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A importância dos trabalhos em grupo na escola

Mariana Cruz

Agora com uma filha pequena, minhas leituras adultas foram deixadas um pouco de lado, substituídas pelas historinhas, músicas e filmes infantis. E não é que muitos desses meios têm ótimas frases, que são verdadeiras joias de sabedoria? A peça Os Saltimbancos é um bom exemplo disso. Trata-se de um musical de Sergio Bardotti e Luis Enríquez Bacalov, inspirado no conto Os Músicos de Bremen, dos Irmãos Grimm, com versão em português de Chico Buarque.

Apesar de o disco e a peça terem sido lançados há mais de 20 anos, ainda hoje crianças de todas as idades conhecem o texto e cantam suas músicas. É uma obra atemporal que conta a história de quatro animais que se juntam – um burro, um cachorro, uma galinha e uma gata – com o objetivo de virarem artistas, pois em seus lares de origem eram “escravizados” pelos donos (com exceção da gata, que fora expulsa de seu confortável apartamento após uma noite de cantorias com “tantos gatos pela rua”). E conseguem, apesar da diferenças entre eles, permanecer unidos e vencer seus opressores. Pois o “melhor amigo do bicho é o bicho”, diz o burro, ironicamente o mais sábio dentre os quatro. A moral da história é que os bichos, tão indefesos quando isolados, ao unirem suas forças saem vitoriosos. Chegam assim à conclusão de que “todos juntos somos fortes”. Tal frase é também o título de uma das mais bonitas canções da peça, cuja letra diz: “todos juntos somos fortes, somos flecha, somos arco, todos nós no mesmo barco, não há nada para temer”.

Temos realmente muito que aprender com esses bichos. Essa união pela diferença é um exemplo de que quando isso se faz positivamente, sem tentativa de imposição de ideias, de anulação das diferenças, é muito frutífero, isto é, quando a união é feita a partir das múltiplas perspectivas acontecem verdadeiras revoluções, seja no campo da história, das artes, das ciências e tantos outros. O carnaval e as festas juninas, por exemplo, nasceram por influências de outras culturas e foram transformadas por nós, tornando-se hoje verdadeiras expressões nacionais. No pomposo reino das ciências, a presença do espírito coletivo é evidente, mesmo que muitas vezes uma nova ciência surja a partir da superação da anterior. Até quando isso ocorre é preciso que haja compreensão daquela ultrapassada; para que se negue o que foi construído anteriormente é preciso estar inteirado daquilo para criar algo novo. Sempre existe um diálogo.

E na educação, como se dá tal união entre os diferentes? A sala de aula é por si só um todo composto por diferentes partes. A forma mais corriqueira de tentar tornar produtivas tais diversidades e não homogeneizá-las, extinguindo-as, é pelos trabalhos em grupo. O problema é que os alunos muitas vezes não captam a essência dessa profícua experiência. O objetivo de tal dinâmica é que cada um traga suas experiências, suas leituras e, a partir daí, seja feito um texto conjunto e uma apresentação idem, em que todos tenham participado de todas as etapas da feitura do trabalho.

Porém, normalmente o que ocorre na prática é cada componente ficar responsável por uma parte e, na hora da apresentação, juntarem-nas de qualquer maneira, fazendo uma espécie de jogral onde ninguém tem a mínima ideia do que o outro está falando (sabem apenas a ordem preestabelecida: “primeiro falo eu, depois sicrano, beltrano etc.”), isto é, montam um verdadeiro Frankenstein (o pior é que até na faculdade ocorrem apresentações desse tipo). Mas, voltando ao ambiente escolar, a situação fica mais constrangedora quando o texto fica a cargo de um ou dois membros do grupo (aqueles que “carregam o grupo nas costas”) e o resto fica responsável por funções sem a menor relevância – como ficar segurando a cartolina feito um espantalho, escrever uns tópicos no quadro-negro ou indicar as imagens referentes ao que o orador está falando (como a moça do tempo na TV, com a diferença de que ela fala, aponta e escreve o texto, isto é, exerce diversas funções).

Da mesma forma, nos trabalhos em grupo em que não há apresentação ocorrem outros absurdos. Noutro dia dei um texto para ser analisado, com algumas perguntas para serem respondidas em sala; minutos depois, ao observar que um dos alunos nem se mexia, perguntei sobre a participação dele no trabalho, no que ele teve a cara-de-pau de responder: “eu copiei as perguntas, já fiz a minha parte!” e o restante do grupo, com a maior naturalidade, dividiu irmãmente as questões entre aqueles que ainda não tinham feito “a sua parte”: “são nove perguntas, então cada um faz três”. Ou seja, uma inversão total do significado do trabalho em grupo, cuja arrumação das carteiras é a única coisa que lembra se tratar de um.

Só. Por outro lado, quando os alunos realmente conseguem entender o sentido do que é fazer um trabalho coletivo, em que todos participam de todas as etapas, discutindo, debatendo, mostrando seus pontos de vista e escutando o dos outros, aprendendo e ensinando, é recompensador.

Após essa lamentável experiência, enfatizei a importância dos trabalhos de tal natureza e tempos depois pedi que fizessem outro trabalho em grupo. Dessa vez, os alunos seguiram à risca o conceito e finalmente entenderam tal dinâmica. Os grupos ficaram meia hora a mais depois do término da aula (era o último tempo) discutindo, debatendo, para fechar o trabalho; “só mais um pouquinho, professora!”. Esse dia, apesar de tal prolongamento do horário ter me impedido de almoçar, foi muito estimulante. E o melhor: os trabalhos ficaram excelentes. Em tais momentos é fácil perceber que “todos juntos somos fortes”.

Publicado em 3 de novembro de 2009

Publicado em 03 de novembro de 2009

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