Educação em Saúde sobre parasitoses intestinais com escolares dos anos iniciais do Ensino Fundamental: um relato de experiência

Jailton José de Santana

Licenciando em Biologia (Univisa)

Julyana Viegas Campos

Enfermeira (UFPE), especialista em Saúde Pública (Faintvisa), mestra em Saúde Coletiva (UFPE), docente do Curso de Bacharelado em Enfermagem do Univisa

Danilo Ramos Cavalcanti

Licenciado em Ciências Biológicas (UFPE), especialista em Saúde Pública e Análises Clínicas e Microbiologia (Funip), mestre em Biotecnologia Industrial, doutor em Ciências Biológicas (UFPE), docente do Curso de Licenciatura em Biologia do Univisa

As parasitoses representam um grande índice de problemas de saúde pública em nível mundial, ocorrendo principalmente nos países em desenvolvimento. No Brasil, diversas enteroparasitoses se alastram de forma endêmica em várias regiões, acrescentando problemas para a sociedade e para a economia. Dentre as principais parasitoses destacam-se amebíase, giardíase, enterobiose, ancilostomose, teníase e esquistossomose (Melo et al., 2004; Busato et al., 2014).

As parasitoses mostram-se de fácil tratamento por serem doenças muito visíveis para a Atenção Básica à Saúde e com grandes recursos por meio de Promoção da Saúde (Silva; Lima; Bastos, 2014). A negligência para com essas infecções é evidente pela falta de investimento em políticas públicas, que garantam melhoria na qualidade de vida para a sociedade, especialmente no que diz respeito ao saneamento básico (Mackey et al., 2014).

A precariedade de higiene nas comunidades e a falta de informações sobre as parasitoses, suas consequências e ações profiláticas refletem a negligência para com o tema, em especial, para a ocorrência das parasitoses intestinais voltadas ao público infantil em idade escolar, trazendo sérios prejuízos (Munareto et al., 2021).

Por conta dessas parasitoses, diversas causas são voltadas e consideradas por causa da pobreza (Basso et al., 2008; Silva; Lima; Bastos, 2014), então mesmo que tenha avançando, com os diversos meios em diversas localidades no Brasil, o fato da situação precária ainda promove uma altíssima suscetibilidade às parasitoses (Mackey et al., 2014).

A escola é reconhecida como espaço propício para a promoção da saúde, contudo, para que isso seja colocado em prática de forma efetiva, são necessárias implementações de abordagens metodológicas que permitam a reflexão e o desenvolvimento de ações coletivas. As práticas educativas em saúde são necessárias para valorizar e incorporar hábitos saudáveis de higiene, a construção de conhecimento sobre profilaxia e valorização do trabalho em coletividade (Silva; Lima; Bastos, 2014).

A presença do tema saúde nos Temas Contemporâneos Transversais da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) esclarece a importância de trabalhar este assunto em todo o ciclo de escolaridade e aprendizagem (Sousa; Guimarães; Amantes, 2019). Dentre os principais objetivos destacam-se: problematizar a realidade; promover um processo educativo que seja continuado e comprometido com uma construção de saber coletiva e integrar habilidades para resoluções de problemas de extrema importância para a formação de todos os cidadãos (Brasil, 2019).

No campo da saúde, uma das temáticas mais trabalhadas e desenvolvidas é a Parasitologia. As enteroparasitoses correspondem a doenças que acometem, na maioria dos casos, populações que vivem em situação de pobreza, ou seja, condições de extrema necessidade, principalmente aquelas pessoas sem saneamento básico adequado, propiciando o contato com agentes infecciosos (Santos; Costa; Castro, 2017).

A existência de práticas educativas favorece a construção de diversos conhecimentos para a sociedade, em especial às escolas, por meio da conscientização sobre parasitoses e pelo trabalho em conjunto medidas preventivas para redução de doenças parasitárias (Ribeiro et al., 2013).

Uma vez que escolas são palcos principais da construção do conhecimento e levando em consideração que muitos cidadãos ainda têm dificuldades em frequentar a escola, é dever de todos levar a continuidade de uma aprendizagem para que haja a possibilidade de propagação de conhecimento (Rocha; Fachín-Terán, 2010).

Diante disso, o objetivo do presente estudo foi relatar a experiência vivenciada por meio de um projeto de extensão com ênfase em parasitoses intestinais em escolares de 7 a 10 anos de idade.

Metodologia

Trata-se de um estudo do tipo relato de experiência sobre a educação em saúde com ênfase em parasitoses intestinais em escolares de 7 a 10 anos de duas escolas municipais, de médio porte, situadas no município de Vitória de Santo Antão, no Estado de Pernambuco.

O público-alvo foi crianças matriculadas nos anos iniciais do Ensino Fundamental. Este relato foi elaborado a partir da vivência do projeto de extensão Parasitologia em Foco, do Centro Universitário da Vitória de Santo Antão, no período de agosto de 2018 até março de 2020. Após esse período, houve a necessidade de interrupção das ações, uma vez que as escolas fecharam e as aulas passaram a ser remotas por causa da pandemia de covid-19.

Os dados abordam a vivência presencial, por meio de observações de ações realizadas com esse público infantil. Foram construídos folders, modelo didático e realizada uma encenação baseada no personagem Jeca Tatu, de Monteiro Lobato.

O projeto foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da Faculdade Integrada de Pernambuco (Facipe), sendo aprovado com número 3.196.892. Antes da realização das ações, os integrantes do projeto foram até as escolas apresentar o projeto aos gestores e professores, para que estes informassem aos pais sobre a participação dos seus filhos na ação. Desta forma, os pais assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido, consentindo na participação dos filhos e os escolares assinaram o termo de assentimento livre e esclarecido para participarem da ação.

Resultados e discussão

A utilização dos modelos didáticos de parasitos visou apresentar ao público, de forma lúdica, as diferentes características e morfologias dos parasitos. Segundo Fernandes et al. (2016), as atividades de educação em saúde destinam-se à promoção à saúde, prevenção de agravos e de assistência à criança, com a responsabilidade de garantir uma melhor qualidade de vida aos escolares, de forma a explorar suas potencialidades.

Zierer (2017) afirmou que, por meio do ensino de Parasitologia, podem ser traçadas estratégias de informação, conhecimento e prevenção à saúde, em especial, ao público infantil. Destacou também que os modelos didáticos contribuem no entendimento dos conteúdos, construindo conhecimento de forma interativa. Por isso, foi utilizada a História de Jeca Tatu, realizada por meio de teatro, para falar sobre as doenças parasitárias, focando com um tema voltado para o amarelão, seguido de seus agentes etiológicos, os modos de transmissão e também as formas de prevenção.

Conforme foi sendo contada a história do personagem Jeca Tatu, também ia sendo encenada pelos mediadores do conhecimento da história para uma melhor compreensão e aprendizagem daquelas crianças em sala de aula (Figura 1). Para que as crianças melhor adquirissem o conhecimento, foi construído um verme platelminto em pelúcia (Figura 2), o qual foi repassado visualmente para que as crianças tomassem melhor conhecimento sobre os tipos de parasitoses e quais problemas causados por elas.

Figura 1: Encenação da peça de Monteiro Lobato com os alunos do 2º ano do Ensino Fundamental

Figura 2: Verme platelminto de pelúcia utilizado nas ações de Educação em Saúde nas escolas

A utilização dos modelos em pelúcia para crianças são uma boa estratégia, visto que elas levam o modelo como um brinquedo. Segundo Carvalho (2016), o brinquedo permite a criança reproduzir as experiências vivenciadas no dia a dia, como a natureza e as construções humanas.

Cavalcanti et al. (2021) afirmaram que a teatralização propicia um cenário mais atrativo para trabalhar temas relacionados à saúde, principalmente em turmas de Ensino Fundamental, desde que seja utilizada uma linguagem adequada à faixa etária.

O lúdico proporciona, tanto na criança quanto no adulto, uma troca de aprendizado. Portanto, sua relevância no espaço educacional como uma ferramenta pedagógica traz sentido à aprendizagem, proporcionando eficácia e prazer. Dessa maneira, foram ressaltados os cuidados básicos de higiene como ensinar a lavar as mãos de forma correta e não colocar as mãos sujas na boca, conscientizando sobre os bons hábitos de higiene para não serem portadores desses parasitos.

As professoras, os gestores e os demais profissionais da Educação que assistiram à encenação foram sensibilizados com as ações desenvolvidas e demonstraram interesse e curiosidade pelo tema trazido, bem como elogiaram as abordagens, o que resultou na participação ativa deles em todas as atividades, verificando-se a facilidade para assimilar a mensagem educativa.

A realização dessas ações promovida pelo projeto sobre a Educação em Saúde contribuiu para melhorar a qualidade da informação, não apenas dos participantes, mas de toda a comunidade escolar por meio do ensino de prevenção de parasitoses intestinais. Além de ser este um ponto norteador na reavaliação das rotinas diárias, como mudanças comportamentais e adoção de atitudes mais saudáveis.

Foi possível também instruir as professoras e demais profissionais sobre os benefícios à saúde que este tipo de atividade educativa pode proporcionar ao indivíduo e, sobretudo, ao coletivo, despertando para um sentimento de corresponsabilidade e compromisso no que tange às atitudes e às mudanças comportamentais ou de ação social que a saúde como um todo exige.

A estratégia de distribuição de fôlderes (Figura 3) atingiu grande parte das crianças abordadas, como também as professoras que se interessaram pelo tema e procuraram sanar suas dúvidas. Esses alunos também foram estimulados a levarem o material consigo e mostrar para os parentes e amigos, atuando como agentes multiplicadores.

Figura 3: Fôlder sobre as principais verminoses, formas de diagnóstico e prevenção trabalhadas com os alunos dos anos iniciais do Ensino Fundamental

Um estudo publicado em 2010, em Ilhéus, também envolvendo um programa de educação tutorial, aponta que os alunos membros do programa são de extrema importância nos projetos de Educação em Saúde, possuindo qualificação na atenção à saúde por meio de aperfeiçoamento em serviços, pela participação ativa na comunidade e a partir de trabalhos e vivências da graduação. Dessa forma, destaca-se a importância de projetos e atividades que promovam ações de promoção à saúde e prevenção de doenças ou agravos (Ferreira et al., 2012).

A Educação em Saúde visa o desenvolvimento da autonomia e da responsabilidade dos indivíduos no cuidado com a sua saúde. O modelo utilizado é a comunicação dialógica, que visa o compartilhamento e trocas de saberes, permite que o indivíduo faça uma análise crítica de sua realidade e busque ações para melhorar a sua saúde (Câmara et al., 2012).

Foi percebido, no decorrer das atividades, que a mudança no cotidiano dessas crianças pode ocorrer; no entanto, para que isso aconteça essa população precisa ser sensibilizada por meio de motivações e informações que devem ser transferidas da melhor maneira possível, fazendo assim uma educação em saúde.

É importante salientar que atividades como essas dão aporte aos alunos e os ajudam no enfrentamento dos problemas, trabalha a criatividade e possibilita colocar em prática os conhecimentos prévios; permite que o aluno construa raciocínio lógico e seja habilidoso na tomada de decisão, podendo ser, no futuro, um grande profissional.

Um estudo realizado pela Universidade de São Paulo em 2013 evidenciou que antes da década de 1990, os efeitos da educação em saúde eram pouco estudados, crescendo consideravelmente no ano de 2006. Tal aumento pode ter ligação direta com a revisão do modelo assistencial e a implantação do Programa de Saúde da Família (Moura; Nogueira, 2013).

Os principais resultados obtidos com as ações de educação em saúde nessas escolas permitiram constatar o quanto elas ainda são desprovidas de informações, e o quanto são necessários profissionais de saúde que deem atenção para as necessidades particulares de cada criança, e reconheçam as vulnerabilidades das escolas, intervindo de alguma forma.

Entretanto, a prática da Educação em Saúde é um trabalho árduo e complexo pelo descrédito da própria população com as práticas de saúde e estigma social. Vale ressaltar que educação em saúde não se baseia somente em orientações que tenham relação principalmente com doenças, como prevenção dos agravos delas, mas também se baseia em clarificar a população, sobretudo quanto ao que pode estar associado às doenças e quais podem ser seus possíveis determinantes (Maciel; Pillon, 2010).

Considerações finais

O projeto propiciou o compartilhamento de ações profiláticas acerca de enteroparasitoses com as crianças dos anos iniciais do Ensino Fundamental. A encenação constituiu-se como uma importante estratégia para esse público, uma vez que despertou o interesse pelo conteúdo, a possibilidade de interação com os termos científicos de forma a minimizar a abstração do conteúdo. Além disso, ações extensionistas fornecem uma base para a mudança de hábitos de higiene que fazem a diferença na vida dos pequenos aprendizes, tornando-os protagonistas na propagação de conhecimento para a família e comunidade local.

Referências

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‌BUSATO, M. A. et al. Relação de parasitoses intestinais com as condições de saneamento básico. Ciência, Cuidado e Saúde, Maringá, v. 13, nº 2, p. 357-363, 2014.

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Publicado em 09 de agosto de 2022

Como citar este artigo (ABNT)

SANTANA, Jailton José de; CAMPOS, Julyana Viegas; CAVALCANTI, Danilo Ramos. Educação em Saúde sobre parasitoses intestinais com escolares dos anos iniciais do Ensino Fundamental: um relato de experiência. Revista Educação Pública, Rio de Janeiro, v. 22, nº 29, 9 de agosto de 2022. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/22/29/educacao-em-saude-sobre-parasitoses-intestinais-com-escolares-dos-anos-iniciais-do-ensino-fundamental-um-relato-de-experiencia

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