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Alfonso Reyes (1889-1959)

Cláudia Dias Sampaio

Tradução de Cláudia Dias Sampaio

Diálogos Poéticos

O poeta mexicano Alfonso Reyes teve uma intensa atuação intelectual tanto no México quanto no Brasil. Viveu por aqui durante os anos 30, quando ocupou o cargo de Embaixador do México no Brasil. Conviveu com artistas e intelectuais brasileiros como Manuel Bandeira, Cecília Meireles e Ribeiro Couto.

No Rio de Janeiro, publicou Monterrey, correo literário de Alfonso Reyes, importante fonte de discussão entre intelectuais brasileiros e estrangeiros. A dedicação de Reyes em mostrar ao Brasil a cultura de seu povo incentivou e enriqueceu o diálogo entre Brasil e México.
E para compartilhar dessa iniciativa, oferecemos a vocês uma tradução do poema “Yerbas del Tarahumara”, escrito em 1934.

Os índios Tarahumara descendem dos Astecas e dos índios mexicanos e norte-americanos. Últimos sobreviventes da cultura mesoamericana pré-hispânica, amantes do silêncio e donos de um idioma próprio, o rarámuri, vivem em cavernas nas montanhas de Sierra Madre Ocidental e são conhecidos como “os que caminham bem”.

Ervas de Tarahumara

Alfonso Reyes

Desceram os índios Tarahumaras,
sinal de mal ano
e de colheita pobre na montanha.
Nus e curtidos,
duros na lustrosa pele manchada,
denegridos de vento e de sol, animam
as ruas de Chihuahua,
lentos e receosos,
com todos os impulsos do medo contraídos,
como panteras mansas.

Nus e curtidos,
bravos habitantes da neve
– como falam de você –,
respondem sempre assim a pergunta obrigatória:
– E você? não sente frio no rosto?

Mal ano na montanha,
quando o grave degelo dos cumes
escorre até a cidade a multidão
de animais humanos com a casa nas costas.

Católicos os fizeram
os missionários da Nova Espanha
– esses cordeiros com coração de leão.
E, sem pão e sem vinho,
eles celebram o destino cristão
com sua cerveja-chicha e seu pinole,
uma pitada de todos os sabores.

Bebem tesguiño de milho e peyote,
erva dos prodigiosos,
sinfonia perdida
que converte ruídos em cores;
longo porre metafísico
os compensa de andar sobre a terra,
alvo e desfecho
da dor comum da raça humana.
Campeões da Maratona do mundo,
nutridos na carne ácida do cervo,
chegarão os primeiros com triunfo
no dia em que transcendermos a muralha
dos cinco sentidos.
 
Às vezes, trazem ouro de suas ocultas minas,
e todo o dia rompem territórios,
sentados nas ruas,
entre a inveja culta dos brancos.
Hoje só trazem ervas em suas sacolas,
ervas da saúde que trocam por centavos:
yerbaniz, limoncillo, simonillo,
que aliviam as dificuldades das entranhas,
junto com a orelha de rato
para o mal a que chamam “bílis”,
erva do veado, do chuchupaste
erva do índio, que restauram o sangue;
dos golpes da grama do ocotillo
contraerva para as febres pantanosas,
erva da víbora que cura resfriados;
colares de sementes de olhos de veado,
tão eficazes para o sortilégio;
e o sangue do gado, que aperta as gengivas
e agarra no nariz os dentes frouxos.

(Nosso Francisco Hernández
– O Plinio Mexicano dos mil e quinhentos –
logrou até mil e duzentas plantas mágicas
da farmacopeia dos índios.
Sem ser um grande botânico,
dom Felipe Segundo
soube gastar setenta mil ducados,
para que logo aquele herbário único
se perdesse na incúria e na poeira! 
Porque o pai Moxó nos assegura
que não foi culpa do incêndio
que no século décimo sétimo
aconteceu em El Escorial.)

Com paciência muda de formiga,
os índios vão juntando sobre o solo
feixes de ervas – perfeitos em sua ciência natural.

Yerbas Del Tarahumara

Alfonso Reyes



Han bajado los indios tarahumaras,
que es señal de mal año
y de cosecha pobre en la montaña.
Desnudos y curtidos,
duros en la lustrosa piel manchada,
denegridos de viento y de sol, animan
las calles de Chihuahua,
lentos y recelosos,
con todos los resortes del miedo contraídos,
como panteras mansas.

Desnudos y curtidos,
bravos habitadores de la nieve
-como hablan de tú-,
contestan siempre así la pregunta obligada:
-"Y tu ¿no tienes frío en la cara?

Mal año en la montaña,
cuando el grave deshielo de las cumbres
escurre hasta los pueblos la manada
de animales humanos con el hato e la espalda.

Los hicieron católicos
los misioneros de la Nueva España
-esos corderos de corazón de león.
Y, sin pan y sin vino,
ellos celebran la función cristiana
con su cerveza-chicha y su pinole,
que es un polvo de todos los sabores.

Beben tesguiño de maíz y peyote,
yerba de los portentos,
sinfonía lograda
que convierte los ruidos en colores;
y larga borrachera metafísica
los compensa de andar sobre la tierra,
que es, al fin y a la postre,
la dolencia común de las razas de los hombres.
Campeones de la Maratón del mundo,
nutridos en la carne ácida del venado,
llegarán los primeros con el triunfo
el día que saltemos la muralla
de los cinco sentidos.

A veces, traen oro de sus ocultas minas,
y todo el día rompen los terrones,
sentados en la calle,
entre la envidia culta de los blancos.
Hoy solo traen yerbas en el hato,
las yerbas de salud que cambian por centavos:
yerbaniz, limoncillo, simonillo,
que alivian las difíciles entrañas,
junto con la orejela de ratón
para el mal que la gente llama "bilis";
y la yerba del venado, del chuchupaste
y la yerba del indio, que restauran la sangre;
el pasto de ocotillo de los golpes contusos,
contrayerba para las fiebres pantanosas,
la yerba de la víbora que cura los resfríos;
collares de semillas de ojos de venado,
tan eficaces para el sortilegio;
y la sangre de grado, que aprieta las encías
y agarra en la nariz los dientes flojos.

(Nuestro Francisco Hernández
-El Plinio Mexicano de los Mil y Quinientos-
logró hasta mil doscientas plantas mágicas
de la farmacopea de los indios.
Sin ser un gran botánico,
don Felipe Segundo
supo gastar setenta mil ducados,
¡para que luego aquel herbario único
se perdiera en la incuria y el polvo!
Porque el padre Moxó nos asegura
que no fue culpa del incendio
que en el siglo décimo séptimo
aconteció en El Escorial.)

Con la paciencia muda de la hormiga,
los indios van juntando sobre el suelo
la yerbecita en haces
-perfectos en su ciencia natural.


Para saber mais sobre o poeta, acesse: http://www.alfonsoreyes.org/

Publicado em 29 de julho de 2008

Publicado em 29 de julho de 2008

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