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Educação sem culpa

Claudia Sampaio

O atraente título (La faute à Fidel!)sugere tratar-se de um filme sobre política. Mas a riqueza da história da pequena Anna (Nina Kervel), que vê sua vida transformada pelo repentino engajamento político dos pais, Marie (Julie Depardieu) e Fernando (Steffano Accorsi), está justamente no fato de a cineasta Julie Gavras voltar sua lente para algo mais amplo que uma possível ode aos barbudos comunistas: a complexidade do humano, exposta na relação entre pais e filhos.

Talvez seja isso, aliado à inteligente mistura de leveza e gravidade, que torne o filme imperdível para aqueles que se interessam pelo aspecto constituinte dessa relação: a educação. O sentido original da palavra, do latim educare - "conduzir para fora", ou seja, preparar o indivíduo para o mundo -, está em perfeita conexão com o filme. O que o espectador assiste é ao desabrochar de Anna, que pelas circunstâncias é obrigada a abandonar a plácida vida de princesa apresentada nos primeiros fotogramas para ganhar o mundo, tanto pelo contato com o estrangeiro, no troca-troca de babás (uma chilena, outra vietnamita e uma terceira, grega), quanto pela descoberta de que a vida é de fato bem mais complexa do que as histórias de princesas, que eram suas favoritas.

Educação passiva

Assinar um manifesto em prol do aborto, apesar de nunca ter feito um, é uma prova de solidariedade? Essa é uma das questões que Anna lança a seus pais em meio à crise familiar instaurada pela decisão da mãe de solidarizar-se com as mulheres que deram depoimentos para seu livro a favor do aborto. Do seu cantinho preferido, no pequeno apartamento onde a família passou a viver após os pais romperem com suas origens burguesas, ela ouve a confissões de mulheres que já se submeteram ao aborto. Essa é uma das cenas que retratam o que Julie Gavras chama de educação passiva e expõe o equilíbrio delicado entre limite e abertura. Anna participa de muitas coisas sem que necessariamente os pais saibam.

O filme se passa em Paris, no início dos anos 1970, período marcado por fortes mudanças no panorama político mundial. Julie Gavras, filha do cineasta Costa Gavras, escreveu o roteiro a partir do original italiano de Domitilla Calamal; a apresentação dessa educação passiva de sua personagem é um reflexo do que viveu a própria cineasta, que convivia com as interrogações provocadas pelos filmes do próprio pai, como Missing - Desaparecido, que mostra o drama dos perseguidos pela ditadura militar no Chile implantada em 1973.

A ideia dessa educação que a criança adquire como observadora, como testemunha dos acontecimentos que se sucedem em seu ambiente familiar, é desenvolvida pela cineasta em um "dossiê pedagógico". Na França, onde vive Julie, é tradição o cinema como instrumento pedagógico. Além do dossiê de A culpa é do Fidel, o site www.zerodeconduite.net apresenta, em francês, vários outros títulos com orientações ligadas às disciplinas que podem ser trabalhadas a partir dos filmes, como Filosofia, História, Geografia e Educação Artística. Essa iniciativa ainda não é uma tradição no Brasil, mas projetos como o Curta na escola e Escola no cinema indicam a potência do diálogo entre cinema e educação.

Ficha técnica do filme:

  • Título: A culpa é do Fidel
  • Direção: Julie Gavras
  • Gênero: Drama
  • Produção: Itália/França, 2006

Publicado em 4/3/2008

Publicado em 04 de março de 2008

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