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Formação de professores pós-LDB

Débora Barreiros

Universidade do Estado do Rio de Janeiro Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Educação

Onde não houver adicção, haverá paixão. Onde o melhor que há nos seres humanos não estiver totalmente anestesiado, ali estará um professor. E um aluno. E ali germinará entre ambos um processo educativo que encontrará sua fonte na paixão pela vida, na fé que responde ao desvelamento dos mistérios do conhecimento com reverência e zelo.
(Maria Clara Bingemer).

Todos nós, professores, ouvimos o quanto é essencial uma sólida formação inicial e continuada, almejamos melhores condições de trabalho e lutamos por um plano de carreira com melhor remuneração. Quantos de nós conseguimos? Se não conseguimos, deixamos de trabalhar? Claro que não! O compromisso com a aprendizagem não nos deixa abandonar o barco, que mesmo quase submerso ganha força a cada conquista de nossos alunos. Os estímulos e a valorização podem ser escassos, mas o comprometimento com a prática pedagógica nos faz articular novos saberes, novas exigências e todos os aspectos legais da área.

Então, o que significa ser professor? Ser professor significa ser capaz de ressignificar o seu conhecimento e a sua experiência em cada contexto pedagógico em que se insere. Em outras palavras, implica abertura e reflexão sobre as ações educativas, o que envolve a elaboração de novos processos de formação, pois estabelece novas habilidades e saberes para esse novo profissional. E que formação é exigida desse novo profissional?

Este estudo tem como objetivo analisar alguns aspectos da formação inicial e continuada de professores no Brasil. Por se tratar de uma área ampla e complexa, será dividida em quatro momentos: 1) Formação de professores pós-LDB; 2) Competências e habilidades do professor: o que dizem as Diretrizes curriculares para a formação inicial de professores para a educação básica; 3) Educação a Distância: uma estratégia de formação docente; e 4) Educação inclusiva e a formação de professores.

Primeiramente cabe destacar que, a partir da década de 1980, com os debates e os movimentos sociais, foi intensificado o processo de formação docente, que culminou com a promulgação da Constituição Federal de 1988 e com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), nº 9394/96. Nesse quadro referencial, esta lei estabelece, em seu Art. 62, que “a formação de docentes para atuar na educação básica far-se-á em nível superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, em universidades e institutos superiores de educação [...]”.

Entretanto, a formação de todos os professores em nível superior passou a ser considerada uma utopia para o quadro brasileiro, utopia que não poderia ser alcançada de maneira tão rápida. Em decorrência, com a publicação do Decreto n.º 3276/99, foi instituído que os cursos normais superiores passariam também a ser responsáveis pela formação dos docentes da educação básica. Outro marco é o Parecer CNE/CEB nº 03/2003, que aponta uma contradição na LDB e dispõe que os professores da educação infantil e da primeira etapa do fundamental precisam apenas do curso normal em nível de ensino médio para exercer o magistério. O diploma, porém, continua sendo exigido para os que dão aulas para alunos da 5ª à 8ª série e para o ensino médio.

Tais ações ocorreram de modo a ampliar os espaços de formação e mostrar, ao Banco Mundial e a outros órgãos financiadores da educação brasileira, resultados notórios sobre a ampliação dos números de professores qualificados, considerando que, como registra o relatório da Comissão Internacional sobre a Educação para o século XXI, organizada pela Unesco (1999, p. 1) para melhorar a qualidade da educação é essencial melhorar o recrutamento, a formação, o estatuto social e as condições de trabalho dos professores”, de modo que os professores possam “responder ao que deles se espera”.

Apesar de toda mudança ocorrida nos últimos anos no que se refere à formação dos professores, alguns dados divulgados recentemente pela Agência Brasil apontam para uma questão crucial sobre a área, principalmente nas escolas das áreas rurais (que são quase metade das mais de 200 mil escolas públicas brasileiras), cujo percentual de professores sem a formação exigida pela lei é ainda alarmante: “apenas 21% dos profissionais que dão aula de 1ª a 4ª série nas escolas rurais têm graduação, enquanto na cidade esse número aumenta para 56,4%” (Agência Brasil, 2007, p. 1). Os dados do Censo 2006 também ajudam a pensar em que ponto está a formação de professores exigida no país.

Nota

Tabela 1 – Número de funções docentes na educação básica, por localização e nível de formação, em 29/3/2006, no Brasil
Nível das funções docentes Total Urbana
Total Fundamental Médio completo Superior completo
Incompleto Completo
Em creche 94.038 87.231 1.077 3.343 52.117 30.694
Em pré-escolar 309.881 249.451 625 3.091 116.353 129.382
No ensino fundamental de 1ª a 4ª Série 840.185 635.270 297 2.615 208.364 423.994
No ensino fundamental de 5ª a 8ª Série 865.655 755.501 33 175 78.664 676.629
No ensino médio 519.935 503.355 2 13 21.568 481.772

Nível das funções docentes Total Rural
Total Fundamental Médio completo Superior completo
Incompleto Completo
Em creche 94.038 6.807 127 371 5.016 1.293
Em pré-escolar 309.881 60.430 548 2.079 45.771 12.032
No ensino fundamental de 1ª a 4ª Série 840.185 204.915 1.378 4.248 138.491 60.798
No ensino fundamental de 5ª a 8ª Série 865.655 110.154 37 273 46.809 63.035
No ensino médio 519.935 16.580 - 7 2.136 14.437

Fonte: Elaborado com base na Sinopse Estatística da Educação Básica, Censo Escolar 2006.

Resumidamente, no período de 1995 a 2002, o Ministério da Educação formulou e implementou um conjunto de políticas relacionado à formação continuada, com foco nas séries iniciais do ensino fundamental. No período de 1995 e 1999, foram elaborados parâmetros curriculares, diretrizes e referenciais para formação de professores. A partir de 2001, a política focalizou as diretrizes curriculares para a formação inicial de professores para a educação básica em nível superior (AGUIAR, 2004), que implicava pensar no currículo dos cursos de formação de professores da educação básica com um diferencial, visto que exige um projeto amplo para ser compartilhado por todos os futuros docentes da licenciatura, não apenas direcionado aos cursos de Pedagogia.

Essa reestruturação influencia diretamente as escolas, a sociedade e os professores; todos passam a recriar alternativas de ação político-pedagógica, da educação infantil ao ensino médio.

Atualmente, o MEC desenvolve os seguintes programas para formação continuada de professores das redes públicas de educação:

  1. Rede Nacional de Formação Continuada de Professores de Educação Básica, cujo objetivo é contribuir para a melhoria da formação dos professores e dos alunos, num trabalho conjunto com as universidades, centros de pesquisa e desenvolvimento da educação;
  2. Pró-Letramento - Mobilização pela Qualidade da Educação, programa na modalidade a distância que busca a melhoria da qualidade de aprendizagem da leitura/escrita e matemática nas séries iniciais do ensino fundamental;
  3. Pró-Licenciatura, programa de formação inicial dos professores que não possuem a habilitação legal necessária. É desenvolvido em parceria com as Secretarias de Educação Básica, de Educação a Distância e de Educação Superior do MEC, junto às instituições de ensino superior (IES) públicas, comunitárias e confessionais;
  4. Proinfantil,curso de nível médio, a distância, na modalidade Normal. Destina-se aos professores da educação infantil em exercício nas creches e pré-escolas das redes públicas;
  5. Programa Ética e Cidadania. Construindo Valores na Escola e na Sociedade, fundamentalmente desenvolvido nas áreas de educação infantil e educação fundamental, trabalha práticas pedagógicas que conduzam à consagração da liberdade, da convivência social, da solidariedade humana e da promoção e inclusão social;
  6. Programa de Incentivo à Formação Continuada de Professores do Ensino Médio, que tem por objetivo cadastrar instituições de ensino superior públicas e privadas sem fins lucrativos para realização de cursos de formação continuada para professores em exercício nas redes estaduais. Um conjunto de ações de melhoria da qualidade do ensino, com a oferta de cursos de formação continuada para professores nas áreas de Química, Física, Biologia, Matemática, História, Geografia e Língua Portuguesa e Língua Espanhola.

Todos esses programas visam auxiliar os estados e municípios a cumprir a legislação vigente para o exercício da profissão docente. Entretanto, como demonstram os dados, estamos ainda distantes da realidade almejada.

Nessa perspectiva, deixo algumas perguntas: como promover a formação do professor dentro das competências e habilidades exigidas para o profissional do século XXI? Se a formação pedagógica é relevante para o exercício docente, que expectativas o profissional tem sobre sua natureza e formas de operacionalização? O que tem maior destaque na formação, a teoria ou a prática?

Referências bibliográficas

AGÊNCIA BRASIL. Áreas rurais: só 21% dos professores têm graduação. Disponível em http://noticias.terra.com.br/educacao/interna /0,,OI1532463-EI8266,00.html. Acesso em 10/10/2007.

AGUIAR, Márcia Ângela da Silva. Retratos da escola no Brasil. Brasília: CNTE, 2004.

BINGEMER, Maria Clara. “Ser professor: paixão ou adicção?". In: Jornal do Brasil. Rio de Janeiro, 15 de outubro de 2007.

BRASIL. Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica. Programas de formação continuada de professores. Disponível em http://portal.mec.gov.br/seb/index.php? option=content&task=view&id=582&Itemid=584 . Acesso em 20/10/2007.

FREITAS, Helena Costa Lopes de. Formação de professores no Brasil: 10 anos de embate entre projetos de formação. Educ. Soc., Campinas, v. 23, n. 80, p. 136-167, setembro/2002.

UNESCO. Educação: um tesouro a descobrir. Relatório para a Unesco da Comissão Internacional sobre Educação para o século XXI. São Paulo: Unesco/MEC/Cortez, 1999. Disponível em http://www.unesco.org.br/areas/educacao /areastematicas/formprof/index_html/mostra_documento. Acesso em 10/10/2007.

Publicado em 30 de outubro de 2007.

Publicado em 30 de outubro de 2007

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