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A lenda do condutor de bigas

Henryane de Chaponay

A lenda do condutor de bigas

Delfos e seu museu

Delfos tem a marca de todo seu antigo esplendor!

Delfos, cujas ruínas gloriosas brotam do solo dos montes selvagens!

Colunas que se lançam em direção ao céu da Grécia!

Pistas dos estádios que viram correr os jovens atletas de formas perfeitas, os jeitosos laçadores de javalis, os graciosos lançadores de discos, cheios de vigor!

Hipódromo onde as corridas de bigas faziam tremer o solo!

Templo que recebeu as ricas oferendas dos navegadores e dos poderosos reis que vinham de bem longe!

Caverna onde as pitonisas pronunciavam seus oráculos que faziam tremer ou tranquilizavam os corações dos grandes patriotas gregos!

Delfos, que viu Orestes, viu os filhos de Hércules e grandes heróis que nos legaram tradições milenares!

Delfos, enfim, onde as montanhas de neves eternas e mar tempestuoso vêm adorar Apolo e guardam, com ciúmes, seu santuário!

Delfos, onde o ar é puro, vivificante, e nos lava a alma de suas preocupações e suas tristezas!

As nações e os impérios sofreram, no decorrer dos séculos, tormentos terríveis; guerras sangrentas ceifaram a juventude generosa, a civilização se desenvolveu, os corações se degradaram, as almas se materializaram.

Mas Delfos permanece Delfos, não sofreu nenhuma transformação; os séculos colocaram musgo nas pedras duras; a natureza, pouco a pouco, destruiu a pequena obra humana, mas a alma grega ficou, mais do que um qualquer outra parte da península helênica.

Ela ficou como antigamente, pura e espiritualizada.

É esse ar fortificante que inspira os grandes filósofos e os grandes pensadores, os arquitetos e os pintores e guia os formões dos escultores.

O pequeno Museu de Delfos conserva uma obra-prima da arte grega: o famoso vencedor das corridas de bigas, cuja estátua de bronze, esverdeada pela idade, é de uma nobreza extraordinária e cujos olhos esmaltados perturbam ainda pelo olhar claro e orgulhoso.

Ninguém conhece a história do jovem condutor de biga e sua vida é um mistério...

É noite, o museu está fechado e o guarda do precioso tesouro levou a chave.

Tudo é sombrio, e somente um raio de luz da lua, entrando por uma janela quebrada, clareia misteriosamente a grande estátua do condutor invencível.

Os ratos, despreocupados, sobem ao longo das pernas das belas moças de mármore, de corpos esbeltos e graciosos; exploram suas costas e as cabeças dos jovens atletas, remexendo suas barbas, ó inconvenientes!

Ó Zeus, o rei dos deuses, o deus dos deuses, aquele cuja cólera faz tremer os morros e dispara os elementos!

De repente, aterrorizados, eles fogem, rápidos como um raio, em direção aos seus ninhos; um segundo mais tarde, só aparecem seus pequenos focinhos pontudos, com longos bigodes. É que lhes pareceu que a estátua de bronze havia se mexido!

E, com efeito, lenta e dignamente, ele desce de seu pedestal e, por mais uma noite, se torna o verdadeiro condutor de biga. Diante dele, as paredes se abrem e ele desaparece lentamente diante dos olhos estupefatos dos ratos. Vai primeiro ao templo de Apolo fazer uma oferenda ao deus da luz, como antigamente antes dos jogos délficos.

Em sua passagem, os sapos o saúdam: croac, croac, croac...

"Salve, Hipólito, filho de Histape! Salve, ó vencedor! Eis que vens a nós para uma noite". Croac, croac, croac...

Uma avó-sapo velha, bem velha, o saúda com uma voz tremida: "Ó Hipólito, te ver mais uma vez alegra minha velhice, sou a única aqui que te conhece. Lembras? Há cem anos, a pequena que saltou sobre teus joelhos e que tiraste delicadamente de teu caminho? Era eu, Hipólito, salve, ó vencedor, salve ó filho de Histape! Sobre ti, as bênçãos de Zeus!"

Um vago sorriso surge em seus lábios ao escutar as palavras da velha sapa encarquilhada.

Uma morcega rapidamente toca sua face, dizendo-lhe na orelha: "Salve, ó Hipólito!" Depois, silenciosa como veio, ela se afasta para levar a pontos distantes a mensagem dessa noite de festa: "a glória de Delfos, o triunfante condutor de biga retornou para nosso meio por essa noite! Alerta, amigos, venham ver a sublime corrida, voem até a pista hípica." "Ó! Ó! Ó!", respondem as corujas.

E na noite calma as grandes asas escuras se abrem e batem.

A lua se olha no mar, e sua imagem tão calma se reflete ao longe sobre as ondas. E, nesta noite límpida, sob o misterioso luar, o condutor de biga desce ao vale, em uma caminhada prazerosa, sem hesitar sobre o caminho que vai seguir, leve como um jovem deus.

Seus traços puros, jovens e vigorosos - ele morreu na força de sua idade - parecem feitos de matéria irreal; seus cabelos castanhos, iluminados pela lua, o tornam mais misterioso ainda.

Seus olhos, seus olhos, que têm a cor do mar em fúria, banhados pelo maravilhoso sorriso de Ártemis, parecem pedras de jade vivo. Eles vivem, os seus olhos, são a única coisa que realmente vive nesse ser irreal. Assim, eles são mais desconcertantes ainda, pois eles viram a Grécia antiga.

Traduzido por Lourdes Grzybowski

Publicado em 29 de abril de 2008.

Publicado em 29 de abril de 2008

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