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Acertando expectativas sobre aquecimento global

Leo Silva

Especialistas que participaram do painel da ONU falam dos primeiros resultados

Até o fim do século XXI, a elevação do nível do mar provocada pelo efeito estufa não vai engolir as cidades litorâneas do Brasil. Muito menos se espera que todas sejam atingidas da mesma forma e, menos ainda, que a maior parte da população brasileira esteja sujeita aos efeitos dessa elevação. Essa foi uma das revelações feitas pelo professor José Miguez durante o seminário Contribuição Humana à Mudança do Clima da Terra: aspectos físicos e repercussões sócioeconômicas, realizado na Coppe/UFRJ, dia 7 de março.

Miguez chamou a atenção ainda para o fato de que o Sumário para Formuladores de Políticas, elaborado pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças do Clima (IPCC, em inglês) da ONU, em fevereiro passado, não leva em consideração os efeitos das medidas mitigadoras acordadas pelos governos no Protocolo de Quioto. Segundo ele, a ideia é evitar que os cenários pessimistas se realizem. O professor é secretário executivo do Comitê Interministerial de Mudança Geral do Clima (CIMGC) e desde 1994 trabalha com mudanças climáticas no Ministério da Ciência e Tecnologia. Atualmente, é o chefe da Coordenação Geral de Mudanças Globais de Clima do ministério.

O seminário foi uma oportunidade para se conhecer o conteúdo do documento aprovado em Paris, exposto por cientistas que trabalharam em sua elaboração. Além de José Miguez, apresentaram-se os professores Pedro Dias, do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da USP, e o professor Paulo Artaxo, do Instituto de Física da USP. Os três tomaram parte nas discussões no Grupo Trabalho I - Ciência da Mudança do Clima, do IPCC.

Participaram ainda o professor Luiz Pinguelli Rosa, coordenador do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas, e a professora Maria Justi, presidente da Sociedade Brasileira de Meteorologia. O evento foi promovido pelas duas organizações.

O que muda

Segundo José Miguez, o aumento do nível do mar previsto no relatório de avaliação do GT I não produzirá efeitos iguais ao longo de todo litoral brasileiro, e muito menos afetará realmente a maior parte da população do país.

Ele citou um estudo de 1992 sobre os possíveis efeitos da elevação do nível do mar para o país onde se identificou que a costa brasileira, constituída em sua maior parte de falésias, estaria protegida. Os problemas se concentrariam nas áreas mais baixas, nas quais se encontram algumas grandes cidades, caso de Recife. Para proteger essas áreas, segundo ele, já existem projetos de engenharia.

Além disso, ele destacou ainda o fato de que a maior parte da população brasileira vive em uma faixa compreendida entre 30km a 400km da costa, portanto, longe das possíveis consequências diretas do avanço das águas.

Para o professor Pedro Dias, a maior ameaça para essas áreas é a mudança na frequência de tempestades, e não a elevação do mar. Para resolver esse problema, ele sugeriu a construção de barreiras, a exemplo do que fez a Holanda.

Paulo Artaxo chamou a atenção para o fato de o regime de chuvas já estar mudando, o que trará consequências para a agricultura e para a Defesa Civil. Para esta, o aumento na incidência de chuvas extremas resultará em inundações e outros desastres do gênero.

Ainda segundo Artaxo, a expectativa é que a elevação da temperatura dos oceanos aumente o número e a intensidade dos furacões.

Com relação ao aumento da força dessas tempestades, Dias notou que, por problemas de escala, os modelos matemáticos empregados na elaboração do relatório não permitem "ver" fenômenos do tamanho de furacões e têm inferência limitada em escala regional.

Uma delas é a redução das chuvas no Centro-oeste e na Amazônia e o aumento na Bacia do Prata. Na primeira, institutos de pesquisa, como a Embrapa, estão desenvolvendo variedades alternativas, que amadurecem mais rapidamente, para tirar proveito das chuvas.

As estiagens mais prolongadas no centro do país também podem ter efeitos negativos sobre a geração de energia elétrica. É nessa região que nascem alguns dos principais rios que abastecem as usinas hidrelétricas. Isso poderia, segundo Dias, ser compensado com o aumento da geração na região Sul.

Para a Amazônia, o pesquisador fez um alerta:

- Mesmo que se tome todos os cuidados para preservar a floresta, uma alteração no clima poderia resultar na perda da floresta. A mudança no regime de chuvas poderia afetar a mata, que seria incapaz de se manter.

Regiões geladas

Segundo o professor Paulo Artaxo, tem se verificado alterações na salinidade do mar em razão da mudança no regime de chuvas e, no hemisfério norte, do degelo nas regiões árticas. Tais mudanças poderiam influenciar as forças motoras das correntes marítimas, alterando-as. Ele ressalta, contudo, que ainda não há dados estatísticos significativos que confirmem o fenômeno.

Paulo notou ainda que na década de 80 houve uma redução de 5% nas áreas cobertas com gelo no hemisfério norte. Ele considerou essa redução pequena, mas significativa. Ela diminui a capacidade daquela parte do planeta de refletir a radiação solar, o que contribui para o aumento da temperatura.

No oceano ártico, o relatório revelou que a perda é de cerca de 2,7% da área coberta por gelo por década. No verão, as perdas são da ordem de 7% a cada dez anos. As previsões são de que em sete ou oito décadas não tenha mais gelo durante o verão se essa tendência continuar. Com base nisso, os estudiosos preveem que por volta de 2070 será possível a navegação para qualquer parte do ártico.

No caso das geleiras, tem sido observada a redução, exceto nos Andes.

Um fenômeno interessante está ocorrendo na Groelândia. Ao mesmo tempo em que perde massa nas bordas em razão do degelo, os depósitos de gelo no centro da ilha aumentam. A razão, segundo Paulo, é o aumento das chuvas. Quando comparados os efeitos dos dois processos, descobre-se que a ilha está perdendo água.

Ao contrário do que apareceu no cinema no filme O Dia depois de Amanhã ou no documentário Verdade Inconveniente, os modelos matemáticos de previsão do clima não revelaram a possibilidade de que um súbito degelo da Groelândia provocasse uma nova "Era Glacial", a exemplo do que ocorreu há cerca de 70 mil anos atrás, como observou o professor Pedro Dias.

O papel da Antártica no clima foi motivo de discussão na reunião de Paris. Os estudos consultados na elaboração do relatório revelaram que o fluxo de perda do continente é relativamente pequeno.

Os estudos também revelam redução nas concentrações de oxigênio:

- Isso também é uma novidade nesse relatório. A concentração de oxigênio está diminuindo, mas é sempre importante notar que é uma diminuição absolutamente pequena, em partes por milhão em uma concentração de oxigênio na atmosfera que é da ordem de 18%. Mas, como esse carbono que estava concentrado lá embaixo, saindo para a atmosfera, precisa ser oxidado para virar CO2, não há milagre na química.

Publicado em 13/03/2007

Publicado em 13 de março de 2007

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