o tempo em fatias,
a que se deu o nome de ano,
foi um indivíduo genial.
Industrializou a esperança, fazendo-a funcionar no limite da exaustão.
Doze meses dão para qualquer ser humano se cansar e entregar os pontos.
Aí entra o milagre da renovação e tudo começa outra vez, com outro número e outra vontade de acreditar que daqui pra diante vai ser diferente.
Este poema é ótimo para musicar essas horas mansas. As utopias podem se renovar e nos fazer de novo confiantes e cheios de energia para "cair dentro do planejamento" do ano que se inicia, ainda que saibamos que a aula é um organismo vivo que por mais que planejemos o que acontece lá, na sala de aula, será resultado da troca. Mas, sem um objetivo claro de onde queremos ir fica impossível percorrer qualquer caminho e o que poderia ser rico passa a ser só um passar chato e desgastante do tempo.
A aula é para mim uma performance. O espaço cênico onde professores e alunos atuam. Dizem que nos grandes atores, a cada espetáculo, quando bate o terceiro sinal e é hora de entrar em cena, o frio na barriga é igual sempre. E é isso que garante a emoção que nos faz rir ou chorar. Que bom seria se cada aula fosse como um espetáculo e nós pudéssemos nos sentir sempre frente a uma plateia atuante e estimulada que espera muito de nós e a quem não queremos decepcionar!
Penso que o primeiro encontro do mestre com as suas novas turmas deve acontecer com uma força tremenda para que a potência desse dia nos conduza por bons caminhos ao longo do ano. Como fazer com que isso aconteça? Quais estratégias usar?
Cada um deve construir as suas estratégias, de acordo com seus talentos naturais, já que o ofício de ensinar é tão nebuloso... Sim, pois nas Faculdades de Educação nos ensinam o que é ensinar, mas não como ensinar. Isso acaba ficando por conta do tempo e é comum ouvir: aprende-se a dar aula dando. Será? Será que não deveríamos ter aula de voz, de expressão corporal, de técnicas de dinâmicas, e outra coisas que precisam ser pensadas como inerentes a esse ofício? Bem, fica a pergunta no ar para uma outra reflexão. Aqui, é hora de pensar mais miudinho. Pensar sobre o primeiro dia de aula e nos preparamos bem para ele.
É um momento especial. São novos grupos que se formam e que vão caminhar com você durante todo o ano. Sabemos que em algumas turmas será mais fácil, em outras sem saber bem aonde, perdemos o tom. É fácil responsabilizar a turma, mas uma reflexão mais séria fará com que qualquer um traga pra si parte dessa responsabilidade. Daí a importância de se preparar bem esse primeiro encontro para não desafinar de saída.
Apresentar o programa, combinar avaliações, tudo isso é importante. Mas, talvez possa esperar um pouco. É hora de conhecer, de saber quem são os novos alunos, de se apresentar a eles. Prepare algo para compartilhar esse momento e curta-o bastante. Os jovens que estarão ali na sua frente estarão, com certeza, com muita curiosidade sobre quem é você. Acione as suas curiosidade sobre quem são eles. Durante o ano vamos falar tanto... Tão mais do que eles! Podíamos começar ouvindo não é mesmo?
Todo o conteúdo está por vir. Comece pelo afeto, sem ele não seremos ouvidos. Deixe-se ver para ser querido. Escute para ser escutado depois. Ria, toque, seja carinhoso. Viva com prazer a oportunidade de deixar tantas novas vidas se cruzarem com a sua.
Boa caminhada ao longo de 2006.
Discutindo: Como seria começar bem o primeiro dia de aula? Participe!
Publicado em 31 de janeiro de 2006
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