Matemática para a inclusão de idosos: estimulando a memória e o raciocínio

Luiz Henrique Ferraz Pereira

UPF

Rosana Maria Luvezute Kripka

UPF

Luiz Eduardo Schardong Spalding

UPF

Introdução

Aqui relatamos a experiência de oficinas de matemática realizadas na perspectiva da inclusão social de idosos. Elas visam, por meio de desafios matemáticos, a estimular a memória e o desenvolvimento do raciocínio lógico, propiciando ambientes de aprendizagem e o fortalecimento da autoestima. A maioria das atividades é desenvolvida em grupo, o que favorece a colaboração e a criação de laços de amizade. Percebe-se que o exercício mental estimula, de forma geral, uma melhor percepção sobre si e sobre a realidade na qual se vive.

Os relatos dos participantes indicam melhorias em relação ao uso de suas memórias em ações do cotidiano e que se sentem mais atentos no que concerne à observação dos fatos vivenciados. Isso indica que as atividades desenvolvidas na oficina – por estimularem a organização do pensamento, do raciocínio dedutivo e dos modos como se processa a transferência dessas atitudes para suas vidas – constituem-se numa ação que os ajuda a se sentir integrados, o que colabora para que os idosos também se sintam incluídos socialmente.

O tema da inclusão tem sido considerado uma questão cada vez mais relevante, sendo discutida com frequência em conferências, congressos, seminários e eventos afins. A preocupação de incluir se dá como decorrência de uma maior percepção do quanto diferentes práticas, entre elas a educação e o ensino, precisam chegar a todos de forma indistinta e com qualidade.

Nessa perspectiva de percepção da inclusão, o idoso torna-se elemento importante em uma sociedade que está envelhecendo e rompendo com a ideia ultrapassada de que é sinônimo de insanidade, saúde debilitada e em reclusão domiciliar. Cada vez mais políticas públicas se preocupam em oferecer aos idosos elementos que permitam maior inclusão social e grupos de convivência; cursos universitários estão se voltando à referida temática.

Essa preocupação não é algo isolado, mas reflexo de uma tendência mundial que cada vez mais percebe a população em processo de envelhecimento e necessitada de maior atenção, além do que já foi depreendido em gerações passadas. Especificamente em relação ao Brasil,

no período de 1950 a 2025, segundo as projeções estatísticas da Organização Mundial da Saúde – OMS, o grupo de idosos no Brasil deverá ter aumentado em 15 vezes, enquanto a população total em cinco. O país ocupará, assim, o sexto lugar quanto ao contingente de idosos, alcançando, em 2025, cerca de 32 milhões de pessoas com 60 anos ou mais de idade (Brasil, 2013d, p. 349).

Associado a esse fato, há um grande conjunto de normas jurídicas que visam criar reais condições de inclusão, valorização e compreensão do idoso como cidadão e merecedor de atenção legal do Estado.

A Constituição Brasileira de 1998 (Brasil, 1998), em seu Art. 230, já preconiza: “A família, a sociedade e o Estado tem o dever de amparar as pessoas idosas, assegurando sua participação na comunidade, defendendo sua dignidade e seu bem-estar e garantindo-lhes o direito à vida”. O § 2º garante: “Aos maiores de 65 anos, é garantida a gratuidade dos transportes coletivos urbanos”. Também nela é assegurado aos idosos, no inciso V do Art. 203, “um salário mínimo de benefício mensal ao portador de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família conforme dispuser a lei”.

Já no ano de 1994 foi promulgada a Lei nº 8.842 (Brasil, 2013b), chamada de Política Nacional do Idoso (PNI), a qual estabelece princípios e diretrizes para o cumprimento dos direitos dos idosos, dando a cada segmento da sociedade suas responsabilidades. Assim, a PNI tem como pretensão oferecer condições de natureza política e social às pessoas com mais de 60 anos. Tal contexto é bem destacado em seu Capítulo I, Art. 1º, ao afirmar: “A Política Nacional do Idoso tem por objetivo assegurar os direitos sociais do idoso, criando condições para promover sua autonomia, integração e participação efetiva na sociedade” (Brasil, 2013b, p. 329). Embora ainda se façam presentes muitos problemas a serem enfrentados pelo país, na intenção de oferecer aos seus idosos melhores condições nessa fase da vida, o PNI representa um grande avanço em termos de legislação sobre tal temática e suscitou, na sociedade como um todo, um olhar mais atento ao idoso, principalmente no que tange à sua inclusão como cidadão.

Posteriormente, foi criado o Decreto nº 1.948/96 (Brasil, 2013a), que Regulamenta a Lei n° 8.842, de 4 de janeiro de 1994, a qual dispõe sobre a Política Nacional do Idoso. O Decreto defende que o idoso só pode ser enviado a um asilo ou a uma instituição de assistência quando a família não possuir condições para assisti-lo. Da mesma forma, dá conta de várias formas de atendimento, além do asilo, como centros de convivência, centros de cuidados, entre outros.

Por outro lado, a Lei nº 10.741, de 1º de outubro de 2003 (Brasil, 2013c), denominada Estatuto do Idoso, vem ratificar os direitos já previstos na Constituição Federal e na Política Nacional do Idoso, mas os amplia ao tratar de temas envolvendo o direito à vida, à liberdade, à dignidade, aos alimentos, à saúde, à educação, à cultura e ao lazer.

Esses são exemplos de iniciativas do poder público em dar maior visibilidade a pessoas que estão vivendo mais, uma vez que necessitam de maior atenção e, ao mesmo tempo, precisam de políticas de diferentes naturezas que propiciem condições dignas para o exercício de suas vidas.

Stano (2001) indica que a velhice é um período marcado por mudanças biológicas, sociais e econômicas, no qual é necessário que a educação, entre outros, contribua para que possam redefinir projetos de vida; na sua opinião, “às rugas e ao corpo gasto pelos anos, soma-se o desafio da vida que pulsa e se nega a calar. Dar vozes às falas e dar espaço aos corpos são próprios de um trabalho educativo” (p. 156).

Desse modo, ressalta-se a importância de propiciar aos idosos diversos espaços, inclusive educativos, que favoreçam a escuta de suas experiências, valorizando suas vivências, bem como propiciem estimular e desenvolver suas capacidades intelectuais, de modo a melhorar a qualidade de vida.

Nesse contexto, muitas entidades, de variadas naturezas – dentre as quais muitas universidades –, buscam dar oportunidade a uma clientela com idade acima de 60 anos, intitulada idosa, de usufruir de atividades que têm como propósito dar a essa população condições para melhoria ou conservação da saúde física, mental e mesmo de cunho econômico. Tal situação em muito se dá frente à constatação, já antes afirmada, de que as populações brasileira e mundial, de forma geral, estão vivendo mais e, consequentemente, buscando melhores condições frente ao processo de envelhecimento. São iniciativas em ações direcionadas a essa faixa da população. Segundo David e Tomaz (2013, p. 55),

uma ação é um processo que está subordinado à ideia de alcançar resultados, ou seja, a uma busca consciente por objetivos. Contudo, as necessidades dos indivíduos que participam de uma atividade coletiva são satisfeitas não pelos resultados intermediários, mas pela cadeia de ações agregadas aos resultados da atividade, destinados a cada participante na base das relações sociais.

No processo de direcionar iniciativas que envolvam os idosos é que se percebe a dimensão necessária de inclusão deles a uma sociedade que, por muitas vezes, é omissa frente às suas necessidades. Entre esses olhares, muitos se pronunciaram na forma de ações que pudessem estratificar, na prática, o que o PNI propõe. Inclusive no âmbito universitário, como afirmado anteriormente, pois, segundo Baraldi e Bertizoli (2001, p. 12), “várias universidades brasileiras, nesse contexto de mudança, vêm reiterar as possibilidades de oferecer ao idoso um horizonte mais amplo, menos nebuloso e muito mais colorido”.

Um desses olhares deu-se na Universidade de Passo Fundo (UPF), Rio Grande do Sul, onde, desde 1990, existe o Centro Regional de Estudos e Atividades para a Terceira Idade, hoje Centro de Referência e Atividades para a Terceira Idade (Creati). Esse Centro possui muitas atividades direcionadas às pessoas idosas, tendo a intenção de oferecer um espaço privilegiado onde elas possam ter experiências de convivência, estudos e interações sociais.

Descrição da proposta

A logística de funcionamento do Creati tem base na oferta de oficinas de diferentes modalidades e objetivos, com encontros semanais para alunos regularmente matriculados. Algumas dessas oficinas são saraus literários, origami, dança de casais, saúde do idoso, informática, inglês, rodas de conversas, coral, ginástica. Além dessas, também há atividades culturais como bailes de aniversário do Centro, escolha de rainhas, festa junina, de Páscoa e celebrações de Natal. Também graças à ação desse Centro junto à sua clientela-alvo, foi criado o balcão do idoso, órgão no qual essa população pode receber orientações de natureza jurídica e sobre como administrar melhor suas finanças.

Entre tantas propostas de oficinas e atividades, predominam aquelas que buscam exercitar o corpo, como ioga, alongamento, hidroginástica, pilates, ginástica localizada e natação. Todas essas propostas têm, obviamente, sua validade ao propiciar o cuidado com a saúde corporal. No entanto, foi possível identificar a quase inexistência de propostas que, de forma intencional, estimulassem o idoso aluno ao exercício de suas funções cognitivas por intermédio de ações e estratégias devidamente planejadas com tal intenção e que primassem pelo estímulo à memória.

Com tal constatação, e compreendendo a Matemática como área do conhecimento cheia de possibilidades que podem estimular o exercício do pensar a partir de atividades lógicas, estruturadas, sequenciais e com diferentes graus de exigência de raciocínio, foi constituída a proposta de oferecer uma oficina com o título de “Ativando a Memória em Grupos da Terceira Idade do Creati (AMTC)”.

A potencialidade da temática central dessa oficina, a memória, foi de grande aceitação na clientela que frequenta o Centro, evidenciando o compromisso da UPF com sua comunidade e um avanço na busca de responder às constantes inquietações dessa mesma comunidade. A essa aceitação associa-se o fato da quase inexistência de pesquisas que busquem vincular Matemática e terceira idade, podendo, desse modo, a oficina ser um grande elo que dinamize o ensino, a pesquisa e a extensão de forma integrada.

Ao se considerar a concepção de memória, tem-se que ela

está relacionada com o pensamento e com as formas de atividades derivadas dele, da mesma maneira que os resultados se relacionam com os meios. Entende-se por memória o processo de gravação, conservação e reprodução pelo indivíduo das experiências que antecedem o presente. Está implícito, então, que é preciso memorizar. O processo de memória é consequência da ocorrência de certos acontecimentos, fatos ou fenômenos na interação do sujeito com o mundo. O que não existiu não pode ser memorizado, do mesmo modo que o que se memorizou é o que se “deu” no ambiente, “como se deu” (Huete; Bravo, 2006, p. 169).

A proposta de realização de oficinas dessa natureza ocorreu, inicialmente, entre os anos 2004 e 2007. Posteriormente, mantendo suas prerrogativas em conformidade com a vinculação que tem o Creati com a Vice-Reitoria de Extensão e Assuntos Comunitários da Universidade de Passo Fundo, foram retomadas suas atividades no início do ano de 2015.

Cabe salientar que seus proponentes tinham, desde o início, consciência de que a oficina poderia ser um referencial de ação extensionista, evidenciando a preocupação com o idoso e refletindo a importância da construção de um saber multilateral. Na proposta, inclusão e aprendizagem são compreendidas como processos contínuos e cumulativos associados à potencialidade da experiência de vida dos alunos idosos que integram a oficina. Também se considera a percepção de que

a memória humana é uma função da mente que nos possibilita sermos indivíduos singulares. É ela que garante a nossa identidade. Por meio da memória guardamos nossas vivências, sejam elas simples ou complexas, e a levamos conosco ao longo da vida, somando-se a novas experiências e selecionando novos momentos para viver. A memória é uma importante função cognitiva do homem e se relaciona com outras funções cognitivas, como linguagem e atenção. [...] A capacidade de lembrar significa recuperar intencionalmente os conteúdos memorizados para orientar uma ação ou descrever fatos, situações, sentimentos, sensações e avaliações de experiências passadas. Sem a existência da memória, mesmo aprendendo coisas novas, esqueceríamos aquilo que foi ensinado (Sé; Lasca, 2005, p. 61).

Dessa forma, uma pessoa sem memória seria alguém sem identidade. Não se identificaria com os seus, seria alheio ao mundo à sua volta e dificilmente reagiria a estímulos que venham em sua direção. Um idoso desprovido de memória seria colocado ainda mais em reclusão social, esquecido ou desconsiderado no âmbito familiar. São seres que existiriam de forma física, mas invisíveis em suas necessidades, preocupações e desejos. Fortalecer a memória ganha a dimensão de possibilitar ao idoso mais inclusão social e interação com aqueles de sua convivência.

Tendo tais reflexões como guia e reiterando a situação da não existência ou não oferta de uma oficina no Creati na qual o pensar se constituísse como uma ação direcionada e que a memória fosse uma perspectiva a ser estimulada, a oficina foi pensada tendo o idoso como centro principal da ação.

Palácios (apud Fonseca, 2002, p. 22) afirma que as pessoas “têm um nível de compreensão cognitiva até uma idade avançada (desde logo, acima dos 75 anos)”; Fonseca (2002, p. 22) indica que há

um redimensionamento das considerações sobre a natureza das condições que determinam as possibilidades de aprendizagem e construção de conhecimento na idade adulta, apoiando-se na posição de psicólogos evolutivos, cada vez mais convencidos de que o que determina o nível de competência cognitiva das pessoas mais velhas não é tanto a idade em si mesma quanto uma série de fatores de natureza diversa. Entre esses fatores destacam-se o nível de saúde, o nível educativo e cultural, a experiência profissional e o tônus vital da pessoa (sua motivação, seu bem-estar psicológico...). Seria, portanto, desprovido de sustentação na Psicologia atribuir eventuais dificuldades de aprendizagem de alunos adultos à sua idade cronológica, o que nos obriga a uma reflexão mais cuidadosa sobre os fatores que determinam as condições de enfrentamento das demandas de natureza cognitivas desses sujeitos.

Assim, em cada atividade da oficina busca-se estimular o idoso para que ele se dedique às resoluções dos desafios propostos, pois no exercício da construção da solução de uma situação apresentada estimula-se sua capacidade de raciocínio, de argumentação, de verificação de hipóteses, além da criatividade. Isso pode, consequentemente, propiciar evoluções cognitivas por meio do estímulo de atividades cerebrais, fazendo com que a memória seja estimulada constantemente.

Ao serem realizadas buscas por trabalhos acadêmicos que objetivassem a inclusão de idosos por meio de atividades que explorem especificamente recursos de ensino e aprendizagem de Matemática, nota-se que existem poucas publicações com essa finalidade específica.

Na literatura encontram-se trabalhos com objetivos próximos que remetem ao oferecimento aos idosos de processos formativos relacionados ao letramento matemático e ao uso das tecnologias de informação e de comunicação, visando à inserção do idoso na sociedade.

Como exemplo, poderíamos citar Dantas et al. (2014). Os autores apresentam resultados de uma pesquisa realizada numa turma do Projeto de Educação de Jovens e Adultos, do Instituto Federal do Rio Grande do Norte, com objetivo de discutir a importância da inclusão digital e de seu benefício na terceira idade. Eles indicam que o uso de novas tecnologias que foram associadas à resolução de problemas matemáticos propiciou aprendizagens e despertaram os interesses dos idosos pelas atividades.

Dantas (2015) apresentou outro trabalho nessa perspectiva, propondo o desenvolvimento de ações que possibilitem aos idosos explorar o uso de informática em atividades do cotidiano, por meio de sites, softwares e jogos educativos, visando à elevação dos níveis de letramento em Matemática e leitura.

Não obstante, o trabalho de Baraldi e Bertizoli (2001) vem descrever atividades desenvolvidas com alunos idosos da Universidade Aberta à Terceira Idade, da Universidade do Sagrado Coração (SP). O trabalho orienta-se por atividades de natureza da operacionalidade de conteúdos matemáticos para o idoso, tratando de oferecer atividades de Matemática do Ensino Fundamental, uso de calculadora e ações correlatas. Não tem a memória e o incentivo ao raciocínio como preocupação primeira, apenas surgem considerações sobre tal fato de forma a tangenciar a questão.

Assim, percebendo as questões apresentadas sobre a necessidade de oferecer oficinas direcionadas ao estímulo da memória dos idosos e considerando a existência de poucos trabalhos acadêmicos que tratam da questão da inclusão de idosos por meio de recursos específicos da Matemática, evidenciou-se um campo fértil para elaboração e realização da oficina tal como a descrita neste trabalho.

Cabe salientar que, ao considerar a Matemática como linha mestre de proposição das oficinas oferecidas aos idosos, concorda-se com Huete e Bravo (2006, p. 15), os quais entendem que o pensamento matemático “é um processo em que é possível aumentar o entendimento daquilo que nos rodeia, afirmação passível de transferir para a disciplina acadêmica da Matemática, não como corpo de informação e técnicas, mas como método para fazer a mente trabalhar”.

Além disso, como se considera que o conhecimento matemático resulta de processos construídos historicamente como maneira de responder às necessidades cotidianas, suas vinculações o aproximam do seu entorno e de conhecimentos construídos em outras áreas. Desse modo, propiciar seu desenvolvimento na oficina para idosos possibilita diálogos interdisciplinares, pois, para serem compreendidos os conhecimentos matemáticos, é necessário envolver elementos colhidos em outros campos do saber

Para tanto, faz-se necessário o diálogo constante com diferentes setores da universidade, como os relacionados à geriatria, à saúde do idoso, ao mestrado em Envelhecimento Humano, às áreas de Psicologia, Educação e Informática, entre outras, de forma a alicerçar e a qualificar as propostas das atividades.

Sobre o desenvolvimento da oficina AMTC

Desde 2015, as oficinas estão sendo oferecidas semestralmente, de forma gratuita, para grupos da terceira idade do Creati da UPF. A frequência é semanal, tendo duração de uma hora e meia cada aula, com 25 vagas. As aulas são elaboradas e desenvolvidas pelo professor orientador e por duas estudantes. Uma delas é bolsista de extensão remunerada do curso de graduação de licenciatura em Matemática e a outra é bolsista voluntária, estudante do mestrado em Ensino de Ciências e Matemática da UPF. Atualmente, também conta com o apoio de um estudante do Ensino Médio Integrado da instituição, parceria de incentivo ao envolvimento de alunos do Ensino Médio nas propostas de extensão da universidade.

As atividades das oficinas efetivamente aplicadas são selecionadas previamente pelo professor orientador juntamente com os alunos bolsistas e são retiradas de revistas de jogos e raciocínio lógico, livros de jogos, materiais de passatempo e sites da rede mundial de computadores. Em algumas oportunidades, adapta-se uma modalidade de atividade a uma data especial do calendário ou a temas de interesse do grupo.

Para exemplificar, tem-se o dia de São João, 24 de junho, data em que, no ano de 2015, coincidiu com o dia da semana de encontro do grupo da oficina, quando foi elaborado um caça-palavras com essa temática.

As atividades oferecidas em aula são feitas ora individualmente, ora em duplas, e, por vezes, no grande grupo. Além disso, de forma geral, são ofertadas atividades para que sejam realizadas em casa, as quais são retomadas no encontro da semana seguinte, com uma sistematização do que foi realizado fora do espaço de encontro do grupo.

Em relação ao trabalho realizado em grupo, Tomaz e David (2013, p. 31) destacam que, “se a pessoa se engaja numa prática com outros membros de um grupo, ela estabelece relacionamentos e partilha objetivos comuns com os outros membros do grupo do qual está participando”. Desse modo, valoriza-se o trabalho em grupo, pois ele possibilita outras dimensões de interações nem sempre previsíveis. Nota-se, nas atividades realizadas, que essa partilha e essa convivência acabam colaborando com a criação de vínculos que favorecem a constituição de um ambiente acolhedor e favorável à aprendizagem e à inclusão social do idoso, que muitas vezes se sente isolado e sem utilidade nos grupos sociais em que vive.

Na oficina, busca-se primordialmente oferecer a realização de atividades estruturadas, com constante prática de exercícios de pensamento, raciocínio lógico, criatividade e expressão de ideias, bem como propiciar criar laços de amizade pela convivência em grupo e pela prática de atividades em conjunto.

Nesse sentido, em cada encontro, oportuniza-se especificamente:

  1. estimular o pensar estratégico para resoluções de atividades de raciocínio, tendo a Matemática como referência;
  2. a cada encontro, apresentar desafios de natureza lógico-matemática, com a intenção de provocar o exercício do pensar mais elaborado;
  3. trazer experiências de convivência de grupo nas quais a discussão de estratégias de pensamento, soluções de problemas e linhas de raciocínio fortaleçam as relações inter e intrapessoais;
  4. oferecer momentos de aprendizagem contínua e fortalecimento da autoestima, já que o exercício mental estimula, de forma geral, uma melhor percepção sobre si e sobre a realidade na qual se vive;
  5. propiciar ações nas quais seja valorizado o pensar sobre situações previamente estruturadas e que mostrem o quanto é possível estimular a mente e mantê-la ativa mesmo com uma idade mais avançada.

Como modelo de atividade, apresenta-se a seguir o “Hexágono mágico”, que foi desenvolvido com o objetivo de propiciar a observação da distribuição dos números em linhas e colunas, inclusive nas diagonais. A intenção era despertar a atenção, a logicidade da colocação dos números, que não poderiam exceder a 9 e não poderiam ser repetidos em nenhuma das filas.

Tanto nessa como em outras atividades propostas, inicialmente são explicadas suas logísticas ao grupo e suas execuções são acompanhadas pelo professor orientador e pelos bolsistas vinculadas ao projeto. Ao final das atividades, fazem-se avaliações de suas potencialidades, limitações e sobre grau de dificuldade por meio de observações e dos relatos dos participantes.

Atividade: Hexágono mágico

No hexágono abaixo, coloque em cada fila os números de 1 a 9 (quando couberem) de forma que não se repitam em nenhuma fila.

Assim como nessa atividade, são propostos outros desafios que exercitam o pensar, estimulam o raciocínio. Mesmo que, a princípio, não tenham elementos diretos da Matemática, como números, operações ou cálculos, têm em sua essência a necessidade de um pensar organizado, estruturado, de observação, de atenção e, principalmente, de estímulo ao raciocínio lógico, que é característico da atividade que envolve a construção do conhecimento em Matemática.

Durante sua efetiva execução, a oficina AMTC sempre contou com a participação constante dos idosos que vivenciaram as propostas oferecidas. Em diversos momentos, esses participantes faziam referências às vantagens das ações e destacavam o quanto elas os ajudavam na memória e na organização de suas atividades diárias. Listavam benefícios como lembrar com mais rapidez de fatos, nomes e datas e manifestavam alegria e prazer enorme em conviver com o grupo da oficina. Assim, as manifestações dos participantes corroboram a inferência de Cosenza e Guerra (2011, p. 83): “as emoções são um fenômeno central de nossa existência, e sabemos que ela tem grande influência na aprendizagem e na memória”.

Também se tem como hábito, a cada encontro, ouvir os participantes sobre as impressões que tiveram da ação desenvolvida, indicando fragilidades e potencialidades da atividade, bem como sugestões de outras atividades possíveis de serem desenvolvidas. O idoso, ao ser ouvido, faz-se agente a contribuir de forma ativa nas ações da oficina, que tem nele próprio a razão de sua proposição. Saber o que os idosos têm a dizer é um grande passo em sua inclusão como cidadãos.

Em um momento seguinte, essas informações, devidamente registradas, são elementos de constante apreciação para a elaboração e a estruturação de próximas atividades semanais a serem propostas ao grupo. 

Nos registros escritos sobre as falas dos participantes,busca-se identificar se eles notam mudanças em seus comportamentos, especialmente no que se refere à memória e à estruturação do pensamento em outras atividades de seus cotidianos, não observando somente aquelas oferecidas pela oficina. Sobre esse aspecto, já como indicativos de possíveis resultados obtidos com a realização das oficinas, apresentam-se os seguintes testemunhos dos participantes:

“Lá em casa, meus filhos e marido vivem dizendo que estou menos esquecida”.

“Vou ao mercado sem levar listinha das compras e não esqueço mais nada, antes eu ia com lista e ainda esquecia de comprar alguma coisa”.
“Levo a lista de compras do mercado junto, mas nem estou precisando olhar!”.
“Sabes que tenho notado que estou mais alerta e com mais facilidade de me lembrar das coisas?”.
“Adoro vir para a aula fazer essa oficina, trazendo caderno, pastinha e lápis. Conto os dias para quarta-feira, para encontrar com as colegas e o professor”.

Salienta-se que as percepções dos idosos, apresentadas em seus testemunhos, e os correspondentes registros dos desdobramentos percebidos durante o desenvolvimento das oficinas realizados pelo professor e pelos estudantes têm contribuído significativamente para a qualificação da proposição e do planejamento das novas ações desenvolvidas, direcionadas ao estímulo da memória dos idosos.

Considerações finais

Embora sejam resultados ainda preliminares, por serem repetidos com frequência pelos participantes das oficinas, indicam que os principais objetivos da proposta da oficina estão efetivando-se. Nota-se que os participantes afirmam perceber melhoras em suas memórias e que estão com olhares mais atentos no que concerne à observação. Isso indica que as atividades desenvolvidas na oficina podem ajudar e incentivar o idoso em suas atividades de organização do pensamento, de raciocínio dedutivo e também do modo como se processa a transferência dessa atitude para sua vida.

Também foi possível perceber, pelas manifestações do grupo sobre a realização das atividades da oficina, que estas se constituem numa ação que os ajuda a se sentir integrados, o que indica que a proposta também tem colaborado para que os idosos se sintam incluídos socialmente.

Os resultados obtidos indicam que a continuidade desse projeto, concretizado pelo planejamento, pela elaboração e pela realização de outras atividades, pode vir a se tornar um referencial de observação, de pesquisa, de convivência, de descoberta e de amadurecimento de ações que auxiliem cada vez mais no processo de inclusão social do idoso, por meio da exploração de atividades interessantes e lúdicas que envolvam o estímulo e o desenvolvimento do conhecimento matemático. Nesse sentido, podem contribuir para que os idosos possam conservar ou melhorar suas habilidades cognitivas e suas qualidades de vida, ajudando-os a derrubar estereótipos do tipo: (i) a idade avançada caracteriza o idoso como uma pessoa desprovida de vida social ou da convivência com seus pares; (ii) o idoso não possui um pensamento ágil; ou (iii) o idoso não possui capacidade cognitiva incentivada; e (iv) o idoso não tem muita disposição para viver a vida.

Pelo que se presenciou e ouviu-se nos encontros realizados, é possível concluir que ainda podem ocorrer muitos desdobramentos dessa ação. Certamente a oficina AMTC constitui-se, por meio de trabalhos participativos e colaborativos, em um espaço a contribuir cada vez mais com o estímulo da memória e com o processo de inclusão social de idosos na sociedade.

Referências

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Publicado em 18 de abril de 2017

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