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Ruth Rocha fala a pais, crianças e professores na Flipinha 2009
Juliana Carvalho
Redatora e professora
Socióloga, orientadora educacional, editora, redatora e ex-diretora da divisão de produtos infanto-juvenis da Editora Abril, Ruth Rocha dispensa apresentações. Uma das nossas mais importantes escritoras de livros infantis, muito tem ajudado a nós, professores, no ofício de despertar nas crianças o gosto pela leitura. Ganhou os maiores prêmios brasileiros destinados à literatura infantil da Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil, da Câmara Brasileira do Livro, cinco Prêmios Jabuti, prêmios da Associação Paulista de Críticos de Arte e da Academia Brasileira de Letras, entre outros. Seu livro mais conhecido é “Marcelo, Marmelo, Martelo”, que já vendeu mais de 1 milhão de cópias. Neste artigo, não pretendo falar de sua biografia, dos 40 anos em que escreve para crianças nem de seus mais de 130 títulos publicados, que serão reeditados e relançados pela Editora Moderna agrupados em coleções. Essas informações estão disponíveis na internet e podem ser encontradas facilmente. Vou tentar, aqui, contar um pouco da experiência que essa escritora dividiu conosco em sua apresentação na Flipinha – a versão para crianças da FLIP (Festa Literária Internacional de Paraty) no sábado, dia 4/7, num encontro mediado pela também escritora Bia Hetzel.
Ruth, respondendo à pergunta de uma das muitas crianças presentes, contou que aprendeu a gostar de ler com gibis e que sua família tinha uma conta no jornaleiro próximo que permitia que ela pegasse o que quisesse. Como na época ler gibis não era bem visto pelos pais nem pela escola, os amigos de Ruth reuniam-se em sua casa para ler as revistinhas. E aí começou a paixão pela literatura.
Outra criança perguntou como a escritora tem suas ideias. Ela lembrou que essa é uma pergunta recorrente; disse que as ideias saem da cabeça. Imediatamente as crianças perguntaram como elas entram na cabeça. A autora explicou que as ideias entram na cabeça com a leitura: lendo coisas fáceis, difíceis, coisas que a gente gosta, vendo filmes e peças... “Os escritores prestam atenção em como as pessoas se sentem. Eles veem isso nos livros, nas conversas, nas ruas... Assim conseguem construir personagens que vejam e sintam coisas importantes”, contou Ruth, profunda conhecedora das crianças.
Um dos pontos altos da conversa foi quando uma professora quis saber da autora o que é essencial para que uma pessoa se torne leitora. Ruth falou sobre as crianças com muita propriedade. Ela disse que os pais devem conversar com seus filhos e os professores devem conversar com seus alunos. A conversa desenvolve as ideias. Indagada se tem mudado sua forma de escrever para se adaptar às novas gerações, ela revelou que não. Mas lembra que, ao contrário das gerações passadas, as crianças hoje têm mais voz. Os pais dão atenção às palavras dos filhos e isso desenvolve as crianças. Temos a impressão de que as crianças de hoje são mais desenvolvidas do que as crianças de gerações passadas e, para ela, isso não é apenas uma impressão.
Para Ruth, pais e professores devem prestar atenção aos mínimos detalhes perceptíveis nas crianças. Antes de ler bem, as crianças devem falar muito e bem, conversar, ouvir bem. Ela aconselha aos professores que ouçam seus alunos e corrijam todas as palavras pronunciadas, para que tenham uma ótima formação na língua portuguesa. Muito importante também são os aspectos físicos. A criança deve estar saudável, pais e professores devem estar atentos a problemas de audição, concentração, dislexia e outras enfermidades que possam influenciar o desenvolvimento da criança.
A alfabetização é outro fator muito importante para a formação de um bom leitor. Devemos pedir que as crianças leiam e verificar se estão lendo bem e pronunciando as palavras corretamente.
Ela lembrou que criança adora brincar de “gente grande” e, se ela enxergar seus pais e família lendo com prazer, certamente vai querer imitá-los. Também pediu que façamos as crianças brincar ouvindo versos ou cantigas de roda e que estimulemos tudo que faça a criança ouvir e falar.
O próximo assunto foi a sociedade e os estímulos às crianças. Ruth lembrou que, para desenvolver-se bem, a criança deve ter sossego e viver em um ambiente tranquilo. Para a escritora, a sociedade de hoje está muito estressante, dolorida, com estímulos fortes e violentos, e as crianças são delicadas. Se elas recebem esses estímulos, ficam menos aguçadas em sua sensibilidade, o sistema nervoso torna-se grosseiro e menos atento aos detalhes. A criança vai se acostumando a esses estímulos e passa a ver o mundo mais superficialmente.
A escritora acredita no potencial da internet, mas pede que pais e professores sejam atentos aos conteúdos pesquisados. Ela aconselha o uso com cuidado e monitorado, principalmente em casa, observando que a casa é dos adultos e das crianças também.
No momento seguinte, Ruth falou especialmente aos professores: “a criança tem um desenvolvimento paulatino. Não adianta pensar que ela vai aprender a ler ou se tornar uma leitora proficiente de um dia para o outro. Os livros utilizados em sala de aula devem estar à altura da compreensão das crianças. Devem ser selecionados livros condizentes com suas faixas etárias, com temas diversos, que elas compreendam e gostem. Não concordo em fazer crianças de 10 anos ler clássicos. Isso já está ultrapassado; hoje em dia sabemos que eles não são bem aceitos por elas”.
Ruth também falou sobre a importância das bibliotecas: “todas as cidades deveriam ter uma biblioteca, e isso deveria ser fiscalizado. Fico chateada quando ouço professores pedindo que as pessoas doem os livros de que não gostam para que se possa montar uma biblioteca. Ora, se elas não gostaram, provavelmente os próximos leitores também não vão gostar. Para desenvolver nas crianças o gosto pela leitura, elas deveriam mandar os livros que mais amam!”
Ruth Rocha encerrou o encontro falando sobre o que devemos ensinar para as crianças hoje em dia: “Devemos ensinar respeito, disciplina, verdade, justiça, dar carinho, amor, compreensão. Dar dedicação total, cuidando da saúde, da felicidade e da alegria. Educar é tentar fazer uma pessoa feliz. Para ser feliz, é necessário disciplina, respeito pelos outros para ser respeitado, acreditar na verdade, receber e acreditar na justiça. A educação é uma luta pela civilização da criança. É isso que tento colocar nos meus livros”.
Leia também: Literatura de Cordel para crianças é tema da Flipinha
Publicado em 07 de julho de 2009
Publicado em 07 de julho de 2009
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