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A presença da figura do professor na MPB
Alexandre Rodrigues Alves
Que a música popular brasileira é uma das mais ricas do mundo, ninguém discute. Em tempos de liberdade e em períodos autoritários; na colônia, na monarquia ou na república; a MPB sempre teve papel marcante na cultura nacional. Com isso, a percepção de mundo de seus artistas torna-se referência para as pessoas que valorizam esses trabalhos.
É óbvio dizer que a visão que esses autores apresentam do ofício de professor varia de acordo com seu momento histórico e com o estilo de música. Além disso, cada compositor traduz para sua obra um olhar diferente sobre essa profissão que mexe com a vida de todas as pessoas.
As composições mais antigas colocavam a professora (no feminino) no pedestal. Ataulfo Alves tem saudades da “professorinha que me ensinou o bê-á-bá”, de Meus tempos de criança (1957); Benedito Lacerda e Jorge Faraj, em Professora, de 1938, consideram-na “operária divina”, aquela que saía para o trabalho quando o dia mal principia – enquanto o apaixonado desconhecido volta da boemia. Mesmo não formada, a professora já atraía a atenção dos marmanjos. Quem pode esquecer da Normalista, também de Benedito Lacerda (agora com David Nasser), cantada por Nélson Gonçalves? “Vestida de azul e branco, (...) minha linda normalista”, casta e dedicada, que “não pode se casar ainda/só depois de se formar (...) o remédio é esperar”. Em 1949, casar com uma professora era garantia de bom relacionamento até que a morte os separasse.
De todo modo, professor é símbolo de conhecimento e de competência. Tanto que Moreira da Silva, quando em 1938 acertou no milhar, fez questão de arranjar “um professor de francês, mon amour” antes de “passear pela Europa, até Paris”. De maneira menos objetiva, em Pedras no caminho (1996), Arlindo Cruz, Sombrinha e Marquinhos PQD dizem que, “com tantas pedras no caminho (da vida), somente um bom professor pra te ensinar a chegar”. Na mesma direção, Margareth Menezes, em Preciso, explica que, se “a vida é uma escola, o tempo é o professor”.
No Dia em que a Terra parou, de Raul Seixas (1978), a cumplicidade entre aluno e professor fica patente: “o aluno não saiu pra estudar, porque sabia que o professor também não estava lá, e o professor não saiu pra lecionar, porque sabia que não tinha mais nada pra ensinar”. Em Quadrilha (1979), Chico Buarque e Francis Hime transpuseram as barreiras da sala de aula: na festa junina anual, na hora de dançar, “foi aluna com o professor”. Vinícius de Moraes e Toquinho levaram às últimas consequências essa aproximação em Aula de Piano, de 1980, quando a menininha e o professor atingiram “a total perfeição (...) a quatro mãos em concertos de amor”.
A intensa relação entre professor e aluno também fica caracterizada quando é feita a combinação de duas músicas: para Zeca Pagodinho, “aluno não sabe mais que o professor” (Velho ditado, 1996). No caminho inverso Renato Russo, na epopeia Faroeste Caboclo (1986), gravada pela Legião Urbana, garante que João de Santo Cristo foi capaz de fazer até seu professor aprender terror com ele. Um detalhe: o advérbio até marca a surpresa do autor com o fato inesperado.
Uma crítica feroz à docência veio em 1994, no rock Autonomia (de Paulo Miklos, Marcelo Fromer e Arnaldo Antunes): os Titãs comparavam pais que deixam seus filhos em jaulas com professores e alunos em sala de aula. Baticum, de Gilberto Gil e Chico Buarque (1989), relaciona, entre tantos convidados para a festa, um professor “falando alemão” - uma figura soberba que teria poucos interlocutores no regabofe. Por essa atitude, ele se identifica com o superior, experiente narrador de Faz parte do meu show (1988), de Cazuza e Renato Ladeira, que pretende testar “teu sexo com ar de professor”. E fica em oposição ao Shazan, da antiga série de TV, cuja música-tema, de Antonio Carlos e Jocáfi, dizia que “Com você é que o mundo precisa aprender (...) pois você tem diploma de amor”.
É de orgulhar a categoria o fato de que a MPB, uma expressão tão forte de nossa cultura, tenha inúmeras músicas que falam da profissão. São tantas que chega a levantar questões metafísicas a partir da profissão docente: “Quem foi que inventou o analfabeto e ensinou o alfabeto ao professor?”, pergunta Chico Buarque em Almanaque (1982).
Alguém tem a resposta?
Publicado em 16 de outubro de 2007.
Publicado em 16 de outubro de 2007
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