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A ética através dos tempos

Mariana Cruz

Somos livres. A liberdade é a nossa maior qualidade e o nosso maior perigo. Liberdade significa responsabilidade. Nossa liberdade pode tanto ser usada para o bem quanto para o mal. Palavras abstratas como liberdade, pensamento e alma, de acordo com o uso, podem se equivaler. Ao dizer que o pensamento é livre, pode-se fazer o que bem entender. Daí ser a liberdade a mais suprema e a mais perigosa qualidade humana. O uso da liberdade tanto gerou santos – como São Francisco de Assis – quanto carrascos – como Adolf Hitler. A liberdade é antes de tudo composta por escolhas, sejam elas pessoais ou sociais. Não é concebível um ser humano para si. Nascemos para alguém, seja pelo casamento, pela liderança, para participar da vida política. A liberdade é para coisas grandes, nasceu para elas. A liberdade não é um direito decretado, a pessoa é livre porque é.

Com a liberdade se podem construir todos os tratados de ética. De acordo com a ética, todo agir humano significa chegar a um fim, e esse fim é um bem. A ética é a orientação da liberdade para o lado do bem. A ética abrange todos os setores da vida humana.

O universo inteiro faz parte do quadro da ética. A ética nasce sempre. Não é à toa que está presente em todas as épocas: há uma ética grega, uma ética medieval, uma ética moderna, uma ética contemporânea. A ética, por vezes, tenta tornar todos os homens iguais, porém há diversas desigualdades impossíveis de serem aplainadas; apesar de tais diferenças, não se pode deixar ninguém ser vítima de injustiças; para isso deve existir na sociedade uma organização, para que todos tenham condição de dignidade.

A ética aristotélica estava baseada no telos, na finalidade da vida do homem, que era ser feliz. A felicidade, porém, estava bem distante daquela almejada por alguns homens que pensam encontrá-la nos prazeres sensíveis. Aristóteles considera que, ao pensar assim, o homem se iguala ao animal. Há ainda os que tentam encontrar a felicidade na riqueza ou no poder político. A felicidade, segundo o estagirita, está no equilibro, no exercício da virtude.

Antes de Aristóteles, Platão já tinha uma concepção ética: falava da superioridade da ideia de justiça. Considerava que conceitos como justiça, bem e virtude eram provenientes do mundo das ideias e eram contemplados pelos homens antes de chegarem ao mundo sensível, isto é, ao mundo da vida. Assim, ao depararem com tais coisas neste mundo, reconhecem-nas.

Para o mestre de Platão, Sócrates, o bem é aquilo que nos constrói, aquilo que faz bem a mim e faz bem ao outro ao mesmo tempo, o que ajuda a construir nossa personalidade (amizade etc.). O mal é o que nos prejudica, explora, o que tira o que nós temos.

Entre os filósofos medievais, Santo Agostinho será, juntamente com São Tomás de Aquino, um dos principais nomes a tratar das questões éticas. O filosofo afirma que sem Deus não se pode ser virtuoso. A verdade está em Deus, mas não em um Deus que se encontra na transcendência, e sim naquele de que está dentro de nós. A miséria humana ocorre porque o homem não se contém na vida moral. Ele considera que todas as coisas foram criadas por Deus; assim se Ele não tiver as mãos em cima de nós, nos danamos.

Não podemos aderir afetivamente às coisas, isto é, podemos admirá-las apenas enquanto criaturas de Deus. O erro está em admirá-las como se elas dissessem respeito a nós, pois a adesão afetiva não é boa. Não devemos usar as coisas de Deus afetivamente, basta tê-Lo na vida. Agostinho valoriza o conceito de providência, na medida em que considera que Deus nos provê de tudo. Por isso, devemos apenas fruir do amor divino e nada mais. Os homens, porém, invertem as coisas: eles fruem das coisas, dos poderes, das riquezas e se esquecem de fruir do amor divino. Há, assim, uma tríplice tentação formada por soberba, dinheiro e sexo – elementos marcados pela transitoriedade. O cristão deve buscar os valores eternos, como a justiça, a fraternidade, o equilíbrio, e aliar-se a eles, a fim de superar as tribulações e alcançar a meta última: Deus. O homem deve sempre buscar ser o que é e desdobrar os melhores dotes que tem. Para o filósofo medieval, a lei da natureza é um espelho de uma lei maior, que é a lei eterna, ou seja, Deus. A lei eterna é a lei que manda respeitar a ordem e a proíbe transgredi-la.

Na Idade Moderna, Kant liberta a filosofia do peso cristão, com o imperativo categórico (“Age somente segundo uma máxima tal que possas querer ao mesmo tempo que se torne lei universal”). Através dele, cabe ao próprio homem impor a lei moral a si mesmo: sic volo, sic jubeo (assim eu quero, assim eu ordeno). Trata-se de uma ética solipsista, só para mim.

Na ética contemporânea, a ética passa a ser uma relação entre as pessoas, há reciprocidade; diferentemente das anteriores, ela não vem de Deus, da religião ou do homem isolado. Ela vem de grandes acertos, em formas de discursos, diálogos, consentimentos; daí os acordos, tratados, fóruns de discussão entre nações serem cada vez mais frequentes. Deve-se encontrar, através dos diálogos, um princípio de universalização de comportamento.

Afinal, é conversando que a gente se entende.

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Publicado em 02 de junho de 2009.

Publicado em 02 de junho de 2009

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