Vitamina C: concepções prévias e pós-experimentais com alunos do 8º ano do Ensino Fundamental

Nathália de Souza Abreu

Mestre em Biologia Marinha (UFF), especialista em Ensino de Ciências (UFF), especialista em Biologia Marinha e Oceanografia (Faculdades Integradas Maria Thereza)

Durante muito tempo acreditou-se em um modelo educacional em que o professor era o detentor do saber, responsável por ensinar os conteúdos aos alunos, meros objetos passivos do processo de ensino-aprendizagem; os alunos deveriam aprender sem questionamento. Como resultado disso, o “conhecimento” era trabalhado de maneira unidirecional – do professor para o aluno – sem permitir o diálogo entre eles. Parte do nosso sistema educacional ainda está pautada nessa visão, muitas vezes inconscientemente, pois os professores de hoje tiveram esse tipo de escola e muitos deles creem que o ensino deve ocorrer desta forma, com alunos enfileirados, que devem memorizar os conteúdos.

O paradigma tradicionalista da educação começou a mudar em virtude da elaboração dos documentos oficiais nacionais para a educação, como a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN nº 9.394/96) e os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN). Diante do pluralismo metodológico defendido pela LDB e enfatizado pelos PCN, a experimentação surge como ferramenta do processo de ensino-aprendizagem (Brasil, 1996; 1998).

As atividades experimentais devem ser encaradas como instrumento de ensino-aprendizagem das Ciências, devendo ser incluídas no ambiente de sala de aula. No ensino de Ciências, a experimentação tem a finalidade de permitir que os alunos construam o conhecimento científico com base no processo de questionamento e de desenvolvimento de discussão de argumentos (Oliveira; Silva, 2012). Segundo Carvalho (2013), a validação das atividades experimentais se dá por meio de diálogos e escrita em sala de aula, mas também deve transcender essa fronteira, incluindo o contexto sociocultural em que o aluno se insere.

Para Faria et al. (2013), as atividades experimentais não necessitam grandes quantidades de reagentes ou técnicas sofisticadas, apenas da observação e da interpretação de fenômenos.

O presente trabalho teve como objetivo avaliar as concepções de alunos do Ensino Fundamental sobre vitamina C antes e após a realização de um experimento em sala de aula.

A vitamina C

As vitaminas são moléculas auxiliares das enzimas, atuando em diversas funções do organismo; são essenciais aos processos bioquímicos e fisiológicos dos animais (Coultate, 2004).

Dentre as vitaminas está o ácido ascórbico, vulgarmente conhecido como vitamina C. Podemos encontrá-la em grande quantidade em alimentos como frutos cítricos (acerola, laranja, limão etc.), vegetais folhosos (couve, brócolis, folhas de mandioca etc.) e legumes (pimentões amarelos e vermelhos) (Silva et al., 1995).

A vitamina C atua como antioxidante, na acumulação de ferro na medula óssea, baço e fígado, além de participar da produção de colágeno, resistência às infecções bacterianas e virais, formação de ossos e dentes etc. (Silva et al., 1995). Sua deficiência provoca escorbuto, doença caracterizada pelo sangramento das gengivas, que provocou grande quantidade de óbitos na época das Grandes Navegações.

Metodologia

O trabalho foi realizado com duas turmas de 8º ano do Ensino Fundamental (56 alunos) de uma escola municipal de Itaboraí/RJ.

Concepções prévias

Em uma primeira etapa, os alunos tiveram uma explicação sobre a importância da vitamina C no organismo. Em seguida, deveriam assinalar, dentre três opções de frutos comuns (acerola, laranja e limão), qual eles acreditavam ter maior quantidade de vitamina C.

Experimentação

A experimentação empregou a metodologia proposta por Silva et al. (1995), utilizando solução de amido (1 colher de chá de amido/200mL de água filtrada, dissolvido a uma temperatura de 50°C) e solução de ácido ascórbico (1 comprimido/1L de água filtrada), previamente preparados. Além disso, utilizou-se tintura de iodo 2% e sucos concentrados (naturais) de laranja, limão e acerola.

Foram utilizados cinco tubos de acrílico, previamente numerados. Cada tubo recebeu 20mL da solução de amido de milho.

O experimento foi organizado da seguinte maneira:

Tubo 1 (controle negativo) – solução de amido
Tubo 2 (controle positivo) – solução de amido + solução de ácido ascórbico (vitamina C)
Tubo 3 – solução de amido + 5mL de suco de limão
Tubo 4 – solução de amido + 5mL de suco de laranja
Tubo 5 – solução de amido + 5mL de suco de acerola

Conceitos envolvidos na metodologia

A adição de iodo à solução de amido provoca no meio uma coloração azul intensa ou roxa, uma vez que o iodo forma um complexo com o amido. Como a vitamina C tem propriedade antioxidante, esta substância promove redução do iodo a iodeto, que é incolor em meio aquoso e na ausência de metais pesados.

Sendo assim, quanto mais vitamina C um determinado alimento tiver, mais difícil será aparecer a cor azul/roxa e maior será a quantidade de iodo necessária para o estabelecimento dessa coloração.

Investigação

Após o experimento, analisaram-se as conclusões dos alunos em relação à atividade. Eles responderam novamente à questão inicial proposta: dos três frutos analisados, qual tinha a maior concentração de vitamina C?

Resultados e discussão

Nas concepções prévias, a maior parte dos alunos tinha indicado que a acerola era o fruto com maior quantidade de vitamina C, seguida por laranja e limão (Figura 1).

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Figura 1: Resposta dos alunos à pergunta “Quem tem mais vitamina C: acerola, limão ou laranja?”, nas concepções prévias.

 

Na primeira etapa do experimento, foi explicado aos alunos que o tubo 1 correspondia ao controle negativo, ou seja, não continha vitamina C; e que o tubo 2 correspondia ao controle positivo, ou seja, continha a maior concentração de vitamina C.

Durante a realização do experimento, os alunos anotaram a quantidade de gotas necessárias para alterar a cor da solução. Os resultados estão na Tabela 1.

Tabela 1: Número de gotas de iodo necessárias para alterar a coloração do experimento

Conteúdo do tubo

Número de gotas

Amido

1

Amido + vitamina C

21

Amido + limão

7

Amido + laranja

7

Amido + acerola

19

 

Com relação à conclusão do experimento, alguns alunos relataram da seguinte forma:
O que só tinha amido ficou roxo mais rápido.
Quanto mais vitamina C, mais demora pra ficar roxo.

No pós-teste, todos os alunos responderam que a acerola era o fruto com maior quantidade de vitamina C.

Entretanto, é conveniente salientar que os teores de vitamina C variam entre frutos maduros e verdes, bem como entre frutos congelados e frescos (Silva et al., 1995). Neste experimento, todos os frutos utilizados no preparo dos sucos estavam frescos, garantindo menor interferência nos resultados.

É necessário considerar o contexto sociocultural dos alunos e da comunidade adjacente e levar para a sala de aula temas flexíveis, geradores de curiosidade e dúvidas (Moreira; Masini, 2006). De acordo com os PCN, isso pode ser feito por meio de observações, problematizações, experimentações, jogos e diferentes fontes de informação, contrariando a concepção de ensino tradicional, baseada na “transmissão” de conteúdos por parte do professor via exposição oral e memorização desses conteúdos por parte dos alunos (Brasil, 1998).

Segundo os PCN, o aluno é o sujeito da aprendizagem, sendo dele o papel de construir as explicações, de ressignificar o mundo (Brasil, 1998).

De acordo com Penteado e Kovaliczn (s/d), existem evidências de que o professor precisa ser criativo dentro da sala de aula, conquistando a atenção do aluno, permitindo a presença do diálogo durante as aulas, melhorando a qualidade do ensino.

Durante a atividade experimental, observou-se a participação efetiva dos alunos durante todo o procedimento, questionando, propondo explicações, respondendo às questões propostas. A motivação dos alunos é enfatizada pelos Parâmetros Curriculares Nacionais como essencial para a construção do conhecimento (Brasil, 1998). Ainda segundo os PCN, o interesse do aluno pela aula é fator de suma importância para alcançar uma aprendizagem significativa (Brasil, 1998). Essa motivação pode ser obtida por meio da realização de atividades diferenciadas.

Para Matos (2009), é possível propiciar aos estudantes aulas mais atraentes e motivadoras a partir da elaboração de atividades com a utilização de materiais de baixo custo. No presente estudo, a atividade experimental utilizou materiais acessíveis às escolas públicas.

Considerações finais

A atividade experimental sobre vitamina C se mostrou significativa, pois propiciou a motivação e a participação dos alunos nas aulas, facilitando a compreensão do conteúdo programático da disciplina. Os resultados revelaram a atuação dos estudantes na observação e interpretação dos experimentos, condição essencial para o aprendizado.

Referências

BRASIL. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Diário Oficial da União, Brasília, v. 134, nº 248, p. 27.833-27.841, 23 dez. 1996.

BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais – 3º e 4º ciclos do ensino fundamental: Ciências Naturais. Brasília: MEC/SEF, 1998.

COULTATE, T.P. Alimentos:a química de seus componentes. Porto Alegre: Artmed, 2004.

FARIA, M. J. C.; COSTA, D. R. M. da; DIAS, J. H. R.; LIMA, M. da S. Um estudo de caso na E. E. E. M. Liberdade, do Município de Marabá-Pará. Centro de Ciências Sociais e Educação/Departamento de Ciências Naturais/Universidade do Estado do Pará – UEPA/Campus Universitário de Marabá. In: 36ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira de Química; Anais... 2013.

MATOS, C. H. C.; OLIVEIRA, C. R. F.; SANTOS, M. P. F.; FERRAZ, C. S. Utilização de modelos didáticos no ensino de entomologia. Revista de Biologia e Ciências da Terra, v. 9, nº 1, 2009.

MOREIRA, M. A.; MASINI, E. F. S. Aprendizagem significativa: a teoria de David Ausubel. 2ª ed. São Paulo: Centauro, 2006.

OLIVEIRA, C. A. L. de; SILVA, T. P. da; Aplicação de aulas experimentais de Química com materiais alternativos a partir de sucata e materiais domésticos no Ensino de Jovens e Adultos (EJA). In: Encontro Nacional de Educação, Ciência e Tecnologia. Anais... 2012.

PENTEADO, R. M. R.; KOVALICZN, R. A. Importância de materiais de laboratório no ensino de Ciências. Disponível em: www.diaadiaeducacao.pr.gov.br/portals/pde/arquivos/22-4.pdf>. Acesso em 20 jun. 2014.

SILVA, Sidnei Luís A. da; FERREIRA, Geraldo Alberto; SILVA, Roberto Ribeiro da. À procura da vitamina C.Química Nova na Escola, nº 2, p. 31-32, 1995.

Publicado em 22 de agosto de 2017

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