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A cebola a dialética o cozinheiro

Luis Estrela de Matos

Dentro de você,
como premissa, é claro,
tem um dentro
onde tem uma ideia
de dentro
para alojar a ideia
de que você tem um centro
e agora são dois
ou você ou a ideia,
que isto se complica,
pois precisaríamos de uma soma
dois é número falso
(aliás, o infinito é uma grande mentira...)
Esse dentro, continuemos,

Coisa interna,
Interno porque tem um externo
interno, uterino, alma, intestino, cérebro, talvez lugar
onde se imagina existir,
pois que por fora,
desejando por oposição, o dentro,
complementar se necessário for, quem sabe,
vive-se a casca,
mas não uma casca qualquer,
a casca enquanto casa,
dialética antes das paredes,
antes das tintas,
antes do pincel nas latas,
antes da mão no pincel,
antes do olho na mão;
sem medo de dizer,

de escrever, corrijo-me,
antes da escolha,
essa casca, essa casa,
em suma: uma cebola
lágrimas sem centro
respingando o real afiado
gume de sensações entre dedos e faca
de um cozinheiro em sua verdade:
e a fantasia da cebola
como sonho de núcleo;
isso não pode estar assim,
assim,
em nenhum lugar
e você fica meio tonto
lacrimejante, pela cebola,
esperando que o cozinheiro fosse real
esperando que, pelo menos,

houvesse uma casa,
com tinta nas paredes
e um resto (réstia seria literário) de sol
esperando que houvesse uma esperança
de o dentro ser o interno do fora
e de o fora permitir a vida do dentro
e agora as linhas vão findando
e o assunto extermina-se
como se extermina tudo que vive
você precisa ficar sem,
sem lugar, sem cebola,
sem o maldito cozinheiro
você precisa entender
que não há lugar
não para você
nem para quem escreve.

No término, o seguinte:
Esqueça tudo
E não esqueça de esquecer você
E isto seria um começo
Um grande começo
posto que começaria, entende,
sem você;
Começar é melhor, acredite,
melhor que dentro e fora
melhor do que casa com cebolas
e cozinheiro entre faca e dedos.

Melhor ainda que a dialética.

Pubicado em 28/10/08

Publicado em 28 de outubro de 2008

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