Este trabalho foi recuperado de uma versão anterior da revista Educação Pública. Por isso, talvez você encontre nele algum problema de formatação ou links defeituosos. Se for o caso, por favor, escreva para nosso email (educacaopublica@cecierj.edu.br) para providenciarmos o reparo.

Escola, para quê?

Denise Vilardo

Professora

Fiquei com vergonha.

O suplemento Megazine, de O Globo, de 17/04/2007 publica uma matéria de duas páginas falando de como os indígenas estão utilizando a internet, tanto para se comunicar, divulgar sua cultura, como para aprender espanhol, por exemplo; mostrando como homens e mulheres podem se beneficiar da tecnologia dos computadores, lembrando a ideia primordial de que toda tecnologia é criada para servir ao ser humano.

Em seguida, somos nocauteados com uma reportagem que conta como alguns colégios particulares aqui da cidade do Rio de Janeiro estão preparando meninos e meninas do Ensino Fundamental para o vestibular! Com testes simulados aos sábados, para já irem treinando... Desde a quinta série!

É a instituição escolar torturando cada vez mais cedo!

O que é isso, professores???

Como é que pessoas teoricamente preparadas para lidar com crianças e jovens nas escolas conseguem defender essa ideia? O que está acontecendo? Perdemos completamente a razão? Estamos esquecidos do nosso papel de educadores? O papel da escola se resume a isso? Preparar para o vestibular? Quer dizer que o certo, que a coisa boa a se fazer é adestrar nossos jovens cada vez mais cedo?

Ou seja, ao invés de combater um sistema que é injusto, incoerente e massacrante, nós o fortalecemos, com a desculpa de que estamos preparando os jovens. Não acredito que professores comprometidos com o exercício da cidadania de seus alunos, preocupados com a formação de pessoas de bom caráter, interessados em construir conhecimento e autonomia com esses jovens concordem com esse esquema de trabalho.

Que equívoco, professores, que equívoco!

Será que nem os resultados do Enem fazem os professores perceberem que esse esquema não dá certo? O Enem pressupõe que os alunos estejam aprendendo a pensar, estejam articulando conhecimentos de áreas variadas e que saibam criar argumentos para defender suas ideias através da linguagem escrita.

A UERJ e a UFRJ – cada uma a seu modo - também esperam alunos pensantes, que escrevam com desenvoltura – e não alunos que decorem esquemas e técnicas.

E o que se faz é tentar enquadrar isso num modelito que sirva para todos, criando turmas especialmente adestradas para responder a questões supostamente pré-formatadas.

E, por favor, não me venham com a história de que estamos atendendo aos anseios dos pais ou que estamos preparando para o futuro.

Escola não é curso preparatório! Escola não é lugar para manutenção e confirmação do que não é bom. Escola não pode ser excludente.

Nós, educadores, somos responsáveis pelo debate e pelo esclarecimento pedagógico do que deve ser feito na escola. E escola é lugar de formar gente em suas potencialidades e diferenças.

Escola é lugar de compreender e aprender para o mundo que estamos vivendo agora, e não para um futuro que sequer sabemos qual será.

Escola é lugar de pensar alternativas para melhorar o que não está bom, de aprender a lutar pelo bem-estar coletivo.

Escola é lugar de formar pessoas para respeitarem-se, para serem solidárias, justas e dignas.

Escola é lugar de ampliar e produzir conhecimentos. É lugar de transformação.

E se a sociedade está do jeitinho que está, cheia de gente sabida e esperta, que só sabe “levar vantagem em tudo", é porque temos formado gerações e gerações sem nos preocupar com as transformações necessárias, preocupados que somos com a manutenção de uma coletividade perversa, que já se mostrou suficientemente incapaz de acolher os verdadeiros valores da vida humana.

Os grandes pensadores-educadores deste país, que pensaram uma escola que dignificasse o ser humano, como Paulo Freire e Darcy Ribeiro, devem estar se revirando no túmulo.

Se os colegas não considerarem nada disso como relevante, que pensem em suas vidas de estudante e lembrem-se da tortura das "semanas de provas", da angústia e da ansiedade que elas causavam e, pelo menos, reflitam sobre os motivos de estarmos até hoje reproduzindo essa situação e, pior, antecipando nas vidas de nossos alunos esses momentos doentios.

Convenhamos, isso não faz bem a ninguém.

Onde estão os educadores desta cidade? Por favor, apresentem-se, para eu não morrer de vergonha.

Publicado em 25 de março de 2008.

Publicado em 25 de março de 2008

Novidades por e-mail

Para receber nossas atualizações semanais, basta você se inscrever em nosso mailing

Este artigo ainda não recebeu nenhum comentário

Deixe seu comentário

Este artigo e os seus comentários não refletem necessariamente a opinião da revista Educação Pública ou da Fundação Cecierj.