Este trabalho foi recuperado de uma versão anterior da revista Educação Pública. Por isso, talvez você encontre nele algum problema de formatação ou links defeituosos. Se for o caso, por favor, escreva para nosso email (educacaopublica@cecierj.edu.br) para providenciarmos o reparo.

Nélida Piñon fala sobre a obra de Machado na abertura de mostra na ABL

Alexandre Alves

Machado 100

No dia 26 de junho, foi inaugurada na Academia Brasileira de Letras a exposição Machado Vive!, reunindo objetos de e sobre Machado de Assis, como alguns manuscritos, móveis, primeiras edições de suas obras. “Se esta é a casa da memória, nada mais justo do que renovar as lembranças de um dos maiores de nossos escritores”, afirmou Cicero Sandroni, presidente da ABL, ao dar início à sessão solene, que contou com a presença do governador Sérgio Cabral Filho e do ministro Eros Grau, do STF.

A abertura foi feita pela escritora Nélida Piñon, em um emocionado texto sobre “o brasileiro Machado de Assis”. Nele ela relembra que, filha de espanhol, ganhou do pai comerciante a melhor sugestão: “leia Machado de Assis”. Para uma sala lotada no Petit Trianon – a sede da ABL –, recheada de personalidades, autoridades e intelectuais, a acadêmica desfiava suas ideias e recordações sobre o Bruxo do Cosme Velho.

Falou sobre a vida escassamente faustosa que ele levava: “quanto à sua vida e a seu processo de criação, resta-nos especular”, pois pouco se sabe de uma vida particular completamente reservada. Ainda assim, a modernidade de sua obra faz com que “seguimos sendo filhos de Machado”. Já que não deixou sucessores diretos, legou a nós, seus leitores e conterrâneos, sua obra. Mais que isso: Nélida afirma que “Machado é minha pátria, é a pátria que tenho no coração”; e mais: “certamente sou melhor brasileira e escritora graças a ele”.

Para a escritora, Machado elegeu o “Rio de Janeiro metáfora do Brasil”, e na então capital retratada em suas obras estão o jogo do poder, o egoísmo, a vaidade, as ambiguidades, as versões múltiplas, sem imposições canônicas e sem ingenuidade; o Bruxo do Cosme Velho “lanceta a hierarquia social vigente e faz sangrar personagens” com os quais nos identificamos. Ele “engendra uma tipologia de concepção acanhada, cruel, complexa e dúbia, própria da obra de arte”. A acadêmica, então, pergunta: “quantas terras somos em uma terra única?” Somos um povo que reúne o deus único dos europeus com os deuses dos índios e aqueles trazidos pelos negros, que faz a língua portuguesa sofrer uma metamorfose imposta pela miscigenação?

Vale repetir a proposta que Nélida faz num dos trechos mais marcantes do discurso: “O Brasil tem-se equivocado ao não incluir o nome de Machado de Assis entre os seus notáveis intérpretes. De não reconhecer no autor uma transcendência analítica que instaura a modernidade no projeto nacional. Como se a intelectualidade brasileira tivesse escrúpulos em aceitar que a invenção literária, em sua fulgurante expressão, tem caráter interpretativo, assertivo, analógico, havendo sido sempre a plataforma da qual examinar, exumar, reconstruir o horizonte do Brasil”.

E ela conclui: “Se Machado de Assis existiu, o Brasil é possível”.

Leia a íntegra do discurso de Nélida Piñon.

Publicado em 08 de julho de 2008.

Publicado em 08 de julho de 2008

Novidades por e-mail

Para receber nossas atualizações semanais, basta você se inscrever em nosso mailing

Este artigo ainda não recebeu nenhum comentário

Deixe seu comentário

Este artigo e os seus comentários não refletem necessariamente a opinião da revista Educação Pública ou da Fundação Cecierj.