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De volta às raízes
Leonardo Soares Quirino da Silva
Existe um engano recorrente e difundido de que, em sua origem, a palavra aluno significaria "sem luz". Isso se funda na ideia fato de que esta palavra teria se originado da reunião do prefixo grego de negação "a" com a palavra latina "lúmen", luz. Logo, aluno seria alumen, sem luz. A partir daí, foi construído um discurso de que caberia ao professor iluminar esses pequenos seres com seu conhecimento.
Se a finalidade do argumento é pode ser boa, sua base é ruim. De fato, aluno vem do verbo latino ale(re - fazer aumentar, crescer, desenvolver, nutrir, alimentar, criar, sustentar, produzir, fortalecer - que deu origem a alumnus - criança de peito, lactente, menino, discípulo.
Foi, em parte, pelo valor da etimologia (estudo da origem das palavras) nas argumentações que Luis Castello e Claudia Mársico, professores da Universidade de Buenos Aires, adotaram esse eixo em Oculto nas palavras: dicionárioetimológicoparaensinar e aprender. Como eles observaram, a versão popular do estudo da origem das palavras, feita sem base científica, costuma resultar da livre associação de ideias cujos significados podem não ser contestados em círculos fechados.
Lançado na Argentina em 2005, o objetivo do livro, contudo, vai além. Segundo os autores, seria "levar a cabo uma análise dos principais termos ligados à práxis docente a partir da perspectiva da análise semântico-etimológica".
Para isso, os 141 verbetes foram organizados em torno de sete perguntas-chave, cada uma delas encerrando um campo semântico. Na primeira, estão 21 verbos relacionados à atividade de educar. As duas perguntas seguintes reúnem os sujeitos dessa ação - quem estuda e quem ensina. Como desdobramento, há seções dedicadas à etimologia das palavras referentes ao local, ao objeto do estudo e ao como se estuda.
A última parte dedica-se ao que o professor Walter Kohan classificou no prólogo como mais difícil: por que e para que se estuda?
Pelo cuidado com que foi feito e traduzido para o português,Oculto nas palavras deve, em breve, tornar-se obrigatório nas estantes de todos que trabalham e pesquisam a área de educação no Brasil.
Verbete aluno:
§ 22. Aluno
Em geral, chamamos 'aluno' ao sujeito que estuda no âmbito de uma instituição. O termo foi, curiosamente, objeto de uma explicação etimológica disparatada que o faz derivar de um suposto a,'não' - remetendo a um alfa privativo próprio do grego - e lúmen, 'luz'. Aluno seria 'o que não possui luz', 'o que está no escuro', e que, portanto, busca "iluminar-se" mediante o estudo. Essa explicação, decerto, não resiste à menor análise histórica ou linguística. Basta pensar que teria de se tratar de um composto híbrido que apresentaria uma raiz puramente latina, lúmen, unida a um prefixo privativo grego a-. A rigor, o termo 'aluno' está aparentado semanticamente ao verbo educar (cf. § 1). Viu-se que uma das etimologias ligadas à ideia de educar se relaciona com 'alimentar'. Não é de se estranhar, então, que aquele que recebe o alimento seja o 'aluno'. Precisamente essa é a acepção do termo latino alumnus, que, assim como alimentum, está formado a partir da raiz al, encontrada no verbo alere, 'alimentar'. Alumnus tem, pois, uma primeira acepção de 'criança', literalmente 'o que é alimentado', e outra derivada e abstrata que ganha o sentido de 'discípulo' (cf. § 24).
Observações
- Há casos claríssimos da existência de híbridos nas línguas modernas; basta citar, como exemplo, 'automóvel', construído sobre a base do termo de origem grega autos, 'si mesmo', 'por si mesmo', e o de origem latina mobilis, 'móvel'. No entanto, é preciso notar que esses casos costumam ser sempre construções tardias e nunca elaborações próprias da língua. O caso de 'automóvel' certamente se ajusta a esse padrão, enquanto em 'aluno' são seguidos os parâmetros de evolução linguística da passagem do latim ao português.
- Da mesma raiz *al provêm, ademais, por um lado, o adjetivo latino altus, 'alto', 'profundo', 'crescido', de onde 'enaltecer', 'exaltar', e por outro lado, as formas compostas aboleo e proles. No caso de aboleo, 'atrasar o desenvolvimento de', donde nosso 'abolir', trata-se da raiz com o prefixo ab-. Proles, 'estirpe', 'descendência', por sua vez, está construída com o prefixo pro- e dá lugar aos derivados 'proletário', proletarius; 'prolífero', composto de proles e fero,'levar', e 'prolífico', de proles e facio,'fazer'.
- O vocábulo 'alunado' é um americanismo gerado a partir do modelo de 'professorado'.
Índice
- Prólogo
- Introdução
- A linguística comparada e o indo-europeu
- Raiz, tema e desinência
- Modificações da raiz
- A passagem do latim às línguas românicas
Critérios de ordenação de termos, transliteração e signos utilizados
A. O que é educar?
- Educar
- Ensinar
- Instruir
- Formar
- Transmitir
- Explicar
- Facilitar
- Mediar
- Iniciar
- Preparar
- Ilustrar
- Impor
- Guiar
- Orientar
- Doutrinar
- Professar
- Adestrar
- Exercitar
- Experimentar
- Dar
- Gerar
B. Quem estuda?
- Aluno
- Adolescente
- Discípulo
- Criança, infante, pueril (latim puer)
- Estudante
- Educando
- Colegial
- Ouvinte
- Menor
- Aprendiz
- Seminarista
- Estagiário
- Bacharel
C. Quem ensina?
- Docente
- Mãe
- Pai
- Tutor
- Mestre
- Professor
- Reitor
- Diretor
- Vice-reitor, vice-diretor
- Secretário
- Inspetor
- Pedagogo, psicopedagogo
- Preceptor
- Ministro
- Colega
- Cátedra, catedrático
- Ajudante
- Auxiliar
- Assistente
D. Onde se estuda?
- Escola
- Sala
- Colégio
- Academia
- Liceu
- Universidade
- Faculdade
- Departamento
- Instituto
- Estabelecimento
- Biblioteca
- Laboratório
- Conservatório
- Museu
- Turno
- Recreio
E. O que se estuda?
- Currículo
- Área
- Disciplina
- Matéria
- Texto
- Tratado
- Filosofia
- Ciência
- Cultura
- Didática
- Matemática
- Língua e literatura
- Geografia
- História
- Gramática
- Física
- Química
- Biologia
- Música
- Ginástica
- Esporte
F. Como se estuda e se ensina?
- Estudar
- Planejamento
- Programa
- Conteúdo
- Estratégia
- Atividade
- Aula
- Esquema
- Projeto
- Tese
- Palestra
- Dissertação
- Exercício
- Prática
- Esboço
- Rascunho
- Tema
- Problema
- Prova
- Lição
- Avaliação
- Exame
- Curso
- Oficina
- Seminário
- Congresso
- Conferência
- Jornada
- Caderno
- Pasta
- Livro
- Lápis
G. Por que e para que se estuda?
- Conhecer
- Gnose
- Aprender
- Compreender
- Saber
- Assimilar
- Entender
- Pensar
- Julgar
- Criticar
- Ignorar
- Encontrar
- Discernir
- Decifrar
- Opinar
- Considerar
- Penetrar
- Conceber
- Intuir
Ficha técnica do livro:
- Título: Oculto nas palavras: dicionário etimológico para ensinar e aprender
- Autor: Luis A. Castello e Claudia T. Mársico
- Gênero: Paradidático
- Produção: Editora Autêntica
Publicado em 18/12/2007
Publicado em 18 de dezembro de 2007
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