Série em DVD reconstrói Roma na transição da República para o Império

Ao longo dos últimos mil e quinhentos anos a mística do Império Romano tem permanecido. Normalmente lembrado no cinema e na TV pela perseguição aos cristãos e pela loucura de alguns de seus líderes - como Calígula e Nero -, o império não foi menos importante pela prosperidade alcançada durante a chamada Pax Romana, que serviu para difundir a cultura e as instituições de Roma em toda a Europa. Os acontecimentos que levam da passagem da república para o império e, com este, ao longo período de paz externa, são o pano de fundo da série de TV Roma.

Produzida pela HBO e pela BBC, a primeira temporada da série foi lançada em DVD em dezembro do ano passado e já está disponível nas locadoras. Nos doze episódios, divididos em seis discos, é contada a primeira parte daquela transição, que começa com a vitória de César na Gália e vai até o assassinato deste no ano 44 AC.

Os autores recorreram a três eixos narrativos para contar essa história. Um, central, é a briga política entre os grupos de César e de Catão. Os entreveros levaram, primeiro, a uma guerra civil e, depois, ao assassinato de César.

Este primeiro eixo é entrecruzado por outros dois. Um tem como centro a família de Atia, sobrinha de César e mãe de Otávio e Otávia, e os recursos que usa em suas articulações políticas. Para quem não está lembrado, Otávio entrou para a história como o primeiro imperador, César Augusto.

No núcleo pobre, como se costuma dizer, temos o soldado Tito Pullo e o centurião Lucius Vorenus. Ambos fizeram a Campanha da Gália e, ao longo da série, suas vidas acabam sempre se relacionando com a de César. Aliás, os nomes foram escolhidos justamente por terem sido os únicos citados pelo último cônsul de Roma em seu livro sobre aquela campanha.

Vorenus é especialmente interessante por conta dos dramas morais por que tem que passar. Conservador, adepto das ideias de Catão sobre a República, o centurião acaba se envolvendo mais e mais com pessoas que representam o oposto de suas crenças político-religiosas. Depois, por ser casado, o personagem dá margem a todos os problemas que podem surgir em uma relação quando um dos cônjuges passa oito anos fora sem dar notícias.

Por meio desses dois núcleos, a série nos transporta para o cotidiano do "andar de cima" e do "de baixo" da Roma antiga e a forma como podiam se relacionar. Este é um dos pontos altos da produção. A reconstrução contou com a assessoria de um consultor em história.

Esse trabalho incluiu a reprodução da moralidade da época, que variava de acordo com a classe social e, naturalmente, com o caráter das pessoas. Por isso, para as das cenas com Atia e os seus pares costuma valer o aviso de tirar as crianças da sala. O mesmo não necessariamente acontece com os Vorenus e os seus.

Aparentemente, para não prejudicar o desenvolvimento da trama, o roteiro não embutiu no texto explicações sobre hábitos, religião, organização política e militar ou personagens históricos, cuidou apenas que a reprodução fosse a mais fiel possível.

Oferecer essas explicações é justamente um dos trunfos do DVD. Ativando-se a opção de inserir comentários, é possível conhecer mais sobre alguns aspectos da vida romana retratados na obra, o que ajuda a entender ainda mais a trama.

Um exemplo disso é quando a esposa de Vorenus, Niobe, atormentada, ajoelha-se e faz uma promessa diante de uma mulher muito gorda que está sentada nua no meio da rua e com o corpo pintado de vermelho. O espectador poderia se perguntar, afinal, quem seria aquela mulher e o que ela significava? Quem simplesmente assistisse a série na TV não teria como saber. Com os comentários ativados sabemos que se trata de alguém que dedicou sua vida à deusa Bona Dea, da fertilidade e da terra.

O problema em ativar essa opção é que as legendas deixam de aparecer e nos DVDs só existe áudio em inglês e espanhol. Assim, quem não tem fluência nessas duas línguas, mas estiver interessado em saber mais sobre a Roma antiga, acaba tendo que ver cada episódio duas vezes - uma para se entreter e outra para se informar.

Este pequeno contratempo, contudo, não tira a graça de se assistir Roma.

Publicado em 30/1/2007